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DVDs para curtir em casa
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
12/11/2005 | 08:32
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Locadoras acabam de receber quatro novos e bons longas-metragens; o lote inclui um Steven Spielberg, uma releitura de Tim Burton, uma trama sul-coreana e o ótimo nacional Garotas do ABC, de Carlos Reichenbach. Confira:

Guerra dos Mundos
Era sonho antigo de Steven Spielberg adaptar Guerra dos Mundos, desde que, 12 anos antes, adquirira uma gravação da leitura radiofônica que Orson Welles fez do livro de H.G. Wells, e que ateou pânico à população norte-americana, em 1938. Talvez sua vontade fosse criar a mesma atmosfera executada pelo diretor de Cidadão Kane, conforme pode sugerir a estrutura narrativa, escorada no terror da extinção humana, de seu novo filme. A idéia de cinema como ilusão já foi implantada de forma insistente no espectador moderno e esse suposto objetivo não teria como concretizar-se.

Definitivamente, Spielberg pediu as contas do cargo de advogado de defesa dos alienígenas que ocupava à época de Contatos Imediatos do Terceiro Grau (1977) e ET – O Extra-terrestre (1982).

Ray Ferrier (Tom Cruise) é incumbido pela ex-mulher de cuidar dos filhos a quem tem dispensado atenção mínima desde o divórcio. Enquanto procura cumprir com os desígnios de pai, tem início uma invasão ostensiva de aliens com um único objetivo: reduzir a população terrestre a pó e varrê-la para debaixo do tapete.

Guerra dos Mundos é um filme no qual Spielberg troca o certo de sua filmografia (sólida constituição familiar, personagens cujo horizonte ético é uma planície, infantilização dos conflitos) pelo incerto (o oposto de tudo isso). Não renega seu passado, de modo algum. Mas reflete sobre ele, como demonstra uma das mais interessantes cenas do filme, quando a garotinha vivida por Dakota Fanning fecha os olhos diante do horror que é a anulação de códigos morais em prol da sobrevivência.

GUERRA DOS MUNDOS (War of the Worlds, EUA, 2005). Dir.: Steven Spielberg. Com Tom Cruise, Dakota Fanning, Tim Robbins. DVD para locação e venda direta (duplo, R$ 49,90 em média). Distribuição: Paramount.

Oldboy
Oldboy tem problemas graves e nem por isso deve ser desprezado; bem como tem sólidas qualidades e nem por isso deve ser exaltado às cegas. Obra que será refilmada nos Estados Unidos em 2006, trata-se da segunda parte da trilogia da vingança do diretor sul-coreano Chan-Wook Park, junto a Sympathy for Mr. Vengeance (2002) e Sympathy for Lady Vengeance (2005), inéditos no Brasil.

Oldboy funde gêneros: um, subgênero, é o do filme de vingança, derivado do faroeste, embora prescinda de elementos como o chapelão e as pistolas; outro é o da tragédia familiar, com direito a incesto e tudo.

Certo dia, embriagado, Oh Dae-su (Min-sik Choi) é mantido em uma delegacia até que cure seu porre. Corta. Aparece então espremido sob uma portinhola de prisão, implorando por uma explicação sobre seu encarceramento, que se prolonga por 15 anos. Libertado, tem cinco dias para entender o porquê da penitência e reclamar com sangue a vida de seus carcereiros.

Coincidência o prazo de reclusão de Dae-su, 15 anos, ser exatamente o período que a Coréia do Sul goza de liberdades democráticas desde a desaceleração da ditadura militar, de 1988 até 2003 (ano de lançamento do filme)? Talvez não. Oldboy pode ser lido como elegia metafórica sobre a tardia aquisição civil, ao privar seu herói do liberalismo ao qual se entregou a Coréia do Sul. Park tem seus problemas, como o mata-borrão ético do desfecho e a preferência por imagens ruidosas e, às vezes, inexpressivas. O que não significa que Oldboy – que comporta um sadio humor negro capaz de auto-escarnecer sua severidade psicológica – mereça 15 anos de ostracismo na locadora.

OLDBOY (Idem, Coréia do Sul, 2003). Dir.: Chan-Wook Park. Com Min-Sik Choi, Ji-tae Yu. DVD somente para locação. Distribuição: Europa.

A Fantástica Fábrica de Chocolate
Tim Burton fez o que todo trintão e quarentão, com uma câmera na mão e US$ 150 milhões para gastar, gostaria de ter feito. Recriou A Fantástica Fábrica de Chocolate (1971), o filme de Mel Stuart que adoçou a infância de boa parte dos marmanjos de hoje. Não se trata de uma recriação apenas; Burton melhorou o longa, embora há quem discorde, confiante na memória afetiva.

O cineasta manteve a arquitetura iconográfica do filme de Stuart, também inspirado no livro infantil de Roald Dahl. Ou seja, foram preservados, com uma providencial redecoração, o afogamento do gorducho Augustus Gloop, a framboerização de Violet Beauregarde e o televisionamento de Mike Teavee.

A manutenção resulta da afeição de Burton pelo antecessor. A grande alteração é Willy Wonka (Johnny Depp, no limite entre o delírio e o terror), o industrial que reabre sua fábrica de guloseimas ao público após longo fechamento. O personagem serve para debater as causas e conseqüências da fantasia, principal combustível filosófico de seu diretor. É de enxaguar a boca.

A FANTÁSTICA FÁBRICA DE CHOCOLATE (Charlie and the Chocolate Factory, EUA, 2005). Dir.: Tim Burton. Com Johnny Depp, Freddie Highmore. DVD para locação e venda direta (R$ 49,90 em média). Distribuição: Warner.

Garotas do ABC
Antes tarde que nunca. Garotas do ABC, o longa de Carlos Reichenbach ambientado no Grande ABC e lançado ano passado, finalmente chega ao DVD. É um filme em que Carlão, desafiante contumaz das formas do cinema, explora a capacidade que sua arte tem de assimilar idéias, linguagens e noções que não são propriamente cinematográficas.

Aurélia (Michelle Valle) encabeça um grupo de tecelãs que vive e trabalha em São Bernardo. É fã ardorosa do ator Arnold Schwarzenegger e namora sujeito filiado a grupo neofascista comandado por um advogado (Selton Mello). A intersecção desses dois cosmos, quando ocorre, é sob o signo da violência.

Entre as múltiplas leituras que pode proporcionar, Garotas do ABC se configura numa observação da atual distância entre operariado e ideologia, antigamente tão íntimos, sobretudo no Grande ABC. Mas, com Carlão, nada é somente preto ou somente branco. Sua aquarela artística e filosófica reivindica mais do que o maniqueísmo e em algumas ocasiões, como no caso de Garotas do ABC, mais do que o cinema pode lhe dar.

GAROTAS DO ABC (Brasil, 2003). Dir.: Carlos Reichenbach. Com Michelle Valle, Selton Mello, Ênio Gonçalves, Fafá de Belém. DVD somente para locação. Distribuição: Europa.




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