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Setor de festas vive desafios com aumento de restrições

Estabelecimentos passaram quase oito meses fechados e empresários temem novo fechamento; Grande ABC tem mais de 900 bufês

Aline Melo
Do Diário do Grande ABC
07/12/2020 | 07:00
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DGABC


Um dos setores mais afetados pela pandemia de Covid-19 foi o de festas. Bufês e salões permaneceram mais de seis meses fechados e as perdas foram significativas. Voltando às atividades na região desde os meses de setembro e outubro, empresários fazem esforço para se reerguer e investem para se adaptar à nova realidade, com festas menores (os espaços só podem funcionar com 40% da capacidade total) e mudanças no padrão de atendimento para garantir as medidas sanitárias obrigatórias, como distanciamento, uso de máscaras e álcool gel. A regressão no Plano São Paulo, que levou todo o Estado para a fase amarela e aumentou as restrições se apresenta como novo desafio ao setor.

Conselheira no Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC), a empresária Adriana de Faveri Ferreira, que é proprietária de dois bufês na região – Brinca Piá e Brinca Pirata –, afirmou que os empreendedores do setor estão em situação muito difícil, após longo período sem faturamento. “Após a reabertura (que em Santo André ocorreu em setembro), as atividades vêm sendo retomadas muito lentamente, pois as pessoas ainda não se sentem seguras”, afirmou. “Mas é importante destacar que estamos tomando todos os cuidados e seguindo todos os protocolos de segurança”, pontuou.

Acrílicos para proteção dos locais onde as pessoas se servem, maior distanciamento entre as mesas, salgados servidos em potes aos convidados e não mais entregues pelos garçons, que usam máscara o tempo todo, intensificação da limpeza de brinquedos e estruturas estão entre as medidas adotadas e citadas pela empresária. “Algumas pessoas conseguiram servir marmitex durante o período de fechamento, mas a realidade é que há uma grande cadeia de colaboradores, diretos e indiretos, que foram muito afetados pela situação”, afirmou.

Com a regressão da região para a fase amarela do Plano São Paulo, os bufês só podem funcionar com 40% da capacidade. “A nossa situação é muito difícil. Quem tinha capital de giro já não tem mais, estão todos endividados e vamos começar a discutir, ao menos com a Prefeitura de Santo André, mais prazo para pagar o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) para o segundo semestre do ano que vem, e parcelado”, completou Adriana.

O empresário Marcelo Golfieri é dono de uma rede de franquias de bufês com unidades no Grande ABC, a Cata-Vento, e integrante da Adibra (Associação das Empresas de Parques de Diversão do Brasil). Golfieri estima que, ao menos, 50% do setor não retomou o trabalho este ano. Na sua rede, foram realizadas festas no modelo drive-in (com todos dentro do carro), como alternativa para manter o isolamento. “A verdade é que não houve, desde o início da pandemia, nenhum caso de transmissão ocorrida em bufês, porque já adotamos medidas rígidas de higiene”, alegou.

Para o empresário, o fechamento do setor acaba incentivando a realização de festas sem as condições adequadas. “Fazer comemoração em um bufê, que já possui no seu DNA a questão da segurança e a aplicação de regras, é muito mais certo e seguro do que fazer uma festa autônoma em uma chácara, por exemplo”, argumentou.

“Mesmo com a liberação (ocorrida em setembro e outubro), os meses de prejuízo vão custar anos e anos de trabalho até que o equilíbrio se restabeleça”, afirmou Golfieri. “Ainda com a retomada, necessária para tentar salvar algumas empresas do setor que ainda respiram, teremos que trabalhar muito para conquistar a confiança do cliente, contra uma possível segunda onda e uma economia devastada”, concluiu.

A estimativa das prefeituras do Grande ABC é a de que existam 958 bufês e salões de festas na região (com exceção de Rio Grande da Serra, que não informou os dados). Mais de 90% deles estão em Santo André, São Bernardo e São Caetano. Nenhuma administração teve registro de fechamento ou multa a estabelecimentos por descumprimento das regras sanitárias, desde que a reabertura foi autorizada.

Empresárias apostam no encantamento dos clientes
O bufê Recanto dos Sonhos, em São Bernardo, realiza apenas festas de casamento. Com 15 anos de atuação, as sócias Vania Martins Figueira e Juliana Aguilar tiveram que desmarcar 91 celebrações com a suspensão das atividades em decorrência da pandemia de Covid-19. Sem falar em prejuízos financeiros, Vania destacou que o maior prejuízo foi o emocional, tanto para os clientes quanto para funcionários e fornecedores.

