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Cultura do cuidado
Dom Pedro Cipollini
03/01/2021 | 00:01
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Iniciando o novo ano, desejamos a paz a todos. Foi o que proclamaram os anjos no Natal: ‘Glória a Deus nas alturas e paz na Terra às pessoas de boa vontade’. O ano que passou carrega sua marca: a explosão da pandemia.

A crise provocada pelo novo coronavírus se transformou em um fenômeno plurissetorial e global, agravando fortemente outras crises inter-relacionadas, como a climática, alimentar, econômica e migratória, e provocando grandes sofrimentos e incômodos.

O pensamento do papa na sua mensagem pelo Dia da Paz, neste 1º de janeiro, foi às pessoas que perderam um familiar ou uma pessoa querida ou a quem ficou sem emprego. E um agradecimento especial a quem trabalha em hospitais e centros de saúde, com um renovado apelo às autoridades para que as vacinas sejam acessíveis a todos.

É sobre este ponto que desejo chamar sua atenção: o cuidado, o cuidar do outro, do meio ambiente, da vida. A pandemia ressaltou de modo significativo o papel do cuidador. Os hospitais e os enfermos receberam atenção e cuidados de um grupo heroico de cuidadores que salvaram milhares de vida.

Na Bíblia temos logo no início, no livro do Genesis, um episódio marcante. Dois irmãos, Caim e Abel, são protagonistas de uma tragédia. Por inveja, Caim mata seu irmão Abel. O primeiro assassinato relatado no Livro Sagrado. 

Deus então pergunta a Caim: onde está seu irmão? E Caim responde: por acaso sou guardião de meu irmão? 

Sim, no projeto de Deus, somos feitos guardiões do planeta Terra e irmãos cuidadores uns dos outros. O mundo seria diferente se assim funcionasse. Seria melhor.

Jesus encarna o ápice da revelação do amor do Pai pela humanidade. No ponto culminante da sua missão, Ele, que passou a vida fazendo o bem, amando e servindo os outros, sela o seu cuidado por nós, oferecendo-Se na cruz e libertando-nos da escravidão do pecado e da morte.

Esta cultura do cuidado se aprimorou na Igreja com as obras de misericórdia corporal e espiritual, que no decorrer dos séculos ficaram visíveis em hospitais, albergues para os pobres, orfanatos, lares para crianças e abrigos para forasteiros.

O cristianismo ajudou a amadurecer o conceito de pessoa, a ponto que, hoje, podemos dizer que toda a pessoa humana é fim em si mesma, e nunca um mero instrumento a ser avaliado apenas pela sua utilidade: foi criada para viver em conjunto na família, na comunidade, na sociedade, onde todos os integrantes são iguais em dignidade. E desta dignidade derivam os direitos humanos.

Precisamos seguir os rumos que indicam novos tempos para a humanidade, seguir uma bússola para um rumo comum, um rumo mais humano. Se o ser humano tem direitos, tem também deveres, como o cuidado dos mais vulneráveis e também da criação.

Somos convidados a nos tornar profetas e testemunhas da cultura do cuidado, a fim de preencher tantas desigualdades sociais. A bússola dos princípios sociais de preservação e cuidado com a vida, vale também para as relações entre as nações. Todos perdem com a violência e os conflitos armados, com o desperdício de dinheiro gasto em armamentos. Quando poderiam ser utilizados para o desenvolvimento em especial das áreas de pobreza. Todos ganham com a paz.

As causas de conflitos são muitas, mas o resultado é sempre o mesmo: destruição e crise humanitária. É preciso educar para a paz, para uma educação inclusiva e aberta ao universal.

Sabemos que não poderá haver paz sem a cultura do cuidado, o contrário da cultura do lucro e da exploração que implodiu com a pandemia.

Neste tempo, em que a barca da humanidade, sacudida pela tempestade da crise, avança com dificuldade à procura de um horizonte mais sereno, o leme da dignidade da pessoa humana e a bússola dos princípios sociais fundamentais podem consentir-nos de navegar com um rumo seguro e comum.

Não cedamos à tentação de nos desinteressarmos dos outros, especialmente dos mais frágeis.




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