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Crise guia mandatos de novos prefeitos
Por Fábio Zambeli
Da APJ
05/04/2009 | 07:00
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Os prefeitos do Estado de São Paulo que assumiram os mandatos em 1º de janeiro vão dar prioridade em seus mandatos aos investimentos na Saúde e Educação. A crise mundial, todavia, já contaminou as agendas de governo e os novos chefes de Executivo tratam o desenvolvimento econômico como principal desafio a ser enfrentado no quadriênio 2009-12.

É o que revela pesquisa feita pelo Cepam (Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal), ligado à Fundação Faria Lima. Segundo o levantamento, feito em 624 das 645 cidades paulistas, a Saúde Pública será o carro-chefe da gestão para 32,1% dos entrevistados, enquanto 26,1% tratarão com mais ênfase o ensino. O emprego é o terceiro item mais apontado na agenda de ações prioritárias - 9,9% destacaram medidas que resultem em geração de renda e postos de trabalho.

Em entrevista exclusiva à APJ (Associação Paulista de Jornais), o presidente do Cepam, Felipe Soutello, revela que a preocupação com os efeitos da turbulência global nas finanças municipais é um traço comum entre os gestores públicos recém-empossados.

"Quando os prefeitos fazem uma avaliação dos desafios e dos principais problemas e carências da cidade, o tema é o desenvolvimento econômico. É a questão do emprego. Esta pauta está presente em todas as regiões do Estado", afirma.

APJ - Por que o Cepam decidiu elaborar um perfil dos prefeitos do Estado?

FELIPE SOUTELLO - O prefeito é o agente público que está mais próximo das pessoas. Cuida do parque, da praça, da rua. E apesar disso, fora do território em que ele atua, sabe-se muito pouco sobre ele. Queremos detalhar a importância do político da cidade. O que ele pensa, o que ele espera dos governos estadual e federal. Até para entender um pouco o que ele está programando para os próximos quatro anos.

APJ - O que chamou a atenção no resultado do estudo? Percebe-se que existe uma preocupação muito séria em concentrar ações nas áreas de Saúde e Educação...

SOUTELLO - Sim, Educação e Saúde, até mesmo porque são as principais atribuições dos municípios. Agora, chamou a atenção, por exemplo, o impacto da crise no planejamento dos mandatos. Você nota que, quando os prefeitos fazem uma avaliação dos desafios e dos principais problemas e carências da cidade, o tema é o desenvolvimento econômico, é a questão do emprego. Essa pauta está presente em todas as regiões do Estado.

APJ - Como o prefeito quer ser visto pelo eleitor?

SOUTELLO - Eles querem ser reconhecidos quando terminar o mandato como bons gestores. Isso chamou a atenção. É o principal item. Isso revela a preocupação deles com a gestão pública, com a administração. Dar um retorno ao eleitorado quanto aos serviços municipais. Se o prefeito atuar de forma correta, ele será reconhecido mais do que pelas suas qualidades individuais. Antigamente, a oratória ou uma obra eram determinantes. Agora, é a boa administração. Acho isso bastante positivo.

APJ - Por que ouvir os prefeitos sobre temas polêmicos?

SOUTELLO - Os prefeitos de agora são os futuros deputados estaduais, federais, aqueles que vão galgar posições na política. E é preciso entender como este pessoal está encarando temas polêmicos nacionais. Em segundo lugar, porque os prefeitos são muito poderosos na pressão que exercem sobre o Congresso Nacional. Para mudança de legislação, apoiando ou não alguma medida.

APJ - Em que item existe uma posição mais consensual?

SOUTELLO - O caso da flexibilização da legislação trabalhista, por exemplo, é hegemônico. Cerca de 74% dos prefeitos dizem ser favoráveis a mudanças, acham que é preciso mexer um pouco nas regras do mercado de trabalho para gerar emprego. Parece claro que eles querem renovar esta legislação, que é bastante antiga.

APJ - O estudo mostra também que persistem aquelas dinastias políticas, ou seja, o poder que passa de pai para filho...

SOUTELLO - Isso ocorre. Eu acho que isso não deve ser visto necessariamente como uma coisa negativa. O que é ruim é o nepotismo, o sujeito usar o cargo que ocupa para empregar pessoas da família dele. Agora, a questão da tradição familiar é da política brasileira. Não é porque o sujeito é filho de alguém que não pode ter vocação para o cargo público. O que tem que ser evitado é o abuso.

APJ - E a formação? Impressiona o fato de a maioria querer continuar estudando?

SOUTELLO - Há uma falsa impressão de que os prefeitos das menores cidades têm formação acadêmica inferior. A pesquisa mostrou ao contrário, que grande parte dos prefeitos tem formação e, o mais importante, eles querem continuar estudando e se especializando em administração pública, o que é mais importante.

APJ - No campo político-partidário, qual dado chama mais a atenção?

SOUTELLO - A fidelidade partidária chama a atenção. Quando você analisa em detalhes os dados dos prefeitos paulistas, você vê que o tempo médio de permanência deles nos partidos é bastante elevado. Isso mostra uma tendência dos prefeitos em estar em uma agremiação, trabalhar por ela por conta da coerência no processo político. Claro que há exceções, mas é um dado relevante numa democracia que ainda tem poucos anos.

