Política Titulo Cícero Martinha
‘O Diário sempre valorizou cobertura das ações sindicais’
Soraia Abreu Pedroso
Do Diário do Grande ABC
25/04/2018 | 07:00
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Presidente licenciado do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá, Cícero Firmino Martinha, 67 anos, relembra sua trajetória na entidade, cujo primeiro contato se deu em 1976, e conta sobre a primeira greve organizada na região, dois anos depois. “O Diário pautava outros veículos que não cobriam frequentemente o movimento sindical”, diz ele, que manteve o apelido mesmo ao assumir cargo de secretário do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo. Em tempo: colegas da Molins, de São Bernardo, começaram a chamá-lo de Martinha durante partida de futebol, pelo fato de ele ter cabelo comprido, em referência à cantora da Jovem Guarda.

Cícero Firmino Martinha e o Diário
Nascido em Queiroz, Interior, Cícero Firmino Martinha veio para Santo André aos 3 meses. Sua história com o sindicalismo começou por influência de seu pai, metalúrgico e sócio do sindicato. Embora seu sonho fosse ser médico, a falta de condições financeiras o levou a cursar técnico mecânico em desenho, leitura e inspeção de desenho técnico e ajustador mecânico no Senai. Ele conta que começou a ler o Diário em 1975, quando tomava o ônibus para ir ao trabalho, e desde então o jornal é sua leitura diária. A primeira entrevista foi em 1986, quando se tornou coordenador do departamento dos metalúrgicos da CUT (Central Única dos Trabalhadores).

Há quanto tempo o senhor atua no Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá? Quando a entidade foi fundada e desde quando a preside?
O sindicato foi fundado no dia 23 de setembro de 1933. À época, havia somente um sindicato dos metalúrgicos no Grande ABC, que abrangia as sete cidades, e não existiam as centrais sindicais. Em 1959, diante da vinda de montadoras para a região, São Bernardo e São Caetano criaram seus próprios sindicatos. Eu me associei ao Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá, que à época abrangia também Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, em 1976, quando trabalhava na Molins do Brasil, em São Bernardo (depois ela se mudou para Mauá). Assumi a presidência da entidade entre 1991 e 1992, quando João Avamileno (ex-prefeito de Santo André), então presidente, se afastou para se candidatar a vereador. Em 1993, houve a unificação de todos os sindicatos, exceto São Caetano, e foi criado o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, presidido pelo Vicentinho (Vicente Paulo da Silva, deputado federal pelo PT). Então me tornei vice-presidente de Santo André. Só que a fusão não foi bem sucedida, pois éramos mais unidos quando as entidades eram separadas do que após a unificação. Por isso, nos separamos em 1996 e enfrentamos batalha judicial que levou 11 anos para recriar o sindicato. Como parte do acordo, Ribeirão e Rio Grande ficaram com São Bernardo e Diadema, no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Em 2007 fui eleito presidente novamente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá e, após reeleições, permaneci no cargo do qual me licenciei para assumir, no dia 11 de abril, a Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo.

Hoje o senhor é o único representante do Grande ABC no governo do Estado, não é? Quais são seus planos para a região?
Sim. Pretendo ampliar na região a divulgação do programa de requalificação para os desempregados, que oferece ajuda de custo de R$ 330. Também quero que o Banco do Povo Paulista seja mais conhecido e divulgado pelas prefeituras. Hoje, Santo André, São Caetano, Diadema e Rio Grande são conveniadas, mas é preciso reforçar a divulgação, pois empréstimo a juros de 0,35% ao mês pode ajudar muitos empreendedores, ainda mais agora que a crise começa a dar sinais de que está indo embora. Devemos ter reunião para retomar convênios e tornar o projeto mais acessível.

