Setecidades Titulo Saúde
Inverno complica estoques dos bancos de sangue

Tendência é que nesta estação doações
caiam até 30%, agravando a situação já difícil

Yara Ferraz
26/06/2017 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


 O período do inverno, além do frio, traz grande perigo aos bancos de sangue: a diminuição na frequência dos doadores. A expectativa é que os estoques caiam em até 30% durante a estação nos hemocentros do Grande ABC. Com o início do período nesta semana, os efeitos já são observados. Segundo a Colsan (Associação Beneficente de Coleta de Sangue), a capacidade dos quatro postos da região em que está à frente está em 70%, com média de 4.660 doadores mensais – número insuficiente para atender a demanda. Juntos, os locais (dois em Santo André, um em São Bernardo e um em São Caetano) são capazes de manter 6.600 doadores por mês.

No início desta semana, a central da Colsan, localizada em São Bernardo, mantinha estoque de 600 bolsas de todos os tipos de sangue. O armazenamento é utilizado para 15 dias, porém o ideal seria para o período de 20 dias. A distribuição é feita em 12 hospitais da região e Baixada Santista. “O gargalo maior é o sangue de emergência, o tipo ‘O’ negativo, e também as plaquetas, que são retirada e têm durabilidade curta, de cinco dias, no máximo. Usamos muito, principalmente em pacientes oncológicos”, afirma o gerente médico da Colsan do ABC, Toebaldo Antônio de Carvalho. Ele alerta que os estoques dos tipos ‘A’ e ‘B’ negativos estão em nível crítico.

Em Diadema, cujo banco não está sob responsabilidade da Colsan, a hematologista e coordenadora do hemocentro do Hospital Estadual Serraria, Melca Maria Oliveira Barros relatou que diariamente são recebidos entre 13 e 14 doadores, sendo que a expectativa é de, ao menos, 20. No início da semana, para os tipos ‘O’ positivo e ‘O’ negativo, o estoque disponível era suficiente para apenas um dia.

Conforme o diretor da Hemorrede da Secretaria Estadual da Saúde, Dante Longhi, o ideal é que os estoques estejam em 100%. “Abaixo disso, as consequências começam a aparecer, principalmente para procedimentos de urgência, e a situação é de risco.”

Acostumado ao gesto, o piloto Claudio Romero, 58 anos, faz doações há 35, principalmente no inverno. “Sei que há preocupação nesse período. Faço questão de vir”, conta o morador do Ferrazopólis.

A professora Marcia Mendes Alves Andrade, 28, doou três vezes. “Comecei quando um aluno precisou e, desde então, criei o hábito. Tive medo na primeira vez, mas aprendi a importância do gesto.”

A diarista Aurilene Pereira da Silva Campos, 49, fez a doação pela primeira vez após ser convencida pelos familiares. Ela precisou esperar o período de 12 meses, já que fez tatuagem. “Na minha casa todos doam. É importante ajudar sem olhar a quem.”

Segundo declarou Carvalho, as capacidades diárias dos hemocentros são preocupantes, principalmente em São Bernardo (77%) e em São Caetano (72%). Já os dois postos em Santo André, um no CHM (Centro Hospitalar Municipal) (90%) e outro no Hospital Estadual Mário Covas (92%), estão em melhor situação.

Conforme a Prefeitura de São Caetano, o Núcleo Regional de Hemoterapia Dr. Aguinaldo Quaresma tem capacidade para receber 40 doadores por dia. Santo André informou que neste ano a captação no CHM foi de 780 bolsas em março, 401 em abril e 632 em maio. Em São Bernardo, a captação do hemocentro regional tem média de 1.300 a 1.400 doadores por mês. As demais cidades não têm ponto de coleta.

Procedimento para homens gays é restrito
A doação de sangue do homossexual ainda é restrita. A Portaria GM-MS n° 158, de fevereiro de 2016, do Ministério da Saúde, prevê que homens que fizeram sexo com outros homens são considerados inaptos para o procedimento pelo período de 12 meses, mas não de forma definitiva.

O texto estabelece critérios de inaptidão para a doação baseado no perfil epidemiológico dos grupos e situações, “constatando aumento do risco de infecção em determinadas circunstâncias”, informou a Pasta federal, por meio de nota, ainda segundo a qual a decisão é baseada em dados epidemiológicos e não em orientação sexual.

Para o diretor da Hemorrede da Secretaria Estadual de Saúde, Dante Longhi, a questão é técnica. “Ninguém discute opção sexual de ninguém, mas existe a janela imunológica (intervalo de tempo decorrido entre a infecção e a detecção no sangue) e todo procedimento médico que afirma envolver riscos, por isso você tem de tomar essas medidas”, disse.

"Acredito que a pessoa que vai doar sangue o faz com boa fé. Os homossexuais oferecem o mesmo risco que os héteros. Se não tomarem todas as precauções estão sujeitos a contrair DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis)”, opinou a professora do curso de enfermagem da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), Fabiane Rosa Marui.

O presidente da ONG ABCDS (Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual), Marcelo Gil, afirmou que não vê a questão como preconceito, mas chama a atenção para a modernização. “Vejo como falta de confiabilidade. A população LGBT também tem sangue bom. Costumamos dizer que para o homossexual doar sangue, infelizmente, ele tem de voltar ao armário.”

No Canadá, por exemplo, o período de inaptidão é de cinco anos. Austrália, Estados Unidos e Reino Unido também orientam 12 meses. Conforme dados do Ministério, no Brasil, atualmente, apenas 1,8% de toda a população brasileira doa sangue.




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