APJ - De que forma as atividades do Cepam podem interagir com os dados apresentados na pesquisa?

SOUTELLO - Há uma grande parceria com a Secretaria de Emprego e Relações do Trabalho para fortalecer os conselhos ou comissões municipais de emprego. Estamos percorrendo o Estado todo. É esta comissão que decide os cursos de qualificação que devem ou não ser priorizados, se a pessoa deve ou não tomar crédito. Isso é extremamente importante na política de emprego. Também estamos trabalhando no projeto do microempreendedor individual, que tem objetivo de inserir o maior número de pessoas na formalidade. Estamos ligados nestes projetos para combater os efeitos da crise.

APJ - E na área da Responsabilidade Fiscal, que é uma preocupação dos prefeitos?

SOUTELLO - Trabalhamos dando consultoria orçamentária e fiscal permanente aos municípios, àqueles que nos consultam por telefone, que vêm aqui. Mas temos publicações, como a que fizemos na transição de contas. Auxiliou a mudança de governo. Vamos soltar outro material com dicas na parte tributária, na parte fiscal.

APJ - O sr. tem notado um avanço na postura dos prefeitos no sentido de procurar consultorias e apoio no Cepam ou o Cepam ainda tem que provocar, tem que estimular?

SOUTELLO - Dos dois jeitos. Nós temos obrigação de estimular as discussões, fazemos estudos temáticos. A procura para projetos de reforma administrativa, questões orçamentárias e fiscais têm sido grande e a tendência é aumentar. Os prefeitos sabem que uma instituição como a nossa dá suporte para a gestão.

APJ - Em termos regionais, o que o sr. destacaria nos dados da pesquisa. Alguma preocupação é comum a todas as regiões administrativas do Estado?

SOUTELLO - Todas as regiões do Estado mostram algumas similaridades. A questão do emprego, todos parecem colocar como um desafio. Muita gente está preocupada com a manutenção do emprego na sua cidade e na sua região. Muitos estão preocupados com os recursos, por exemplo, do Fundo de Participação dos Municípios. Caiu cerca de 14% o recurso federal e isso é preocupante para as cidades menores. Isso vai fazer com que os municípios reivindiquem do governo federal uma compensação. Há uma proposta no Congresso. A forma real é por meio da Reforma Tributária. De outro lado, a situação exige que os prefeitos sejam mais criativos, mais ousados e tenham uma prática de gestão mais eficiente. Tem que fazer mais com menos dinheiro.

APJ - Como será a disponibilização deste material?

SOUTELLO - Lançamos oficialmente no Congresso de Municípios, realizado em Santos. Entregamos para todos os prefeitos, deputados, senadores de São Paulo; secretários, autoridades, presidentes de estatais estão recebendo este material. E o cidadão comum pode acessar no site do Cepam (www.cepam.sp.gov.br). Nosso interesse é dar difusão máxima a este estudo.

Saúde e Educação são prioridades

Quando a pesquisa do Cepam sobre os novos prefeitos é geograficamente detalhada, Saúde e Educação aparecem na dianteira nos planos de governo em todas as regiões administrativas do Estado, sendo que somente nas zonas de Franca e Barretos o ensino público ultrapassa a questão sanitária.

Apesar de a prática ser combatida pelo Ministério da Saúde, a expansão da rede física ainda é a meta mais comum entre os prefeitos: 31,3% deles afirmam pretender construir e reformar hospitais, enquanto 27,9% consideram preponderantemente a melhoria na qualidade do atendimento e 22,2% falam em investir em postos de Saúde.

Na Educação, a principal medida proposta pelos governantes é a qualidade: 45,4% prometem apostar em aprimoramento do nível de ensino oferecido na rede municipal.

A construção de escolas vem em segundo lugar no ranking, com 23,3% das citações. O ensino técnico é mencionado por 20,2% e apenas 9,2% deles afirmam priorizar a ampliação da rede de creches.

A pesquisa procurou ser abrangente, alcançando desde enfoques pessoais, como a formação acadêmica, até aspectos de conteúdo, como as prioridades e perspectivas no exercício do mandato, passando por questões polêmicas e do cotidiano da política nacional, como, por exemplo, a fidelidade partidária.

PERFIL - Ainda de acordo com a pesquisa do Cepam, foi possível traçar um perfil médio dos governantes que assumiram em janeiro deste ano.

O prefeito típico de um município paulista é homem, tem 50 anos, é católico e nasceu na cidade que governa. Possui formação superior em uma área do conhecimento tradicional (como Engenharia, Direito, Medicina ou Administração), não domina um segundo idioma e, em um futuro próximo, pretende dedicar-se ao estudo de temas que melhorem sua carreira de gestor público.

Para se manter informado, o prefeito costuma acessar a internet e ler jornais, tanto os de sua região quanto os de grande circulação.

O estudo do Cepam foi realizado em parceria com a Secom (Secretaria Estadual de Comunicação) e apoio do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento).




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