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Jovens veem na Educação a chance de uma nova vida

Dois internos da Fundação Casa são selecionados para etapa estadual da Olimpíada da Língua Portuguesa

Nelson Donato
Especial para o Diário
18/09/2016 | 07:00
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André Henriques


 “Voltei a ter esperança de novo, de que a vida pode ser diferente fora daqui”. Essas palavras são de um interno de 18 anos da unidade de Santo André da Fundação Casa. Como muitas crianças e adolescentes, o jovem teve uma infância difícil e viu na criminalidade o caminho mais fácil de superar a pobreza. No entanto, após receber mais uma oportunidade de mudança, ele, junto de outro interno da unidade, que também possui a mesma idade, teve seu texto selecionado para concorrer na etapa estadual da Olimpíada da Língua Portuguesa 2016, que tem como tema neste ano “O Lugar Onde Eu Vivo”. Os dois integram grupo seleto de 500 estudantes de todo o Estado selecionados para participarem da fase.

Por vezes, a falta de oportunidade e de interesse oculta talentos pessoais. A evasão escolar é outro fator que influência diretamente na falta de visão de alguns jovens. Infelizmente, essa situação, principalmente vivenciada por adolescentes de áreas periféricas, contribui para o aumento no número de menores infratores, que desperdiçam suas habilidades em atividades ilícitas e que comprometem o seu futuro.

Para reverter esse quadro, a Fundação Casa de Santo André proporciona aos seus internos a oportunidade de voltar às salas de aula da unidade, que seguem o calendário da DE (Diretoria de Ensino) da cidade. Além das classes convencionais, os adolescentes têm a oportunidade de participar de cursos profissionalizantes do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) e do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e Ação Comunitária), cujo principal objetivo é a inserção dos internos no mercado de trabalho após o período de reclusão.

A oportunidade de mudança foi agarrada por alguns dos jovens, que veem no estudo a saída ideal para refazerem suas vidas. O autor da redação ‘Moleques de Rua’, que concorre na categoria para alunos do 9º ano do Ensino Fundamental e 1º ano do Ensino Médio, descobriu a aptidão para escrever recentemente. “O meu professor me ajudou muito na hora de fazer o texto. Até então eu não escrevia muito. Mas eu achei legal contar parte da minha história, de quando eu jogava futebol com meus amigos. Até lembrei de uma vez que apostamos um refrigerante e brigamos por isso. No final, encontrávamos uma nota de R$ 20 e todos saíram satisfeitos”, relembra um dos internos selecionados para etapa estadual.

Cumprindo medida sócioeducativa pela sétima vez, ele afirma que pretende continuar os estudos após conseguir sua liberdade. “Quero terminar a escola e depois fazer algum curso voltado à área de mecânica. Quero dar orgulho para a minha família e não vejo a hora de contar para a minha mãe que a redação que fiz foi selecionada”. Além da escrita, outro talento que descobriu durante a internação é a aptidão para a ilustração. “(Apreendi) Há algum tempo quando eu estava em outra unidade (da Fundação Casa). Tinha aulas de desenho lá.”

A vida miserável nas regiões carentes de São Bernardo foi a inspiração do outro interno para redigir o texto ‘Necessidade’. As dificuldades pelas quais ele, sua mãe e seus três irmãos passaram foram transcritas para a memória literária. “Minha família passava fome e como eu não conseguia emprego, vi no crime a oportunidade de ajudá-los. Hoje em dia, penso que se eu tivesse mais maturidade, talvez eu não precisasse estar assim. Mas agora vejo a chance de ter um futuro melhor.”

Com o sonho de cursar arquitetura, o jovem se prepara para o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). “Estou estudando bastante. Daqui a três meses eu vou sair daqui e espero iniciar o curso. Agora sei que o crime não compensa e tomara que, com meu exemplo, meus colegas possam sair dessa vida que não presta para ninguém.”

Orgulhoso dos seus alunos, o professor de Língua Portuguesa Gilberto Moreira ressalta a importância do trabalho realizado com os internos. “Ver os resultados é ter a certeza de que isto funciona. Quando os texto passaram da etapa municipal da olimpíada já estávamos satisfeitos. Ficamos ainda mais felizes quando soubemos do avanço para a fase estadual. Eles são exemplos a serem seguidos e quem sabe não inspirem os outros para que eles possam ter uma vida nova.”




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