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Rodrigo Gago, diretor da Faculdade de Direito de S. Bernardo: 'Nada substitui o ensino dentro da sala de aula’
Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
07/10/2019 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


A Faculdade de Direito de São Bernardo chegou aos 55 anos no sábado e seu diretor, o professor Rodrigo Gago Freitas Vale Barbosa, assegura que a entidade está sintonizada com a mudança no mercado de trabalho e nas relações com o emprego. Porém, cita que o contato olho no olho de docente e aluno é imprescindível. “Vemos o professor, em sala de aula, como insubstituível no ensino de qualidade. Ensino a distância, para nós, na graduação, é um instrumento acessório, mas nada substitui a formação em sala de aula”, diz ele, que afirma ter visto abusos na Operação Lava Jato e defende apuração no vazamento de conversas de procuradores.

A Faculdade de Direito de São Bernardo chega aos 55 anos em um momento de transformação das relações de trabalho e até mesmo dos empregos existentes. Como a instituição se atualiza aos novos momentos?
A Faculdade de Direito de São Bernardo chega aos 55 anos em um momento de transformação das relações de trabalho e até mesmo dos empregos existentes. Como a instituição se atualiza aos novos momentos? Há estudos sobre o impacto da inteligência artificial nas relações de trabalho e no mundo em geral. Carros autônomos, extinção de trabalhos repetitivos, que serão substituídos por robôs, entrega de produtos por drones, a indústria 4.0. Muitos alegam que vários postos de trabalho serão extintos e penso que, de fato, serão. Mas há um mundo de novas oportunidades que é menos conhecido. Sabemos quais serão os empregos a serem extintos, mas pouco conhecemos de novas oportunidades. No campo do direito, profissionais que simplesmente recortam e colam textos escritos e realizam trabalhos repetitivos estão em risco. Mas para o profissional de sólida formação, que seja inovador, que pense, reflita e tenha atuação intelectual, não haverá substituição. O robô não alcançará esse profissional. Busco dizer que o sucesso do profissional do direito estará ligado à sua formação, daí nossa preocupação com a excelência do ensino. Olhando para a Faculdade de Direito, estamos certos que os movimentos transformadores, como a inteligência artificial, serão aliados do bom profissional do direito. Nossa academia está atenta a essas transformações propiciando aos alunos sólida formação. Já no próximo ano teremos disciplinas optativas, tais como direito digital, programação jurídica, direito eleitoral, arbitragem e negociação coletiva. Tudo o que acontece de novo repercute positivamente em nossa faculdade. O profissional do direito terá de estar capacitado tanto para ajudar na regulação dessas novas tecnologias, como na utilização dessas ferramentas para melhor prestação de serviço. Há de se ressaltar também que, além da formação técnica sólida, é necessário envolver o aluno com os dramas sociais. Nossos alunos atuam em diferentes atividades de atendimento ao público que lhes trazem a formação humanista. Para nós, não é suficiente ver a técnica apurada, mas um ser humano completo, ético, consciente e protagonista no processo de transformação de uma sociedade que busca ser menos preconceituosa e mais transparente, ética e honesta.

Como a instituição trabalha em um mercado do ensino superior com grandes grupos, como a Kroton? Quais os diferenciais?
Entendemos que a longevidade da faculdade virá da excelência do ensino oferecido e que isso passa necessariamente pela excelência de nossos docentes. Hoje, 80% deles são doutores e 10% pós-doutores. Percebam que a Faculdade de Direito de São Bernardo está na contramão das instituições que têm viés lucrativo. Escolas demitem professores de sólida formação, doutores, mestres e contratam professores com menor titulação e formação por valores mais baixos. Há um movimento de redução de folha salarial. A Faculdade de Direito de São Bernardo não só atrai, por meio de seus concursos, os melhores profissionais, como uma vez inseridos em seu quadro lhes propicia o aprimoramento. Concedemos aos nossos professores bolsas de doutorado, pós-doutorado, fomentamos a participação em congressos e cursos no Brasil e no Exterior. Vemos o professor, em sala de aula, como insubstituível no ensino de qualidade. Ensino a distância, para nós, na graduação, é um instrumento acessório, mas nada substitui a formação em sala de aula. A Faculdade de Direito, como autarquia do município de são bernardo, não tem viés lucrativo e, por isso, a mensalidade é mais acessível. Temos uma preocupação com a sociedade em geral, tendo atendido mais de 10 mil pessoas somente esse ano por meio de projetos sociais. Envolver os alunos com questões sociais, como direito à saúde, direito à vida, direito à dignidade, são de extrema importância para a formação humanista de nossos alunos.

