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Família Lemes organiza almoço de Natal para pessoas carentes

Há 16 anos, cerca de 30 pessoas trabalham em prol do evento no Parque S.Bernardo

Por Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
20/12/2014 | 07:00
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Orlando Filho/DGABC


No Parque São Bernardo, todos os moradores sabem indicar onde é a casa da família Lemes, na Rua Paula Souza. A residência está sempre de portas abertas, de modo que qualquer um que chegue é bem recebido.

Além disso, os integrantes da família coordenam escola de samba e grupo de Congada (festa folclórica) tradicional no bairro. Porém, o evento mais aguardado pela comunidade é o almoço de Natal.

Realizado há 16 anos Pelos Lemes, que chegaram há 40 anos de Cordislândia, pequena cidade de Minas Gerais, o projeto surgiu com o intuito de ajudar as pessoas mais necessitadas. De acordo com a dona de casa Maria Aparecida do Rosário Lemes, 53 anos, o evento foi crescendo com o passar dos anos. “No primeiro almoço eram poucas pessoas, mas agora temos que fazer em uma escola para comportar todo mundo. No ano passado acho que compareceram umas 7.000 pessoas. Neste ano esperamos mais”, afirmou.

No cardápio tem arroz, feijão, frango, carne assada, macarrão e farofa. Além disso, há um bolo especial, distribuição de frutas, como melancia, e panetones. “Lembro que quando começou a gente fazia só com arroz, feijão e frango. Foi crescendo e até o cardápio melhorou”, contou Maria Aparecida.

Para que tudo fique pronto a tempo, as doações começam a chegar em outubro. Nada é pedido, mas os moradores sabem onde levar e o que é necessário. A dispensa já está cheia.

Os 30 integrantes da família enfrentam uma dura véspera de Natal para que tudo esteja impecável no almoço. “Desde que começamos a fazer isso, não temos mais ceia. Passamos a noite inteira trabalhando para que tudo esteja pronto”, disse Maria Aparecida, que é uma das irmãs da segunda geração da família.

A dona de casa Marinalda Souza Oliveira, 43, é casada com um dos irmãos Lemes. Ela é a responsável pelos presentes que as crianças recebem no almoço. “Aceitamos brinquedos novos e usados. Quando são usados, vejo se tudo está certo, lavo, arrumo alguma coisa e embalo. A última semana passei fazendo isso todos os dias”, contou.

Os presentes são entregues por dois Papais Noéis que se revezam para atender todas as crianças. A família ainda está aceitando doações, principalmente de brinquedos. Quem vai até lá e deixa uma sacolinha é recebido com um sorriso e um abraço.

A motivação para tanto trabalho é simples: ajudar. “Nada paga quando vemos as famílias comendo e confraternizando essa data especial como é o Natal, o nascimento de Cristo. Tudo vem revertido para nós em bênçãos dos céus. Temos saúde e, enquanto tivermos força, vamos fazer questão de realizar o almoço”, afirmou Maria.

Dona Cotinha alimenta moradores

A generosidade está no sangue da família. A matriarca Maria do Carmo Ribeiro Lemes, 87 anos, conhecida como Dona Cotinha, não só participa do almoço natalino como oferece alimentação para os moradores de rua todos os dias.

A iniciativa ocorre há quase o mesmo tempo do almoço de Natal: 14 anos. “Os moradores de rua vêm até em casa com potes e eu encho todos com comida. Hoje já não sei quantos aparecem, acho que uns 50, mas eles trazem mais de uma marmita para poder levar a refeição aos amigos.”

Segundo dona Cotinha, o próprio semblante dos necessitados muda depois que eles começam a buscar almoço na residência. “São pessoas muito tristes, que passam por dificuldades, mas aqui elas encontram alimento e uma palavra de carinho”, afirmou.

A ação começou como uma terapia para a própria dona de casa. Conforme contou a filha, Maria Aparecida do Rosário Lemes, a mãe estava triste com a morte de uma irmã e de seu marido, Antonio da Silva Lemes. “Ela só ficava na janela, olhando em direção ao cemitério e pensando neles. A saúde dela começou a ficar ruim e a pressão subir. Ela teve essa ideia e aí começou a cozinhar todos os dias para quem precisa”, disse.

Após o início do almoço, dona Cotinha nunca mais teve problemas de pressão. Atualmente, prestes a completar 88 anos, tem saúde de ferro.

Para começar a fazer as refeições, ela levanta às 7h. O cardápio também é montado com doações e varia dia a dia.

A tradição mineira é mantida na refeição. Nada de fogão a gás, o preparo é todo no fogão a lenha, em grandes panelas. “Fico muito contente com as pessoas que ajudo. O importante é ter amor ao próximo, como Jesus Cristo nos ensinou”, disse Cotinha.

Questionada se pensa em parar de fazer isso, ela não quer nem ouvir falar no assunto. “Enquanto vida e saúde Deus me der, vou continuar.”

Animada para o almoço de Natal, ela também não fica de fora do grande evento do ano. Ajuda na preparação de todos os pratos e conversa diariamente com a irmã que ficou em Minas, dona Maria Júlia, que também manda doações.

Para justificar o que faz, ela usou uma frase da oração de São Francisco de Assis. “É dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado. Sabe, cada quilo de comida vem em bênção.”

Benzedeira garante força aos vizinhos por meio da fé

A fila na porta da sala de dona Ana Maria Lemes, 59 anos, é grande. Na maioria dos dias, cinco grandes bancos de madeira não dão conta do número de pessoas que vão até lá receber uma bênção.

Dona Ana é benzedeira por vocação, ofício que aprendeu com o pai, Antonio da Silva Lemes. “Tinha 12 anos quando comecei a benzer lá em Minas. Foi meu pai que me ensinou, mas você tem que nascer com o dom.”

É o dom que a mantém, de segunda-feira a sábado, atendendo pessoas de todo lugar de São Paulo que vêm relatar problemas e buscar fortalecimento na fé. Ela começa a benzer pela manhã e vai até a última pessoa.

“Eu benzo média de 500 pessoas por dia. O que me fortalece para ajudar todo mundo é a minha fé e confiança. Enquanto eu viver, é isso que vou fazer, é a minha missão.”

Católica, todos os dias ela vai à missa para se fortalecer a fim de enfrentar a semana. “Estou à disposição de todos, minha vida é essa”, justifica.

Uma das fiéis que lá estavam é a desempregada Ivanir de Oliveira Santos, 51, moradora do Jardim Calux. “Estava com uma dor nas costas há muito tempo. Me falaram da dona Ana, ela me benzeu e estou bem. Hoje (ontem) vim trazer mais alimentos e também pedir uma bênção para conseguir um emprego.”

Já Deiseane Mattos, 24, moradora do bairro, vem sempre se fortalecer. “Ela é maravilhosa, me trata bem. Aqui é um lugar que você se sente bem. Eu também vim pedir ajuda para conseguir trabalho.”

Questionada se tem lembrança de algum caso em especial, dona Ana nega. “Cada um que passa por aqui é especial para mim. É por todos vocês que rezo todos os dias e peço a Deus.” 




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