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Sem medo de ser feliz
Por Francisco Satkunas
Especial para o Diário
24/11/2010 | 07:14
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Sempre que precisamos comprar alguma coisa comparamos produtos e preços. Não raramente, pechinchamos para conseguir o melhor negócio. Depois do preço, buscamos a condição de pagamento mais vantajosa.

Essa mesma tática é praticada por empresas privadas e órgãos públicos - de forma mais organizada. Até os anos 1990 as compras quase sempre envolviam pelo menos três cotações de fornecedores previamente homologados. Qualidade e garantia de entrega, capacitação tecnológica e preço eram os quesitos que definiam a concorrência.

Isso mudou com o início dos anos 1990, quando o professor basco Ignácio Lopez de Arriortua percebeu que as grandes montadoras faziam suas compras individualmente, apesar de presença global. Lopez também observou que todas eram guiadas por planilha de preços e conteúdo para cada item, além do custo dos agregados, como matérias-primas, mão de obra, despesas gerais, e, finalmente, o lucro.

Arriortua verificou que havia diferenças importantes entre fornecedores. Alguns se destacavam pela modernidade, outros pelo custo reduzido de mão de obra, e outros tantos por matérias-primas mais baratas.

A partir dessa constatação, determinou o fim das planilhas e avalizou a máxima de que o produto valeria tanto quanto o mercado estivesse disposto a pagar. O resultado foi uma corrida nunca antes vista em busca do melhor preço. As montadoras reduziram em até 30% o custo das compras - responsáveis na época por 70% das despesas totais.

O professor descobriu que, juntando os volumes de produtos similares, seria possível conseguir preços melhores - mesmo que os tais fossem fabricados em países e plantas diferentes, desde que o fornecedor tivesse presença global. Subitamente, fornecedores locais competitivos viram-se fora da competição, excluídos pelos proibitivos custos de exportação e logística.

Começaram a pipocar aquisições, fusões e ‘joint ventures', fortalecendo grandes corporações. O preço então foi aos poucos sendo nivelado globalmente. Para sobreviver, indústrias locais tiveram de se contentar com ‘migalhas' ou então passar a fornecer para grandes autopeças. Muitas pequenas e médias desapareceram, outras foram incorporadas. Contava-se nos dedos de uma mão as empresas brasileiras que instalaram fábricas no Exterior para competir na era das compras globais.

Omelete feita, o tempo passou. Na configuração atual do mundo globalizado, não há tempo para lamentar ovos quebrados. É preciso ser eficiente já para competir com empresas de economias emergentes como China, Coréia do Sul, Índia e Tailândia, que estão melhorando rapidamente a qualidade. Adicione-se a isso a mão de obra barata e substancial vantagem de economia de escala.

O resultado da equação é nova onda de oportunidades para esses países, que exportam, inclusive, para o Brasil.

A questão que fica é que a pujança asiática vai na contramão da correnteza dos investimentos necessários à competitividade da indústria nacional. Empresas não podem nem devem fechar-se às oportunidades, mas a verdade é que a importação não gera desenvolvimento nem empregos nas nações às quais se destina.

Estamos sob uma nova ordem mundial em que, mais que nunca, é imperativo estar preparado para enfrentar o desconhecido. No que toca à indústria automobilística, a resposta pode estar num relacionamento equilibrado entre montadoras e autopeças locais que permita reduzir custos.

O Brasil tem um mercado de mais de 3 milhões de veículos. O que ainda nos falta? Convencer o governo a diminuir seu apetite por arrecadação e adotar políticas fiscais alinhadas com os parâmetros mundiais. Sem medo de ser feliz.

**Francisco Satkunas é conselheiro da SAE Brasil.




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