Nos 55 anos de atuação, como o senhor descreve a relação entre a Faculdade de Direito e os diversos prefeitos que passaram por São Bernardo? Houve entendimento mútuo do trabalho de cada um?
Estou na Faculdade de Direito de São Bernardo há 15 anos e estou diretor desde 2017. Posso dizer que encontro no prefeito de São Bernardo, Orlando Morando, um grande aliado e incentivador. Aprovamos, com a ajuda do Poder Executivo, projetos de lei nos últimos anos anos fundamentais para a faculdade e muitos outros projetos estão em curso. Não há ingerência política e destaco haver motivação constante para construir uma faculdade cada vez melhor. Percebemos no prefeito grande admiração e orgulho de ter uma autarquia de renome na cidade.

Quais as projeções futuras para a Faculdade de Direito? Quais projetos em curso? E como a faculdade trabalha para mapear tendências?
A meta é tornar a Faculdade de Direito de São Bernardo uma das três melhores faculdades de direito do País. Estamos nos atualizando no que é possível, desde estrutural ao conceito de atualização. Lançamos recentemente o núcleo de inovação, que tem o intuito de realizar o desenvolvimento de pesquisa acerca dos impactos da tecnologia e outras inovações no sistema jurídico e na sociedade como um todo. Vários são os projetos em curso, tais como a internacionalização por meio de convênios firmados com universidades estrangeiras. Nesse momento, duas de nossas alunas estão na Universidade de Messina, na Itália. Isso é inédito e será incentivado. Na pesquisa, estamos em fase final de elaboração de minuta de projeto que lei que busca dar aos docentes condições para implementarmos um programa de mestrado e mantemos cursos de especialização, além de inaugurarmos curso inédito, que é de pós-graduação em direito das diversidades, que já mostra inúmeros frutos. E, na extensão, o constante atendimento ao público por meio do escritório escola, direito na palma da mão, assistência jurídica e Cejusc (Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania).

Como o senhor enxerga o momento do direito no País, em relação à exposição de casos jurídicos na mídia?
Natural que a tecnologia, a proliferação dos meios de comunicação em massa, com maior abrangência e facilidade, tragam maior exposição não só aos casos jurídicos, mas a todas as questões do cotidiano. Penso que, quanto maior a informação da população em geral, melhores condições do cidadão ir à urna, mais exigente ele se torna e penso que, nesse movimento, há ganho sensível para a democracia e as transformações pretendidas. Neste momento, o STF julga uma questão importante envolvendo a Operação Lava Jato. Todos os sites repercutem, o julgamento ocorre ao vivo na televisão, os votos são mostrados um a um em vários meios de comunicação. O cidadão acompanha, se informa e isso, por si, só é um avanço.

Esse novo momento da política nacional, de alguma maneira, impacta na metodologia de ensino na Faculdade de Direito?
No que se refere à metodologia não há diferença. Nosso modelo de ensino é presencial, sala de aula. Nesse ambiente, o professor utiliza a tecnologia, o acesso a internet, vídeos, imagens. No conteúdo, especialmente, numa faculdade de direito, todas as questões do nosso cotidiano são abordadas e discutidas, com a preocupação de dar ao aluno todas as informações necessárias para que ele possa formar sua opinião e aprender a lidar com as diferentes posições com tolerância e respeito.

Após cinco anos de atuação, a Operação Lava Jato está no centro de polêmica após vazamento de áudios que sinalizariam um conluio entre procuradores e o Poder Judiciário. Como o senhor observa essa situação?
As questões trazidas a público geram grande desconforto e merecem ser apuradas.

O senhor acha que houve abusos na Lava Jato?
O procurador-geral da República, Augusto Aras, recentemente empossado, em seu primeiro discurso no STF, reconheceu equívocos, o que é extremamente saudável. Ele se compromete a atuar na correção. Diante de todos esses fatos, penso inafastável reconhecer terem sido cometidos abusos, mas que não desqualificam a operação como um todo. O caminho está no aprimoramento

Crítica recorrente ao STF é a de que os ministros fazem política em vez de apenas cuidar da Constituição Federal. O senhor concorda com essa visão?
São 11 ministros com perfis e atuações diferentes, os julgamentos muitas vezes transcendem as normas jurídicas, vejo isso com naturalidade num modelo de tribunal constitucional.

O senhor é favorável à Lei de Abuso de Autoridade?
Favorável, mas o projeto aprovado no Congresso Nacional necessita de ajustes sob pena de incorrer em afronta à Constituição.




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