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No Jd.Utinga, música é receita de vitalidade para idosa de 94 anos

Dona Mercedes Ribeiro toca instrumentos diversos sem nunca ter estudado para isso

Por Vanessa de Oliveira
Do Diário do Grande ABC
08/11/2014 | 07:00
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Andréa Iseki/DGABC


“Onde há música não pode haver coisa má”, dizia o escritor e dramaturgo espanhol Miguel de Cervantes. E dona Mercedes Martinez Ribeiro, 94 anos, filha de espanhóis e moradora do Jardim Utinga, em Santo André, assina embaixo. A alegria irradia na casa da família ao som dos variados instrumentos que ela toca com afinação, sem sequer ter estudado para isso. “A música faz com que a gente não pense em nada ruim”, fala.

Mineira de Guaxupé e residente em Utinga desde 1957, o primeiro contato instrumental de Mercedes foi na roça onde vivia e aconteceu de modo inusitado. “Nos arredores de onde eu morava tinham três rapazes, todos irmãos, que ficaram com uma doença na visão. Eles perguntaram aos meus irmãos se a mãe deles poderia trocar um cavaquinho que tinham por uma galinha”, lembra.

Troca feita, a menina, com então 8 anos e que sempre gostara de música, queria conhecer melhor o instrumento, porém, era impedida pelos irmãos. “Eles não deixavam eu pegar o cavaquinho de jeito nenhum, com medo que estragasse”, conta. “Mas, um dia, quando meus irmãos estavam trabalhando no cafezal, meu pai me viu triste e perguntou o que eu tinha. Falei que queria tocar o cavaquinho, mas que não me deixavam. Ele permitiu que eu pegasse, mas mexi bem pouquinho, com medo dos meus irmãos chegarem.”

No dia seguinte, Mercedes, sem nunca ninguém ter lhe ensinado, afinou três cordas e, mexendo um pouco aqui, outro ali, começou a tocar a canção Tristeza do Jeca.

A vida seguiu. Mercedes se casou, teve quatro filhos e o cavaquinho se perdeu. Mas a música estava em seu destino. Uma dupla de amigos utilizava a sala de sua casa para a gravação de canções. Nessa ocasião, 29 anos atrás, Mercedes havia ficado viúva há dois e os rapazes (já mortos), a quem ela tinha como filhos de coração, a incentivaram a acompanhá-los com algum instrumento. “Meu filho mais novo me presenteou com um cavaquinho e comecei a tocar a marchinha de Carnaval Jardineira. Cada dia saía um pedacinho. Ninguém me ensinou; Jesus e Maria foram meus mestres”, ressalta.

Além de cavaquinho, ela toca violão, bandolim, sanfona e violino. Diariamente, treina um dos instrumentos. “Tenho até calos nos dedos por isso”, fala, mostrando as marcas e destacando o sonho de se formar em música.

No dia 31 de outubro, Mercedes mostrou seu talento durante o concurso Miss Terceira Idade, promovido pela Unidade de Saúde da Família Dr. Moysés Fucs. Tocou três canções populares ao som de seu cavaquinho e também do violão. Não para menos, foi contemplada com o título de miss simpatia.

A multi-instrumentista tem 12 netos, 17 bisnetos e um tataraneto e já repassou a alguns deles os seus conhecimentos musicais. A longevidade tem um pedacinho de hereditariedade (a mãe partiu aos 102 anos), mas muito da fórmula da juventude está na paixão pela música e em tudo o que ela lhe faz sentir. “A música nos faz lembrar de tudo quanto é coisa, eu gosto demais. Quando toco, sinto emoção”, diz com um choro comovido que, por si só, fala mais que qualquer explicação.

Moradores cuidam de patos, tartarugas e peixes em praça

Simpáticas figuras compõem o cenário da Praça João Avero, localizada na Rua Nereu Ramos. Por ali vivem nove patos, aos cuidados dos moradores próximos da área.

“Criávamos coelhos, fizemos casinha e tudo para eles, mas roubaram os bichos. Então inventamos de criar patos e compramos um casal para colocar aqui”, conta o aposentado Antonio Carlos de Camargo, 63 anos, que vive no bairro há 36.