Para amenizar esse impacto, o bufê apostou no encantamento e no atendimento personalizado dos casais que precisaram adiar os casamentos. “Foi um grande desafio, uma fase de reflexão e aprendizado, com muita inovação, pensando sempre em melhorias e tendências para surpreender as expectativas dos nossos clientes”, explicou Vania.

Uma das primeiras medidas foi a contratação de um profissional da área de psicologia, um coach emocional, para atender noivos e noivas que precisaram adiar a festa e ofertar apoio emocional. Um buquê de flores foi enviado para todas as noivas, com uma carta reafirmando a parceria entre clientes e empresa. No dia em que estava marcado o casamento, o casal recebeu um vídeo com uma música gravada por um violonista e uma mensagem personalizada.

Para os casais que ainda não tinham fechado a data da festa, foi criado serviço de degustação em casa com a experiência completa que seria vivenciada no bufê: uma playlist de músicas clássicas criada para o momento, inclusive com as velas para serem acesas na hora em que os alimentos eram provados, tudo para que a experiência fosse a mais próxima possível do que seria no salão de festas. “Nossa maior mensagem era para que eles não deixassem esse sonho morrer. Deu muito certo. Alguns casais agendaram a festa sem nunca terem visitado pessoalmente nosso espaço”, afirmou Juliana. O período de quase oito meses em que o local ficou fechado serviu para realização de melhorias estruturais nas instalações.

INOVAÇÃO
Também houve investimento em produção de conteúdo para redes sociais, já que as pessoas em home office acabaram tendo mais tempo para pesquisar sobre casamentos e festas. “Trouxemos para o nosso canal no YouTube muita informação e temos feito isso até hoje”, afirmou Juliana. Os vídeos geraram programa realizado a cada 15 dias, com dicas sobre as festas, apresentações de fornecedores e sorteios de brindes.

O atendimento e a proximidade foram apontados como diferenciais pela assistente Leticia Huey Nin de Lima Chen Cruz, 22 anos, e o engenheiro mecânico Kaique Lucas Cruz, 27, que se casaram no dia 22 de novembro. Com o casamento marcado desde dezembro de 2019, os noivos passaram por alguns momentos de angústia, quando ainda não havia previsão para reabertura dos bufês. “A assistência foi incrível. Tiraram todas as nossas dúvidas e foram muito atenciosos”, elogiou a jovem. Por causa da pandemia, o casal não pôde utilizar a pista de dança, mas, para a noiva, isso não tirou o brilho da festa. “Foi muito especial.”

Especialista desaconselha realização de celebrações
Em bufês ou em casa, a epidemiologista, especialista em dinâmica em transmissão de doenças infecciosas e professora de Medicina da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), Adélia Marçal dos Santos, desaconselha a realização de festas, pela ameaça de transmissão da Covid-19. De acordo com a especialista, o risco de contaminação em massa em festas independe do local onde são realizadas. “Temos comprovação de eventos familiares e festas em restaurantes, que são locais fechados, ou sítios, com ambiente aberto, residências, que geraram elevados índices de transmissão.”

A professora explicou que a origem de pessoas interagindo no ambiente é um dos fatores de risco. “Em festas e confraternizações, seja entre amigos ou familiares, as pessoas podem vir de diferentes atividades e níveis de socialização, e diversas áreas geográficas, misturando quem vem de locais com maior circulação do vírus e locais onde o vírus não está circulando”, detalhou. O contato entre essas pessoas leva o vírus de um local para outro, aumentando a incidência da doença. “Além disso, todos se expõem ao viajar em ônibus e aviões interagindo em várias oportunidades com diversas pessoas”, explicou.

Para a especialista, quanto maior o número de pessoas, maior o risco, e mesmo com mesas e cadeiras espaçadas, as pessoas tendem a não manter distância entre si. “O motivo da confraternização é justamente para ficarem próximas. E conversarem. Conversas concomitantes aumentam o barulho e as pessoas tendem a falar mais alto e ao mesmo tempo. Isso aumenta a eliminação de gotículas e aerossóis. A contaminação é certa. Pode acontecer em casa ou nos bufês. Não faz diferença”, concluiu.

Adélia ressaltou que ainda não é seguro fazer festas e encontros familiares com pessoas fora da convivência diária. Se isso for muito importante, a especialista aconselha que as pessoas que desejam se encontrar preparem-se para isso. “Reduzir suas interações pelo menos duas semanas antes, manter o comportamento o mais próximo possível de uma quarentena. Assim, reduzem os riscos de levarem o vírus consigo para o encontro”, esclareceu. “Não adiantam rituais de trocar de roupa, tomar banho, limpar sapatos, colocar máscaras, lavar as mãos, se está doente eliminando o vírus com cada palavra. Mesmo palavras de amor e carinho”, concluiu.




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