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Rio beira a esgoto in natura

Última análise da Expedição Tamanduateí, realizada pela USCS, em parceria com o Diário, mostra situação degradante do corpo d’água

Vanessa de Oliveira
do Diário do Grande ABC
06/07/2015 | 07:07
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Andréa Iseki/Arquivo DGABC


O aspecto do Rio Tamanduateí não nega e o resultado em laboratório confirma a realidade: as águas que percorrem os 35 quilômetros do corpo d’água são, praticamente, esgoto. Essa foi a impressão que teve a bióloga e professora da USCS (Universidade Municipal de São Caetano) Marta Ângela Marcondes, que coordenou a Expedição Tamanduateí, em parceria com o Diário, iniciada no fim de maio e concluída na última semana, na Capital, após passar por Mauá (município em que ele nasce), Santo André e São Caetano.

“Já analisei esgoto in natura antes de chegar à estação de tratamento e é muito próximo do que encontramos nesta etapa final. Constatamos níveis de nitrato e fósforo muito elevados, dois indicadores de contaminação por esgoto doméstico não tratado. O primeiro está presente em fezes e urina e o segundo é proveniente de despejo de detergentes, sabão, entre outros”, explica a pesquisadora.

Em território paulistano foram coletadas amostras de água em sete pontos, terminando no Rio Tietê, onde o Tamanduateí desagua. A única vez em que a especialista encontrou água limpa foi na nascente, localizada no Parque Ecológico da Gruta Santa Luzia, entre os bairros Jardim Itapeva e Jardim Adelina, no município mauaense. Ao sair da área, a cerca de 500 metros de distância, o visual das águas, repleto de lixo, prosseguiu até o término da pesquisa.

Para a obtenção dos resultados da expedição, foi levada em consideração a Resolução Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) número 357/05, que estabelece a classificação das águas nacionais. O Tamanduateí se enquadra na classe quatro, por apresentar maior nível de poluição. No entanto, a avaliação mostrou que o líquido do rio sai do padrão estabelecido pelo Conama. Os índices de turbidez da água, por exemplo, que dificultam a entrada de luz e, assim, a produção de oxigênio, se mantiveram em todos os pontos analisados na última etapa em 200 NTU (sigla que provém do inglês Nephelometric Turbidity Unit, ou, na tradução, Unidade de Turbidez Nefelométrica). A resolução estabelece que esse parâmetro não ultrapasse 100. “A condição de sólidos dissolvidos totais (conjunto de todas as substâncias orgânicas e inorgânicas contidas em um líquido sob formas moleculares, ionizadas ou micro-granulares) interfere na turbidez e entrada de luz que, automaticamente, impossibilita a fotossíntese e produção de oxigênio, e assim, a vida de organismos que dependem desse oxigênio para a sua sobrevivência”, esclarece a bióloga.

A contribuição do Grande ABC para isso é significativa. “Os trechos do rio em São Paulo estão recebendo tudo que vem da nossa região, além do que vem da própria Capital. Então, o que aconteceu no trajeto inteiro potencializa essa situação”, falou Marta.

Os resultados da expedição serão apresentados em seminários por toda a região. Mas, desde já, a professora deixa um apelo. “Para o poder público, que invista em saneamento efetivamente, não só no papel. E para a sociedade civil, que colete seu resíduo corretamente. O sofá, televisão, pneu, não serão decompostos quando chegarem ao rio. Vão acabar na foz ou em alguma margem, não vão sumir. Enfim, que todos tenham um outro olhar para o Tamanduateí.”


Quantidade de bactérias encontradas em última fase foi maior

Na conclusão da Expedição Tamanduateí, que abrangeu trechos na Capital até a foz, no Rio Tietê, a quantidade de bactérias encontradas chamou a atenção da bióloga e professora da USCS (Universidade Municipal de São Caetano) Marta Ângela Marcondes. “O aumento em comparação com as áreas localizadas no Grande ABC foi muito significativo, duas vezes maior do que a gente vinha encontrando”, ressalta.

Um dos tipos constatados nessa última fase – e já visto anteriormente – foi a Escherichia coli, cuja presença se deve à contaminação com fezes e que pode causar doenças como a gastroenterite e infecção urinária.

Outra, a Shiguella spp. tem quatro espécies, no entanto, não foi possível verificar qual delas estava presente. O certo é que todas causam disenteria bacilar ou shigelose (com sintomas como fezes sanguinolentas associadas a dor intestinal). E por fim, a Salmonella spp, que também pode causar gastroenterite.

A pesquisadora alerta para o perigo de contaminação por meio das inundações e a que estão expostos os moradores em situação de rua, facilmente vistos utilizando os recuos da margem do rio para se abrigar, no território da Capital. “Essas pessoas correm riscos diversos, como a contaminação, as quedas e, em épocas de cheias, as enchentes. Isso é um fato para total indignação”, frisa.

A expedição mostrou outro ponto alarmante com relação a bactérias, na segunda etapa da ação. Em três dos 12 pontos percorridos em Santo André e São Caetano, foi encontrado o organismo do tipo Klebsiella spp, o mesmo gênero da KPC (Klebsiella Pneumoniae Carbapenemase), causadora de enfermidades que podem evoluir para quadro de infecção generalizada e levar à morte. 




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