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Reflexos do passado
Por Rodolfo de Souza
30/01/2020 | 00:01
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Poucas coisas nesta vida se apresentam tão saudosistas em nossas mentes como uma velha estação de trem. Sobretudo essas de cidades de interior, que marcaram chegadas e partidas em tempos que se perderam na memória. São cenas em preto e branco, meio desbotadas que, às vezes, vêm só para bulir um bocadinho com os corações de longa estrada.

Pois foi justamente para uma destas que, repleto de emoção, apontei a câmera certeira de meu celular, afoito por tudo registrar. E ela cumpriu direitinho o seu papel, auxiliando-me na composição de um quadro que a memória trouxe à tona. Cenas de um passado que lá se vai à distância é o que me veio ali. E esse encontro com as décadas antigas se deu no último fim de semana em que viajei a um lugar que marcou infância e adolescência deste escritor que ama uma boa história e que, portanto, não poderia deixar de amar a sua própria. Creio que todas as pessoas possuem uma, repleta de momentos felizes, outros não tão felizes, aventuras... Fato é que somos seres históricos, como bem disse Paulo Freire. Certa vez, inclusive, fui abordado por uma aluna que me perguntou sobre o porquê de velho gostar tanto de contar histórias. É porque têm muitas para relatar – respondi-lhe.

A avenida, antes chamada estrada, também fez parte do roteiro. Logicamente que o asfalto com boa sinalização agora encobre as pedras que serviram de calçamento um dia. Era, pois, o caminho que me conduzia à casa humilde dos meus avós. Lembro-me do grande quintal com árvores frutíferas e hortas cuidadas pelo velho Antonio, espanhol que carregou por toda a vida o orgulho de ser granadense.

Nica, minha avó, passou 70 anos no Brasil e daqui se despediu falando o idioma de sua terra natal. Pessoa humilde que reunia os netos para contar os causos de sua infância nos campos da Espanha. Aliás, o jeito de falar da gente de lá me torna nostálgico por fazer-me lembrar das boas conversas com ela.

Que me perdoe o caro leitor, mas não podia deixar de dividir com você a experiência de rever o passado assim, tão vivo, tão presente. Mesmo porque, sei que também carrega um, e que está sempre pronto a dividi-lo com alguém. Ainda que seja difícil, às vezes, conseguir um ouvido que se disponha a compartilhá-lo. É assim, afinal, que o ser humano lida com o sentimento pungente que as lembranças sempre trazem: falando sobre elas. E sua história é parte integrante dele, assim como a história do mundo é um pedaço de cada um de nós, embora poucos se deem conta disso.

São marcas tatuadas no espírito das pessoas os acontecimentos que, ano após ano, tornam o ser humano mais rico, uma vez que a maturidade que advém das tempestades e dos dias ensolarados serve para torná-lo mais forte, mais ajustado para as questões da vida. Pelo menos é assim que deveria ser. Afinal, de que servem tantas marcas no coro senão para nos tornar mais fortes?




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