Economia Titulo Grande ABC
Número de feirantes no Grande ABC cai 42,8% em dois anos

Quantidade de profissionais passou de 3.500
para 2.000; classe se reinventa para atrair clientes

Flavia Kurotori
Especial para o Diário
27/08/2017 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC


O número de feirantes que atuam na região caiu quase que pela metade, 42,8%, nos últimos dois anos. Em agosto de 2015, eram cerca de 3.500 profissionais, enquanto que hoje, são 2.000, conforme dados do Sindicato dos Feirantes do Grande ABC. Ao mesmo tempo, a quantidade de feiras livres nas sete cidades também recuou, 12,2%, e passou de 204 para 179.

Crise econômica, concorrência com supermercados e a necessidade de ter dinheiro vivo para realizar as compras foram alguns dos fatores que contribuíram para reduzir o espaço do feirante na região. Para driblar o cenário e dar sobrevida à categoria, os trabalhadores começaram a se reinventar, ao adotar máquina de cartão – com pagamento no crédito, mesmo que valores baixos –, entrega de panfletos e cartões na vizinhança para divulgar seus produtos. Além disso, a manutenção do bom humor também é apontada como fundamental para fidelizar os clientes.

Feirante há uma década, José Ademir da Silva de Oliveira Júnior, 22 anos, que assumiu a banca de frutas da família há quatro, afirma que as vendas caíram cerca de 70% desde que debutou na profissão. “A comodidade por comprar tudo no mesmo lugar e a concorrência com mercados e sacolões são muito grandes, até colocamos a ‘maquininha’ de cartão para melhorar”, comenta.

Unanimidade entre os profissionais, o (bom) contato com o público é a chave para ganhar sua confiança e tornar a feira um lugar agradável para se trabalhar. José Raimundo Gomes, 61, que atua na feira desde os 7, dá a dica: “Tem que tratar bem o freguês, porque aí ele volta. Se maltrata, não volta mais. E vai para o concorrente”. Atualmente, ele auxilia na limpeza de alface, como autônomo, para complementar a renda de caminhoneiro.

Para Márcio Aparecido de Azevedo, 45, há 20 anos à frente de barraca de tomates, a qualidade dos produtos é a chave para não perder a clientela. “O produto é fresquinho, pois compramos todo dia, além de ser mais em conta do que em outros lugares”, defende.

Seu argumento também é defendido pela aposentada de São Caetano Lúcia Picariello, 85. “A feira é mais barata. No mercado é tudo por quilo, até um grama você paga. Aqui, laranja, mexerica e banana, essas frutas que são pesadas, saem por valor mais acessível.”

A dona de casa são-bernardense Luzia Silva Sanches, 68, comenta que não apenas os preços são atrativos, mas a qualidade também: “Os produtos têm menos agrotóxicos.”

Na avaliação do presidente do Sindicato dos Feirantes do Grande ABC, Odair Roberto Loureiro, os consumidores que tinham de migrar para os mercados ou hortifrútis já o fizeram. “As pessoas costumam gostar da feira justamente por conta da proximidade com quem cuida do que elas irão comprar. Nos outros estabelecimentos a gente não vê isso”, justifica.

Apesar do enxugamento das feiras e da classe – que celebrou seu dia na sexta-feira, 25 – nos últimos dois anos a crise econômica, que contribuiu a esse movimento, agora tem atuado de forma contrária, segundo ele. “Algumas pessoas que não conseguem emprego acabam recorrendo ao trabalho na feira.”

COMÉRCIO NOTURNO - No Grande ABC, das 179 feiras, 13 são noturnas – sem contar as de shopping – leia mais abaixo. A dupla jornada reforça o orçamento dos feirantes, já que o horário alternativo ganha cada vez mais adeptos. “Se uma barraca fatura R$ 2.000 em uma feira tradicional, na noturna vende mais ou menos R$ 500. Pode não parecer muito, mas, caso tenha seis delas em um mês, serão R$ 3.000 a mais”, exemplifica Loureiro.

