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Matrículas da EJA têm queda de 8,7% em cinco anos na região

Faltam estímulos para que jovens e adultos voltem e permaneçam nas salas de aula

Juliana Stern
Especial para o Diário
14/10/2018 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


A EJA (Educação de Jovens e Adultos), voltada às pessoas a partir dos 15 anos que buscam recomeçar os estudos, vem perdendo alunos na região. Nos últimos cinco anos, o Grande ABC registrou queda de 8,74% nas matrículas. O número de alunos caiu de 28.459 para 25.971 no período (veja tabela abaixo). Para especialistas, o programa ainda não oferece estímulos suficientes para que o jovem e o adulto voltem aos estudos. Além disso, os métodos de ensino nem sempre se adaptam às necessidades de aprendizagem dos matriculados.


Para a consultora em Educação e doutora pela PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro Andrea Ramal, as maiores dificuldades do programa em atrair e manter os alunos estão na insuficiência de incentivos para que o jovem e o adulto que interromperam os estudos voltem às salas de aula. De acordo com a especialista, os problemas começam com as instalações. “As escolas não são adequadas aos adultos. As salas de EJA funcionam onde crianças estudam, com mobília voltada para as crianças.”

O método de ensino também apresenta falhas, segundo Andrea, visto que nem todos os professores do programa são formados em andragogia – ciência de orientar adultos a aprender –, ou seja, não conhecem a fundo como transmitir conhecimento ao público-alvo. “O adulto aprende de forma diferente. Ele precisa de algo que tenha ligação direta com a vida, com a realidade. Os professores, que muitas vezes também dão aulas na Educação regular, ensinam como se fosse para crianças ou adolescentes. Seria necessário uma revisão no currículo.”

Para a dirigente regional de ensino de Santo André Ariane Butrico, a diminuição no número de matrículas pode representar algo positivo. “Isso mostra que se conseguiu alcançar certa correção da idade-série. Tivemos aumento nas matrículas do Ensino Médio”, afirma a dirigente, que atribui o feito às diminuições de repetentes que não conseguiam acompanhar o ensino regular, terminando os estudos pela EJA.

Josefa Gomes, 51 anos, pensionista e moradora do Jardim Irajá, em São Bernardo, voltou a estudar com 46 anos. Ela se formou em 2013 e até chegou a entrar na faculdade. A pernambucana veio para São Paulo com 13 anos, mas os estudos foram interrompidos antes disso, por influência dos pais. “Na minha família as mulheres só estudavam até a 4ª série (Ensino Fundamental), e depois aprendiam a bordar e a cuidar da casa.”

Uma vez em São Paulo, Josefa começou a trabalhar e usou seu salário para terminar o Ensino Fundamental em escola particular. Precisou interromper mais uma vez os estudos quando ficou grávida. “Engravidei, tive que casar, e o pai da minha filha não deixava eu ir para escola nem trabalhar.”

Depois de 15 anos de casamento e quatro filhas, Josefa voltou a pensar na sua formação. Fez cursos de História da Arte, animação, encadernação e, finalmente, voltou ao Ensino Médio. “Cuidava da casa e das filhas de manhã, fazia curso de cabeleireira à tarde, ia para a escola à noite. Ainda estudava e fazia os trabalhos da escola quando chegava em casa”, se vangloria. Depois de formada, ela prestou o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e diversos vestibulares, sendo aceita em faculdades como Anhembi Morumbi e FMU, mas não continuou pela dificuldade de locomoção até o campus, na Capital. No entanto, ela ainda não desistiu do Ensino Superior e pretende começar graduação de Direito em São Caetano, no próximo ano.

Especialista cobra políticas públicas de incentivo ao retorno escolar

Para a consultora em Educação Andrea Ramal, as administrações públicas falham em divulgar a EJA (Educação de Jovens e Adultos). Para ela, são necessárias políticas voltadas para incentivar a procura pelo programa. “Nunca vemos uma propaganda do governo incentivando, algo que mostre que o aluno adulto não está sozinho e que a educação dele também é importante. Às vezes, a informação nem chega em quem precisa”, afirma.

No Grande ABC, a divulgação das vagas é feita principalmente por meio de faixas, panfletagem e cartazes próximos às escolas. Em São Bernardo, por exemplo, além dos panfletos e cartazes, as vagas são divulgadas semestralmente apenas por chamamento público no portal Notícias do Município. Já em Santo André são realizados mutirões formados por professores e profissionais da unidades que percorrem as ruas do bairro para abordagens aos munícipes, fazendo divulgação ‘boca a boca’, mas não disponibilizam a informação digitalmente.

Em São Caetano, a divulgação ocorre por meio de edital de abertura de inscrições, no início do primeiro e do segundo semestre letivos. Em Ribeirão, as inscrições estão abertas durante todo o ano e são feitas apenas no Centro de Formação de Profissionais da Educação, de segunda a sexta, das 8h às 17h.

Para Andrea, é necessário estudar novas maneiras de chegar na população que está apta à EJA, além de assegurar apoio para o estudante. “Muitos têm baixa autoestima, acham que estão muito velhos para voltar, acham que não têm capacidade. É preciso mostrar que eles não estão sozinhos, não estão abandonados e que eles também são importantes.”




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