Como foi o início de sua atuação no sindicato?
Assim que me associei, em 1976, ia com frequência ao sindicato. No mesmo ano, inclusive, me casei e passei a lua de mel na colônia de férias em Praia Grande (Litoral). Participei ativamente das greves dos metalúrgicos entre o fim dos anos 1970 e o início dos anos 1980. Em 1978, no dia em que completei 25 anos, fizemos a primeira greve dos metalúrgicos, então organizada pelo sindicato unificado. Ela começou no dia 12 de maio, na Scania, em São Bernardo, e depois se espalhou por todo o Grande ABC e pelas empresas de outras regiões, como a Molins, a Philips e a Pirelli Cabos (hoje Prysmian), entre outras. Naquela época, ninguém divulgava nada aos trabalhadores. Porém, o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) divulgou estudo fundamental apontando que os salários acumulavam perdas de 34,1% por conta da inflação, o que desencadeou o movimento. A Scania então concedeu reajuste de 20% aos operários. Em 1979, quando já era representante dos trabalhadores na Molins, outra greve por correção salarial durou duas semanas. E, em 1980, foram 36 dias de paralisação.

Qual o fato mais marcante que vivenciou no sindicato?
Marcou-me muito o período em que o sindicato ficou sob intervenção do governo militar. Começou no dia 17 de abril de 1980, durante a greve, e só recuperamos o sindicato exatos dois anos depois, em 17 de abril de 1982.

Em sua opinião, qual a importância da atuação da entidade para a economia regional?
O Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá, que completará 85 anos no dia 23 de setembro, foi pioneiro em muitas conquistas, que depois foram estendidas a todos os trabalhadores. Exemplo é o 13º salário. Ainda no fim dos anos 1950, foi aqui na Pirelli Cabos que foi fechado o primeiro acordo com a campanha do sindicato por abono de 240 horas. O 13º só foi oficializado em 1962, pelo então presidente João Goulart. Com greves e mobilizações a partir dos fins dos anos 1970, conquistamos reajustes acima da inflação, transporte fretado, restaurante no local de trabalho, convênio médico, melhores condições de trabalho, PLR. Todas essas conquistas acabaram impactando na economia local, porque se o trabalhador ganha mais, acaba comprando mais e aquecendo o comércio.

O Diário completa, em maio, 60 anos. Ao longo dessas seis décadas, o senhor acredita que o jornal foi importante para o desenvolvimento da economia da região? De que maneira?
Sim. O Diário nasceu com o diferencial de focar na região e se mantém fiel a essa linha editorial, contribuindo para o desenvolvimento da economia do Grande ABC ao divulgar as atividades de todos os segmentos da sociedade, desde os movimentos reivindicatórios dos trabalhadores até as movimentações no setor empresarial. A cobertura das greves entre 1978 e 1980, em plena ditadura militar, foi fantástica. Simultaneamente, o jornal sempre deu ênfase à divulgação de investimentos, expansões e geração de empregos nas empresas da região. É importante ressaltar ainda o papel do Diário na luta contra a poluição da Represa Billings e outras ações em defesa dos recursos naturais.

O senhor acredita que o jornal tenha contribuído para a expansão da indústria na região?
Sim. Porque o jornal sempre se preocupou em destacar as vantagens competitivas da região para atrair montadoras, autopeças, indústria de máquinas, de eletroeletrônicos etc. Isso, naturalmente, fomentou a vinda de novos negócios para a região. Mesmo com as dificuldades conjunturais, o Grande ABC mantém as grandes montadoras. Além do apoio do movimento sindical e do setor empresarial, contribuiu para tanto a atuação desse jornal, que sempre teve forte presença em defesa do crescimento e sustentabilidade da economia local.

Qual teria sido a maior contribuição do Diário, em sua avaliação?
A informação é a maior contribuição do Diário. Por ser um jornal voltado para a região, cujo foco é o desenvolvimento local. Destaco ainda a importante contribuição ao procurar mostrar para a população, juntamente com outros movimentos sociais, por que nas eleições devemos votar em candidatos da região ou naqueles com propostas realistas para o Grande ABC.

O senhor se lembra quando teve o primeiro contato com o Diário?
Quando entrei na Molins, em 1975, antes de tomar o ônibus, eu comprava o Diário em uma banca em frente ao ponto, e ia de Santo André para São Bernardo lendo o Diário. Na fábrica, muitos companheiros o aproveitavam e ele passava de mão em mão. Desde então, o jornal é minha leitura diária.

