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Equilíbrio é marca de coveiros

Profissão requer força física para trabalho braçal; emocional é decisivo para lidar com família de mortos

Por Flavia Kurotori
Do Diário do Grande ABC
02/11/2019 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


 A região conta com pelo menos 73 coveiros que trabalham em 16 cemitérios municipais. Além de realizarem sepultamentos, exumações e outras tarefas, os profissionais destacam o esforço físico e o preparo emocional requeridos pelo ofício. O primeiro é essencial para cumprimento das atribuições. O segundo, por sua vez, é imprescindível no momento de lidar com familiares de falecidos.

Para Mário Sérgio Antoniol, 67 anos, sepultador mais antigo de Santo André, com 46 anos de atuação no Cemitério da Saudade, na Vila Assunção, estes são aspectos aprendidos na prática. “Prestamos atendimento às famílias, que chegam constrangidas até nós. Aprendemos a conviver e a lidar com a dor dos outros”, relata. “A pessoa, quando vem trabalhar no cemitério, se adapta e ganha outro preparo (de como lidar com pessoas).”

Atraído pelo sossego e pela paz da necrópole, ele decidiu seguir na profissão durante visita ao local feita com o sogro. “Antes, as pessoas tinham medo e repulsa dos coveiros, mas hoje isso mudou e não tem mais este temor”, conta, destacando que há casos em que os visitantes se tornam conhecidos dos funcionários do cemitério. “Há casos de entes que perderam alguém há 20 anos e vêm toda semana, às vezes, mais de uma vez”, adiciona.

Inclusive, Antoniol – que faz, aproximadamente, oito enterros e exumações por mês – divide o ofício com o filho há 20 anos e a neta, 7, se orgulha ao falar para os colegas na escola que o avô “trabalha no cemitério”. “Ainda mais agora, que posso trabalhar ao lado do meu filho, eu não trocaria por nenhuma outra profissão”, assegura.

Durante quase meio século de atuação, dois fatos ficaram na memória do profissional. Um deles foi o enterro do prefeito de Santo André Celso Daniel, em 2002. “Nunca vi nada parecido, tamanha a movimentação”, comenta. Outra data inesquecível foi em dezembro de 2015, quando homem envolto com suposta bomba entrou na necrópole.

Coveiro há 13 anos no Cemitério Jardim Santa Lídia, no bairro de mesmo nome, em Mauá, José Alberto Bastioni, 48, aponta o esforço físico como principal desafio da função. “Cada sepultamento leva, em média, 70 tijolos, considerando sete gavetas (média diária de enterros), são quase 500 tijolos que precisamos manusear por dia”, explica.

Em relação ao preparo emocional, ele afirma que já se acostumou a lidar com a situação. “Às vezes, a gente se emociona, mas é raro porque aprendemos a separar as coisas (o pessoal do profissional)”, assinala. Situação que não conseguiu segurar a emoção foi há alguns anos, no momento do sepultamento de um bebê. “Entrei lá (no velório) e vi várias toalhinhas estendidas com o nome da criança e notei que teve toda a expectativa da chegada dela, que acabou falecendo, e acabei me emocionando. Tive que sair um pouco antes de continuar (com o procedimento para sepultamento).”

Já para Everton Fontana, 31, coveiro há três anos também no Cemitério Jardim Santa Lídia, o principal desafio do ofício é a coragem. “Durante a exumação, precisamos entrar e tirar um corpo que ainda pode estar em estado de decomposição, mas, para quem tem bom psicológico, é um trabalho que vale a pena.”

Cemitério faz nascer outras profissões

Ainda que não atue em sepultamentos ou exumações, Edna da Silva, 53 anos, trabalha há 11 em cemitérios de Santo André. Como conservadora de jazigos, ela faz a manutenção das sepulturas conforme solicitação das famílias.

No momento, esta é sua única fonte de renda e ela não busca outra ocupação. “Já tentei trabalhar em mais um emprego além das limpezas, porém, hoje, fico muito cansada e toma muito o meu tempo, então, preferi ficar com este serviço”, explica.

Em razão do Dia de Finados, celebrado hoje, a demanda chegou a dobrar nos últimos dias. “Toda semana tenho pelo menos dois, três jazigos para cuidar. Por mês, limpo em média 100, mas só nesta semana eu já limpei 75”, conta.

CELEBRAÇÕES

Hoje, as necrópoles do Grande ABC esperam receber 124 mil pessoas. Programação de missas especiais foi elaborada pela Diocese de Santo André, responsável pela região, e pode ser conferida no link https://www.diocesesa.org.br/2019/10/confira-a-programacao-completa-das-missas-no-dia-de-finados/. (colaborou Yasmin Assagra)




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