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Conhecimento que pode salvar vidas
Melina Dias
Do Diário do Grande ABC
26/10/2008 | 07:00
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Generosidade é o leitmotiv do novo livro da jornalista Paula Fontenelle, Suicídio - O Futuro Interrompido (Geração Editorial, 260 págs., R$ 34,90), que será lançado amanhã na Saraiva Megastore do Shopping Ibirapuera, em São Paulo. A autora transformou uma dolorosa experiência familiar em um instrumento que pode melhorar - e salvar - vidas humanas.

Quando seu pai, após um histórico de alcoolismo e depressão, tirou a própria vida, em janeiro de 2005, a repórter automaticamente começou uma intensa busca por literatura sobre o assunto. "Precisava entender." Descobriu uma lacuna no mercado editorial para leigos e leu cerca de 20 publicações estrangeiras. Começava a nascer aí seu ‘Guia para Sobreviventes', o segundo subtítulo da obra.

Na publicação ‘redonda', para usar um jargão jornalístico, a ex-diretora de Redação do Diário reúne depoimentos de parentes de pessoas que tiraram a própria vida, suicidas frustrados com diversos perfis socioeconômicos e pareceres de médicos especialistas (por vezes conflitantes, o que é enriquecedor).

Há também estatísticas que fornecem um panorama da situação mundial e nacional e manuais sobre como identificar sinais de alerta - sim, quem ameaça se matar geralmente está pedindo ajuda. A reportagem ainda aborda fatores de risco nas diversas faixas etárias.

"A Organização Mundial de Saúde estima que em 2020 cerca de 1,53 milhão de pessoas morrerão desta forma, o que significa um caso de suicídio a cada 20 segundos. Este índice representa um crescimento de 74% em relação às 877 mil mortes voluntárias registradas em 2002."

No esforço de desconstruir o tabu, Paula Fontenelle mostra como o Brasil ainda engatinha na suicidologia. "No que diz respeito a números, o País segue alguns padrões mundiais: três mortes de homens para cada mulher e elevação nos índices de mortalidade voluntária dos jovens entre 15 e 24 anos. Entre 1980 e 2000, essas taxas foram multiplicadas por dez, passando de 0,4 para 4."

Apesar de graves, não são os números que convencem o leitor a enfrentar o desconforto imposto pelo assunto. É a coragem da autora em se expôr e a seus familiares o lastro da publicação. De forma hábil, não oportunista, sua experiência pessoal é relatada gradualmente o que renova o fôlego do leitor e afasta o tom melodramático.

No capítulo Mitos sobre o Suicídio, ela rebate a afirmação "Quem se mata é fraco" justamente com o caso de seu pai, um homem zeloso, que já havia encaminhado as filhas, enfrentado a perda do único filho homem e a separação da mulher. "Em sua carta de despedida, escreveu: ‘optei por não continuar mais essa vida.' Para quem não o conhecia é fácil julgar individualmente esse único instante e tachá-lo de covarde, mas como dizer isso de um homem que superou imensas perdas e adversidades por 58 anos?"

E continua: "O que fica disso tudo é a conclusão de que a pessoa que tira a própria vida é alguém que está passando por uma dor psíquica insuportável, normalmente resultado de um transtorno que altera sua percepção dos acontecimentos. O mundo, as emoções e os problemas ficam fora de proporção e ele opta por aniquilar a dor, independentemente do que enxergamos como covardia ou coragem."

Covardia ou coragem que existem dentro de todos nós. Só uma de suas irmãs conseguiu ler os três capítulos biográficos. A mãe talvez nunca lerá. A própria autora teve de enfrentar um episódio de depressão durante o processo de criação de três anos. "Parei duas vezes de escrever." Na segunda foi diagnosticada, medicou-se e enfrentou a reta final para entrega do trabalho em 11 meses. A primeira pessoa ajudada pelo livro foi a própria Paula Fontenelle. "Senti que o conhecimento alivia a dor."




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