Lembra-se também quando o Diário publicou a primeira reportagem a seu respeito?
Foi a publicação de uma foto minha na assembleia no sindicato durante a campanha salarial em 1979. E minha primeira entrevista ao Diário foi em 1986, quando fui eleito coordenador do Departamento dos Metalúrgicos no Estado da CUT (Central Única dos Trabalhadores), criada em 1983. O sindicato dos metalúrgicos, inclusive, foi um dos primeiros a se filiar à central, já que muitas entidades passavam por intervenção militar. À época, não havia ainda a Força Sindical, fundada em 1991.

Em algum momento da sua carreira no sindicato o Diário lhe foi útil de alguma maneira?
Após assumir a coordenação do Departamento dos Metalúrgicos, o Diário sempre me abriu espaço para divulgar o andamento das negociações que tínhamos com a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Por diversas vezes, o Diário pautava outros veículos que não cobriam frequentemente as ações do movimento sindical.

O senhor enxerga o Diário como um canal para os sindicatos da região? Por quê?
Sim. Nessas seis décadas, além de ter se consolidado como um importante jornal regional, o Diário sempre valorizou a cobertura das ações sindicais. Ao longo desse período, fez coberturas exclusivas do movimento sindical, levando os grandes jornais de circulação nacional a correrem atrás do que havia sido publicado em primeira mão. Por tudo que o Diário já fez e continua a fazer é, sem dúvida, um veículo importante para os sindicatos da região.

E para as indústrias? O jornal é um canal? Por quê?
Sim. Mas acredito que as empresas poderiam aproveitar mais e melhor esse importante veículo regional para o desenvolvimento e a sustentação da economia local. Eu já até debati esse meu ponto de vista com os empresários.

Quanto está, em média, hoje, o valor da mão de obra nas cidades em que o sindicato atua? E qual o custo em outros locais?
Na nossa base, o salário está em torno de R$ 3.500. O valor supera em 75% a média no País.

Esse valor médio mais alto, que para muitos contribui para elevar o chamado custo ABC, e para outros é sinônimo de excelência do trabalho, se deve em parte à atuação do sindicato?
Salários mais altos e mais benefícios dos trabalhadores da região na comparação com os de outras regiões do Brasil foram processo natural. Quando houve no Brasil a política de governo para incentivar a indústria automobilística, a região atraiu as grandes montadoras por condições técnicas e logísticas. Afinal, o Grande ABC é bem localizado por estar perto de porto, aeroporto, cortado por rodovias. Com o tempo, as reivindicações dos operários passaram a ter como referência as matrizes das montadoras. Foi daí que eclodiram as greves de 1978 para cá. Essa mobilização culminou com conquistas que serviram de referência para os metalúrgicos em todo o País e também para outras categorias. Mais recentemente, outras cidades e Estados ofereceram incentivos fiscais, foram criados novos portos, estradas. Enfim, a logística foi melhorada em outras partes do País. Com isso, as grandes montadoras se expandiram para outras regiões, criando no entorno toda a cadeia produtiva. É o mesmo fenômeno que aconteceu em países como os Estados Unidos.

Como o sindicato vê a questão do fim da obrigatoriedade da cobrança do imposto sindical? Qual a importância desta fonte de receita? E como fará para manter a atuação?
O sindicato vê com certa tranquilidade o fim do imposto sindical, pois sempre combatemos a cobrança obrigatória por lei e em muitas ocasiões devolvemos aos associados a parcela do imposto que cabe à entidade. Mas o que ocorre hoje é que o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu qualquer desconto de não sócios, mesmo que isso seja aprovado em assembleia e que esses trabalhadores se beneficiem das conquistas negociadas pela entidade. Os sócios já contribuem com a mensalidade de 1,5% do salário. Por isso, defendemos que todos os trabalhadores, mesmo os não sócios, tenham contribuição negocial, porque se beneficiam com os acordos, e quem não contribuir que abra mão das conquistas. 




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