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Vai aí um pouquinho de paz?

Há décadas propagando ensinamentos budistas, monja Coen convida para um dedo de prosa em Sto.André

Marcela Munhoz
Do Diário do Grande ABC
16/04/2018 | 07:00
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Divulgação


Não dá para imaginar que no número 134 em movimentada avenida no Pacaembu, em São Paulo, mora tanta tranquilidade. Da fresta do portão vermelho, ornamentado por árvores, é possível enxergar estátua de Buda. Ele acreditava que o caminho para a libertação está na consciência que pode ser alcançada por práticas e crenças espirituais. Assim como a moradora da casa, Cláudia Dias Baptista de Sousa, conhecida há quase 40 anos como monja Coen.

Aos 70 anos, a missionária oficial da tradição Soto Shu, com sede no Japão, viaja por todo o Brasil disseminando palavras de conforto, reflexões e ensinamentos sobre a vida e morte. A paulistana estará dia 26 no Aramaçan, em Santo André, para uma palestra.

Mesmo ‘bombando’ no canal Mova no YouTube e adepta de todas as redes sociais, chamam a atenção as plaquinhas de ‘Favor manter os celulares desligados’ na entrada do Templo Tenzui Zenji. “É para que as pessoas percebam que não estão em lugar comum. O celular distrai e aqui não é para falar com o outro, mas com você mesmo”, explica a senhora careca de voz aveludada, convidando a sentar frente a frente para a entrevista. Foi quase uma hora de papo cabeça, ‘olho no olho’.

Na descrição de um dos seus mais recentes livros, Zen para Distraídos – que fez em parceria com o genro Nilo Cruz (sim, a monja teve uma filha, a Fábia, e já é bisavó) com o objetivo de esmiuçar o budismo para leigos – está a frase ‘problemas comuns de pessoas reais’. Ela garante ser como todo mundo. “Quando me vê, a pessoa cria uma fantasia. Tenho aparência diferente, mas é justamente para me identificar como discípula de Buda. Assim, existe um referencial. Mas isso não significa que sou um ser perfeito ou melhor do que ninguém. Às vezes, me irrito, sou desatenta. Se isso acontece fico doente. A atenção nos ajuda a saber a necessidade verdadeira do nosso eu.”

QUESTÃO DE OPINIÃO
Mas e quando os males, como a depressão, afetam as crianças? A doença é tema do livro O Sofrimento é Opcional, também assinado pela monja. “Estão dando remédios tarja preta para as crianças porque são agitadas. Onde estão os adultos que enxergam o potencial delas, que percebam que a energia delas é vital? Por isso, acredito que meditação é essencial dentro das escolas. Além disso, crianças são muito suscetíveis ao que acontece dentro de casa, na sociedade. E estamos vivendo uma época de muita raiva, as pessoas estão se colocando em lados opostos e odiando quem pensa diferente. Não é necessário desrespeitar. Basta aceitar as opiniões.”

Sobre a nuvem depressiva, polarização e onda de violência, a monja acredita que parte da culpa é da mídia mundial, que só dá espaço para reportagens negativas. “É só a bandidagem e políticos em um momento em que a política está tão desordenada, que os papéis estão trocados. A gente acaba não confiando em mais nada, na política, Educação, Saúde, porque só está sendo mostrado o que tem de errado. Às vezes, não somos capazes de enxergar o que está por trás da notícia. Se for bombardeado o dia inteiro por isso, nosso cérebro, que é lindo e sensível, vai achar que não tem solução.”

A monja Coen constuma dizer que só não comenta sobre futebol, portanto, faz questão de ter uma opinião política, mesmo afirmando que já perdeu seguidores – reais e virtuais – por expor o que pensa. Ela diz que não fala sobre o assunto em sala de aula, mas tem, sim, um posicionamento político e faz questão de votar. “Como cidadã, acho lamentável a prisão do Lula, aliás, desde o impeachment da Dilma, que acho que foi golpe. Ninguém conseguiu provar que ela ou o governo foram corruptos e mesmo assim foi tirada do poder. Se não bastasse, viram que Lula provavelmente seria eleito, quiseram acabar com ele e com o partido. Posso estar errada, mas considero isso impróprio. Quer dizer, não há mais condições de competir? Se não sou capaz, não deixo o outro jogar?”

Sobre cobrar para fazer palestras ou como usa o dinheiro da venda dos livros, a missionária conta que o valor é usado para manter a casa no Pacaembu (que é alugada), a comunidade Zendo Brasil, dar continuidade aos ensinamentos budistas e também está reunindo condições para ter a própria sede. “O ideal é que tenhamos um templo. Não precisa ser grande, mas nosso, adequado para as nossas práticas.”

A GRANDE VIRADA
Antes de fazer seus votos monásticos em 1983, a então jornalista já tinha vivido muitas vidas em uma – frase que ouviu diversas vezes da mãe. Para citar alguns momentos, se casou aos 14 anos, foi mãe e, abandonada pelo marido aos 17 (ela casou cinco vezes), teve fases de bebedeiras, uso de drogas, foi presa na Suécia e era figurinha carimbada nos bastidores do rock, especialmente por ser prima de Arnaldo Baptista e Sérgio Dias, da banda Os Mutantes. “Tive vários papéis diferentes desde a minha infância, mas não sei por que vivi tudo isso.”

Começou a ter contato com o budismo na redação dos jornais e decidiu, aos 36 anos, ser monja. “Na época, não achava que ia ser uma líder, mas sempre indaguei qual era o sentido da vida. Ser monja é exercício diário e constante. Precisamos sempre lembrar dos nossos propósitos de vida. As práticas meditativas ajudam a voltar ao caminho.”

Monja Coen – Palestra. No Clube Atlético Aramaçan – Rua São Pedro, 341, em Santo André. No dia 26, a partir das 20h30. Ingr.: R$ 60, R$ 80 e R$ 120 (www.bilheteriaexpress.com.br). 




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