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Conclusão de George Lucas
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
05/11/2005 | 09:17
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Os meios justificam os fins. George Lucas adotou à sua maneira a famosa sentença de Maquiavel ao passar a régua sobre seu mais ambicioso projeto autoral, a série Star Wars, com o conclusivo Episódio III – A Vingança dos Sith. Filme terminal da saga de seis longas-metragens que, para alegria dos fãs, sai esta semana em DVD (locação e venda direta, a R$ 49,90). Em poucas palavras, um dos lançamentos do ano.

Não precisa ser fã para apreciar a ficção científica de Lucas – aliás, é preferível não sê-lo para entender, sem a neblina do fundamentalismo, as potenciais qualidades cinematográficas de A Vingança dos Sith. Entre os seis filmes é o melhor, até se comparado a O Império Contra-ataca (1980), filme que os fanáticos adoram adorar.

Último filme na cronologia de produção, o Episódio III encerra a segunda trilogia – iniciada por A Ameaça Fantasma (1999) e O Ataque dos Clones (2002) –, cujos eventos narrados antecedem os fatos da primeira trilogia (Uma Nova Esperança, 1977; O Império Contra-Ataca; e O Retorno de Jedi, 1983).

É o meio da jornada, o momento em que Anakin Skywalker (Hayden Christensen) contraria o messianismo que o afirmava cavaleiro jedi da esperança para transformar-se em Darth Vader, a mais completa tradução do poder dos sith, ordem de espadachins galácticos que militam no tal lado negro da Força.

Existe uma necessidade de diversificar o bicromatismo moral do embate bem versus mal (tudo bem que ela acaba desmentida pelas ocorrências da trilogia original). Igualmente necessário, para o universo de Star Wars, é o ímpeto em multiplicar os tons da tragédia, a considerar o modelo grego clássico: o herói, bem como todos os personagens que o coadjuvam, desconhece seu destino, a sua remarcação como vilão; apenas o espectador, informado pelos cinco filmes anteriores, sabe que fim levará o dito-cujo.

Esse detalhe faz uma diferença enorme no tom épico e ultradramático que Lucas emprega em A Vingança dos Sith, um combinado narrativo que adere às infinitas possibilidades do departamento de efeitos especiais e que ele ajudou a propagar, como um fole a soprar o incêndio. Mas Episódio III desponta como um acerto de contas dessa arquitetura narrativa, banalizada por outros, mas que em Lucas reencontra um personagem e sua derrocada ética como substâncias tão sólidas quanto os cenários e as criaturas digitais que são coqueluche da saga, apesar da aborrecida estratégia de preencher cada segundo de filme, sem descanso, com a trilha sonora de John Williams. Dá-se um desconto, pelo conjunto da obra que também prescinde de lances novelescos, como as verdades consangüíneas da primeira trilogia.

Existe a trama política, com o Chanceler Palpatine (Ian McDiarmid) aplicando um golpe de estado à República Intergaláctica em meio à tal Guerra dos Clones. Persevera a vontade do imperialismo, dentro da qual convicções espirituais (a queda dos jedi), pessoais (o rompimento entre Anakin e Padmé, vivida por Natalie Portman), morais (o surgimento de Darth Vader) e políticas (o fim da democracia) são engavetadas pela vontade de um único indivíduo. Ah, e é claro que as cenas épicas e de ação estão entre as mais bem-feitas da história do cinemão, com acentos para a batalha aérea em plano-seqüência que abre o filme, o mata-mata entre Obi-Wan Kenobi (Ewan McGregor) e o General Grievous (criatura digital que antecipa o sofrimento da fundição carne-máquina que ocupará o futuro de Vader), fora os duelos entre Yoda e Palpatine e entre Kenobi e Anakin.

Tudo isso aparece reunido numa imensa geografia planetária, com uma variedade de cenários que beira o delírio. A Vingança dos Sith parece ter esgotado as possibilidades do blockbuster com ambições épico-fantásticas, feito que Peter Jackson pretendia com seu O Senhor dos Anéis, sem lograr êxito. A partir dele, Lucas força o cinemão a rever seus conceitos.




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