Antes de ser inaugurada em 14 de junho de 1992 pelo prefeito Celso Daniel (morto em 2002), o espaço era um terreno baldio. “Tínhamos preocupação que invadissem o local e, por isso, pedimos uma área de lazer.”

Desde então, a praça virou o xodó dos moradores. Eles plantaram árvores frutíferas como pés de abacate, amora, ameixa, pitanga, jabuticaba e até jaca. O colorido dos bancos foi garantido também pelos munícipes, além de algumas companhias para os patos: no lago, é possível ver tartarugas e peixes. Somam-se a eles os passarinhos, que encontram na praça, diariamente, frutas fresquinhas deixadas em um cantinho exclusivamente para eles.

Cercada de verde e sossego, a área é um convite para a contemplação. “As crianças que passam aqui ficam encantadas com os animais, é um espaço excelente, uma praça familiar”, ressalta Camargo, frisando a importância de preservar a estrutura. “Precisamos conscientizar a todos que frequentam esse local para que o mantenham assim pois, se não conservar, a própria natureza cobra.”

Entidade oferece nova vida a dependentes químicos

O mundo das drogas não é um caminho sem volta se a pessoa buscar ajuda. Desde 1993, a instituição Desafio Jovem de Santo André trabalha na recuperação de adolescentes e adultos com dependência química.

O trabalho como policial militar fez com que o fundador e diretor da entidade, Valter Rogato, 62 anos, conhecesse essa triste realidade e sentisse a necessidade de fazer algo para reverter o desolador panorama. “Com meu salário, aluguei uma casa em outro bairro da cidade, o Parque Novo Oratório, e lá comecei o serviço em 1981. Um dia, alguém que conhecia o trabalho contatou uma instituição sueca que veio nos conhecer e, vendo a nossa dificuldade, construíram a sede em Utinga”, conta.

A casa tem capacidade para receber 60 pessoas, que buscam o local de maneira voluntária e contam, gratuitamente, com hospedagem, alimentação, assistência psicológica e psiquiátrica, além de cursos profissionalizantes. Atualmente, 50 homens, com idade entre 18 e 58 anos, são atendidos. O trabalho é mantido por meio de convênios com os governos estadual e federal e também doações.

Rogato acredita que mais de 10 mil pessoas já passaram pela instituição. Isaías Gonçalves Ferreira, 29, foi uma delas. Dependente químico dos 14 aos 17 anos, ele aceitou ser ajudado, retomou os estudos e hoje está na entidade em condição bem diferente: como psicólogo.

Com conhecimento de causa, ele fala que um importante passo para o recomeço é saber ouvir. “Por não ouvir as pessoas, o dependente não reconhece a dimensão do problema e acaba não admitindo a ajuda.” Mais que conhecimento profissional, Ferreira conta também com a experiência de vida para fazer com que muitas pessoas, assim como ele, deem a volta por cima.

Jovem haitiano é liderança em comunidade que abriga seu povo

Ao passar pelo Jardim Utinga, é comum ouvir o sotaque bem carregado de um povo que está dia após dia aprendendo a falar o Português. Isso porque o bairro abriga 700 haitianos, nas proximidades do núcleo dos Ciganos, que deixaram o Haiti em busca de melhores condições de vida. O país, que tem como idioma local o crioulo e oficialmente utiliza o francês, sofreu, em 2010, terremoto de grande escala que matou mais de 300 mil pessoas.

Em solo onde muita coisa ainda é desconhecida, Jean Sony Mathurin, 29 anos, que está no Brasil há dois e já fala bem a nossa língua, é liderança na comunidade. É ele quem leva as necessidades de seus compatriotas à Prefeitura da cidade. “Eles confiam em mim e, no que puder, ajudo para retribuir essa confiança.”

Mathurin lembra que a adaptação em terras brasileiras não foi fácil. “Eu não sabia falar nem bom dia em Português. Conhecia um pouco de inglês e isso me ajudou quando cheguei aqui.”

Adaptado à nova vida, ele planeja, no próximo ano, ingressar na faculdade de Engenharia Civil. “Quero cursar o Ensino Superior, arrumar um trabalho fixo (atualmente ele vive de bicos), ajudar a minha família e o meu povo.” 




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