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Azeitona, a frutinha eterna
Por Silvio Lancellotti
Especial para o Diário
18/11/2007 | 07:09
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De acordo com o Livro do Gênesis, na Bíblia dos cristãos, depois do Dilúvio o patriarca Noé soltou uma pomba aos céus, na esperança de que a ave descobrisse, em algum lugar, um sinal de tranqüilidade. Consta que, na sua volta à arca da salvação, a pomba trouxe, no bico, um raminho de oliveira. Óbvia simbologia: quem escreveu tal texto já considerava, milênios atrás, a oliveira como o modelo de resistência ao passar do tempo e às intempéries.

De fato, não existe na História, principalmente junto ao Mediterrâneo, da Ásia ao norte da África e ao sul da Europa, uma outra planta tão influente no desenvolvimento da civilização. Nem mesmo a vinha foi tão importante na conformação do caráter daquela região.

Dileta do grego Homero, que viveu em torno do século VIII a.C., e do romano Plínio (23-79), a azeitona, frutinha da oliveira, não forneceu ao homem apenas a sua textura, o seu sabor e a sua providencial longevidade.

Com a sua polpa, os povos remotos aprenderam a produzir um óleo que servia de combustível para a iluminação, de lubrificante de equipamentos e de armas – e, inclusive, de substância para a higienização. Isso mesmo, funcionava, no corpo, ao estilo dos sabonetes de hoje em dia.

Milenar - Longevidade? Sim. Pode-se dizer que a oliveira, na ciência denominada de Olea europaea, é uma planta eterna. Testes feitos com amostras da atual Palestina determinaram a sua idade em mais de 2.500 anos. Ocorre que a Olea ostenta raízes ultra-profundas, que chegam a atingir além dos seis metros e lhe permitem capturar a água mesmo em plagas desérticas.

Sem falar que dispõe de folhas perenes – quando enfraquecem e caem as mais velhas, as novinhas já brilham nos galhos, luzidias e vigorosas. Na sua superfície posterior, essas folhas ostentam minipelinhos que aprisionam a seiva e evitam a desidratação.

Ao brotar, a frutinha, de um único caroço, possui a casca verde. Então, ao amadurecer, paulatinamente assume uma tonalidade cinzenta com reflexos dourados, fica castanha, arroxeada, até se aproximar da cor preta.

Detalhe: os povos remotos também idealizaram um processo engenhosamente capaz de amainar o gosto amargo que a azeitona recém-colhida costuma exibir: basta deixá-la de molho em água fresca ou curti-la em salmoura.

Salmoura - Com o progresso da tecnologia, algumas indústrias ainda propõem um cozimento rápido e, em casos especiais, um último banho num líquido condimentado por ervas finas.

Embora sempre a partir da mesma estirpe, Olea europaea, cultivadores de talento conseguiram chegar a duas dezenas de sub-tipos de formatos e de tamanhos bem diferentes, como as sensacionais Gordal e Azapa.

Em outro, eu defino as propriedades terapêuticas e nutricionais da azeitona. E, evidentemente, concedo as minhas duas receitas de praxe. Numa, de azeitona transformada em pasta, para um sanduíche multi-colorido. Noutra, de molho que criei, duas décadas atrás, em homenagem a um amigo caríssimo, o grande publicitário Washington Olivetto, que veio a este mundo com a frutinha aposta na certidão de batismo. Trata-se de um molho muito versátil: combina com macarrão, com carnes brancas e até vermelhas.

As virtudes da azeitona e do azeite - Com 25% de óleo na sua composição, um conjunto de ácidos graxos, insaturados, excelentes na diluição do chamado “colesterol ruim”, a azeitona propiciou, aos povos do Mediterrâneo, os índices mais baixos de problemas circulatórios em todo o planeta.

Riquíssima, ainda, em sais minerais, como o Potássio, o Sódio, o Cálcio e o Fósforo, na terapêutica cumpre dois gêneros de missão.

Externamente, a sua pasta alivia os pruridos de pele, particularmente nas queimaduras. Internamente, funciona como um dispersor da acidez e como um precioso laxativo.

Perfeito para qualquer fritura, o seu azeite agüenta bem melhor a agressão da temperatura, antes de se decompor: pode-se aquecê-lo até os 240 graus, contra os 160 do óleo de milho e os 120 do óleo de soja.

A Gordal e a Azapa - Em vidros ou a granel, aqui no Brasil se compram, por preços razoáveis, duas das melhores amostras de azeitona do universo.

Verde, originária de Sevilha, na Espanha, a Gordal, assim chamada pelo seu tamanho descomunal, tem uma polpa singularmente sumarenta e um sabor deliciosamente agridoce.

Violácea, originária de um vale fertilíssimo no norte do Chile, um verdadeiro oásis nas imediações da cidade de Arica, a linda Azapa também apresenta um volume generoso e um sabor marcante, um tanto mais amargo.

Normalmente utilizadas na decoração de alquimias gastronômicas, das maioneses às pizzas, tanto a Gordal como a Azapa se adequam maravilhosamente a outras relíquias culinárias, transformadas em pastas ou cortadas meigamente em lasquinhas.

Receitas

Sanduíche Giulluli
Ingredientes, para uma pessoa: 4 azeitonas Gordal, sem os caroços, trituradas com uma colher, de chá, de azeite extra-virgem. 4 azeitonas Azapa, idem. 2 colheres, de sopa, de molho de tomates, já temperado, bem coadinho. 1 colher, de chá, de parmesão ralado. Pitadas de orégano. 2 fatias de pão de forma, integral ou de centeio. 2 fatias de pão de forma, do clássico, branco.
Modo de fazer: Numa das fatias do pão integral, ou de centeio, passo, como manteiga, a pasta verde. Noutra das fatias do mesmo pão, passo a pasta violácea. Combino o molho de tomates ao parmesão e ao orégano. Passo o resultado entre as fatias de pão branco. Monto o sanduíche com uma das fatias do pão escuro por cima e outra por baixo do branco - ou seja, quatro andares de pão e três de recheio. Com uma faca bem afiada, aparo as quatro bordas laterais do sanduíche e o corto ao meio, na vertical. Enfeito cada uma das suas metades com uma Gordal e com uma Azapa, bem espetadinhas em palitos.

Bife do Olivetto
Ingredientes, para uma pessoa: 1 bife de contrafilé, em 250g de peso e 2cm de espessura, bem aparadinho, livre de gorduras. Sal. Pimenta-do-reino, moída na hora. 5 colheres, de sopa, de azeite de olivas. 6 azeitonas Gordal e 6 azeitonas Azapa, sem os caroços, cortadas em lasquinhas. 4 colheres, de sopa, de polpa peneirada de tomates. 1 colher, de chá, bem cheinha, de orégano.
Modo de fazer: Tempero o bife com o sal e com a pimenta-do-reino. Unto, completamente, com uma das colheres de azeite. Douro, um minuto de cada lado, numa frigideira bem quente, de preferência com o fundo ranhurado. Noutra frigideira, aqueço o azeite restante e incorporo as azeitonas em lascas. Misturo e remisturo. Agrego a polpa de tomates. Em fogo manso, levo à pré-fervura. Tempero com o orégano. Mantenho, mais trinta segundos. Coloco o bife na frigideira do molho. Reaqueço o conjunto, outros trinta segundos.



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