Política Titulo Aprovado ontem
S.Bernardo multará abusadores sexuais

Projeto prevê punição de R$ 6.548,76 para quem
for pego em conduta ofensiva; valor pode até dobrar

Por Humberto Domiciano
Do Diário do Grande ABC
05/10/2017 | 07:00
Compartilhar notícia
Celso Luiz/DGABC


Após registrar dois casos de assédio no transporte público, o município de São Bernardo aplicará multas de R$ 6.548,76 para pessoas que cometerem condutas ofensivas e de assédio sexual em espaços públicos e veículos de transporte coletivo.

A medida foi tomada justamente após os casos recentes de abusos sexuais registrados em ônibus na cidade em setembro. Em um dos incidentes, um homem de 60 anos foi detido após ejacular em uma passageira. Em outro, um homem acabou agredido e preso depois de filmar as pernas de uma jovem.

O projeto de lei foi aprovado ontem na Câmara por unanimidade e deve ser sancionado ainda nesta semana pelo prefeito Orlando Morando (PSDB). A proposta prevê ainda que, em caso de reincidência, o valor da punição suba para R$ 13.097,52.

“Infelizmente São Bernardo teve vítimas e a cidade não pode ver isso como coadjuvante. Sabemos que a punição maior é a criminal, mas por vezes essa ação agressiva não é qualificada como crime. Na ausência de lei mais dura, o agressor acaba indo para casa. A Prefeitura tem autoridade para isso também em áreas públicas e aplicará as multas”, defendeu Morando.

Em agosto, na Capital paulista, o ajudante geral Diogo Ferreira Novais foi detido duas vezes por cometer crimes sexuais. Ele chegou a ser liberado em uma das ocasiões, mesmo após ter sido preso outras 17 vezes, em 13 delas por atos obscenos e importunação ofensiva ao pudor.

De acordo com Morando, a vítima pode comunicar o crime diretamente ao motorista do ônibus, que será orientado a fechar as portas e avisar a PM (Polícia Militar) ou a GCM (Guarda Civil Municipal). “Faremos uma ampla divulgação da lei e 100% da nossa frota é monitorada. É uma forma de poder exigir a cobrança da multa, colaborar com a investigação da ação criminal e intensificar procedimentos para não termos mais ações como essa na cidade”, completou Morando.

A nova legislação aponta ainda que o município promoverá campanhas voltadas à sociedade, tendo como objetivo a promoção de “ações afirmativas, educativas e preventivas contra as condutas ofensivas”.

OS EPISÓDIOS
No dia 7 de setembro, o aposentado Raimundo Gonçalves Coelho, 60 anos, foi preso em flagrante após ejacular nas costas de uma passageira de 24 anos, em ônibus da Linha 6-Balsa/Jardim Tupã. Ele disse que “não conseguiu conter seus instintos”.

Poucos dias depois, João Marinho Falcão, 49, foi flagrado filmando, com o celular, as pernas de uma passageira de 20 anos, dentro de um ônibus, na Avenida Armando Ítalo Setti, no Centro.

Mulheres relatam insegurança em ônibus

Usuárias do transporte público de São Bernardo afirmaram ao Diário que não se sentem seguras em suas viagens diárias.

Para a química Melissa Brito, 19 anos, os assédios são recorrentes nos ônibus. “Já vi uma amiga ser fotografada no ônibus e ela ficou constrangida. Isso me deixou receosa, já que quando estou num trólebus com muitos homens, tenho medo. Vejo que vai ser difícil pegar (com a multa) quem faz isso”, pontuou.

Já a atendente Tainá Ferronato, 23 anos, afirmou que já tomou conhecimento de abusos e mostrou desconfiança com a Justiça. “Nunca presenciei nada do tipo, mas tenho amigas que já. Uma delas chegou a fazer BO (Boletim de Ocorrência), mas não deu em nada”, completou.

Por sua vez, a promotora de vendas Jamile Alves, 24 anos, espera que, com a multa, ocorra queda nos casos de violência sexual contra as mulheres. “Já presenciei algo assim uma vez no ônibus. O homem se aproveitou do espaço reduzido e acabou se encostando em várias mulheres. Vamos esperar se com a multa esses casos diminuam.”

Na visão da estudante Taiane Cristina, 21 anos, os alertas contra abusadores são outro ponto que merece atenção. “Vejo que a multa será positiva para evitar novos casos e ajudará na conscientização. Não me sinto segura ainda nos ônibus”, reconheceu.

A esteticista Nayra Karoline, 22 anos, relatou que há momentos do dia em que os assédios costumam ocorrer com mais frequência. “Uma amiga sofreu assédio e não teve coragem de denunciar, ficou com medo. No horário de pico costuma ser pior, porque quanto menos espaço, mais chances o assediador tem”, lamentou ela.

Especialistas divergem sobre eficácia da medida adotada

Especialistas consultados pelo Diário divergiram ao analisar o grau de efetividade do projeto contra abusadores sexuais aprovado ontem em São Bernardo.

Para a professora da Faculdade de Direito de São Bernardo Célia Nilander, especializada em Código Penal, a medida pode ser um complemento às punições que já existem para o crime. “Eu creio que é uma forma de tentar coibir esse tipo de prática. Eu só não sei se é uma forma eficaz. De repente, mexendo no bolso dessas pessoas, pode ser que alguma coisa mude, mas não dá para afirmar isso com absoluta certeza. É muito subjetivo.”

Já para o professor da USP (Universidade de São Paulo) Gustavo Badaró, também especialista em Código Penal, a lei não deverá ser efetiva. “Sendo um processo administrativo sancionador, ele tem que respeitar todos os princípios constitucionais. Então, o município vai ter que baixar uma portaria, dar oportunidade para que haja produção de provas, prazo para (o acusado) se defender, vai ter que ter um julgamento. Não é como uma multa de trânsito, em que a pessoa paga e, depois, recorre, se quiser”, avaliou Badaró. 




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;