É o caso do feirante Osvaldo Francisco Antonio, 36, que monta banca de verduras de manhã e à noite. “Tem dias que vale a pena e, outros, nem tanto. Mas é preciso persistir.”

Trabalhando há seis anos na banca de leguminosas da família, Ricardo Alves de Macedo, 24, afirma que está em busca de comércio noturno, pois depender apenas da renda da feira diurna “não está fácil”, e ele precisa ampliar sua renda.

Por dia, Loureiro conta que um autônomo pode ganhar entre R$ 50 e R$ 100, e quem é funcionário fixo, pode chegar a tirar até R$ 2.000.


Septuagenários, tios de Angélica vendem bananas

O casal Guiomar e Raul Salvatori, 70 e 78 anos, respectivamente, mantém uma barraca de bananas em feiras livres de São Caetano há 24 anos. Apesar da idade, eles seguem na ativa com o objetivo de complementar a aposentadoria. “Trabalhamos para melhorar a nossa qualidade de vida. A aposentadoria só dá para pagar o convênio”, explica Guiomar. “Mas eu gosto muito porque a gente pega amizade e distrai a cabeça.”

O fato não seria incomum, em se tratando de aposentada por idade que recebe um salário mínimo e seu marido, que ‘pendurou as chuteiras’ na metalúrgica TMZ, e ganha cerca de três salários mínimos. No entanto, há um fator inusitado: eles são tios da apresentadora Angélica, da Rede Globo.

Guiomar, irmã de Angelina, mãe da Angélica, conta que, na infância, a artista brincava muito com seus primos e que sempre reuniam a família para ir à praia. Ela lembra que a apresentadora, natural de São Bernardo, era uma criança muito doce e amorosa. Entretanto, com o casamento e a mudança para o Rio de Janeiro, a tia fala com ela raramente, e não chegou a conhecer os filhos dela. “A gente quase não tem contato porque ela trabalha muito”, diz. “Eu compreendo, pois eles, às vezes, podem querer ligar, mas não têm tempo.”

Apesar da distância com a sobrinha, o casal é bem próximo das outras cinco irmãs de Guiomar. “Nos vemos todo fim de semana”, conta.


Primeira versão de feira em shopping foi lançada em 2015

Lançada no Dia do Feirante, 25 de agosto, dois anos atrás, a feira do Shopping Metrópole, em São Bernardo, pioneira na região, já comercializou 400 toneladas de alimento e recebe, em média, 2.000 pessoas por dia. Das 13 barracas disponíveis, seis oferecem opções de alimentação, como pastel e caldo de cana.

Na avaliação do superintendente do centro de compras, Fábio Deganutti, a iniciativa beneficia aqueles que trabalham e moram na região, pois acontece em um horário alternativo e em local cômodo. “A feira virou ponto de encontro do shopping”, comenta. Ele também avalia que, no início, as pessoas iam apenas por curiosidade, no entanto, agora os clientes foram fidelizados.

Com parceria do Conagro (Comércio de Produtos Agropecuários), a feira emprega cerca de 50 pessoas, entre feirantes e colaboradores do shopping que auxiliam na montagem. Quanto ao movimento, Deganutti diz que o evento potencializa número de visitantes às terças-feiras, das 17h às 21h.

Em fevereiro de 2016, o Atrium Shopping, em Santo André, passou a realizar feira orgânica, aos sábados, das 10h às 15h. Em março daquele ano, foi a vez de o Shopping Praça da Moça, em Diadema, lançar mão do comércio de frutas, legumes e verduras todas as quartas-feiras, das 16h às 22h, e aos sábados, das 10h às 14h. E, em maio, o andreense Shopping ABC aderiu à iniciativa, com oferta de produtos orgânicos, às sextas, entre 13h e 21h. 




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