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Bicombustível caminha para a liderança
Por Maria Paula Santilli
Da Hp press
11/05/2004 | 20:24
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"Em até três anos teremos 100% da produção equipada com a tecnologia de motores flexíveis. Estamos trabalhando para isso". A afirmação do diretor de Vendas e Marketing da Volkswagen, Paulo Sérgio Kakinoff, resume bem o momento de transição vivido pela indústria automobilística brasileira. Desde que foi lançado no mercado nacional o primeiro veículo flexível, que funciona com gasolina, álcool ou a mistura de ambos em qualquer proporção, o Gol Total Flex, em março do ano passado, a tendência se tornou irreversível.

Em pouco mais de um ano, já existem no mercado doméstico 12 modelos flexíveis, com motorizações que variam de 1.0 a 2.0, muitos deles fabricados exclusivamente com tais propulsores, e alguns até com transmissão automática. Das quase 300 versões de carros nacionais oferecidas no país, cerca de 10% são flexíveis, que já respondem por significativos 14,5% das vendas.

Diante da demanda crescente, os palpites são unânimes: de engenheiros de montadoras a proprietários de lojas multimarcas, todos apostam no prazo de três anos para que os flexíveis dominem o mercado. Popularmente, tais veículos também são chamados de bicombustíveis, termo rejeitado por especialistas. Segundo o engenheiro mecânico e gerente de serviço técnico legislativo da Fiat, Marco Saltini, bicombustível é aquele que trabalha com dois combustíveis em reservatórios separados. Assim como os carros a gasolina e GNV (gás natural veicular).

Atualmente, a tecnologia é oferecida apenas por três montadoras: GM (Corsa, Meriva, Zafira, Montana e Astra), Volkswagen (Gol, Parati, Saveiro e Fox) e Fiat (Palio, Siena e Palio Weekend). Detentora de 45% do mercado de flexíveis, a Volkswagen pretende incluir a tecnologia na família Polo no próximo semestre. "Atualmente, 32% das vendas para o mercado doméstico são de carros com motores flexíveis", afirma Kakinoff.

As concorrentes, por sua vez, já se mexem para não ficar para trás. A Ford, por exemplo, afirma que lançará neste semestre seu primeiro carro com motor flexível, mas ainda faz segredo quanto ao número de modelos. A Renault pretende entrar para o "clube" dos flexíveis no primeiro semestre de 2005. A new comer francesa deve iniciar sua oferta com a motorização 1.6 flexível, mas ainda não revela em quais modelos. Outras, como a Honda, não têm planos em médio prazo para disponibilizar modelos flexíveis.

Oferecer ao proprietário o poder de escolha do combustível em função do preço. Esse é o principal atrativo dos carros flexíveis. Para obter economia é preciso obedecer a uma conta simples. "Se o preço do álcool estiver até 70% do preço da gasolina, compensa rodar só com álcool. Se o preço do álcool estiver superior a essa porcentagem, compensa abastecer com gasolina", afirma Marco Saltini. Tudo isso porque, ao ser abastecido apenas com álcool, o carro tem um consumo de combustível de cerca de 30% a mais se comparado com a gasolina.

"Percebi a vantagem no bolso, pois gasto cerca de R$ 29,00 para encher o tanque com álcool. No entanto, sempre misturo 10 litros de gasolina, é uma mistura boa para dias frios. Tenho feito cerca de 6,7 km/l na cidade e estou satisfeito com o desempenho, com torque, potência e arrancada", afirma Wagner Vagliengo, proprietário da empresa de pintura automotiva Vagli-Paint, de Diadema, que comprou um Corsa sedã 1.8 Flexpower.

Mas, segundo o gerente de engenharia de produtos da GM Powertrain, Henrique Pereira, a melhor mistura é variável. "Se o objetivo é viajar em longas distâncias sem abastecer no caminho, é melhor usar gasolina, pois proporcionará maior autonomia. No inverno, pode-se colocar 15% de gasolina no tanque de álcool", afirma Pereira.

Quem não estiver satisfeito com a opção de escolher entre dois combustíveis, ainda poderá converter o flexível para GNV. "Como a taxa de compressão é mais alta, o flexível é melhor para ser convertido do que o carro a gasolina. Mas não recomendo, pois perderá a garantia de fábrica", diz Pereira.

Apesar do GNV ser mais econômico do que o álcool, imagina-se que o gás natural se torne menos procurado por particulares, por conta do preço de aquisição do sistema. A tendência, segundo especialistas da indústria automotiva, é que o GNV se restrinja cada vez mais ao nicho das frotas.

Já o preço de aquisição do carro flexível é semelhante ao de veículos com motores movidos a um só combustível. "Veículos flexíveis com motores 1.8 e 2.0 têm incentivos no IPI que ajudam a cobrir custos de seu desenvolvimento", afirma Pereira. Os flexíveis respondem atualmente por 15% da produção da GM, sendo que metade é vendida na região Sudeste.

Um grande tabu, desmentido pelas montadoras, ainda assombra alguns possíveis compradores de flexíveis: de que tais veículos nunca teriam desempenho otimizado. Com taxa de compressão maior, os motores a álcool têm maior rendimento térmico, obtendo assim potência maior em relação aos motores similares, porém, consomem mais combustível do que os motores a gasolina.

Como, então, chegar a um denominador comum? Não seria possível usar no flexível a taxa de compressão do álcool, pois ao ser abastecido com gasolina correria o risco de pré-ignição. Se fosse usada a taxa de compressão da gasolina, não seria aproveitada a maior octanagem do álcool, e o carro perderia em potência. Por isso, foi preciso criar um novo motor capaz de trabalhar com uma situação intermediária.

É aí que entra em cena a tecnologia. "O motor flexível tem sensores especiais, software específicos e injetores diferenciados, entre outros. A eletrônica veicular evoluiu de tal forma que tornou a tecnologia viável. Todos os motores que passaram para flex ganharam em consumo e em desempenho", afirma Henrique Pereira.

Como os compradores de 0km geralmente ficam, no mínimo, um ano e meio com o veículo, ainda não existe oferta de flexíveis no mercado de seminovos. Mas as lojas multimarcas que também trabalham com novos já perceberam a força dos flex. "Cerca de 50% da procura entre os 0km é por carros flexíveis, assim como as vendas. A aceitação tem sido muito boa", afirma Alexandre Pessini, gerente administrativo da multimarcas Gilcar, com duas lojas em São Bernardo. A Gilcar não comercializa carros modificados para álcool ou GNV fora de fábrica. "Não podemos garantir como foi feito o serviço", diz Pessini.

No Auto Shopping Global, em Santo André, 90% das ofertas são de seminovos. Mas dos 0km, cerca de 40% são flexíveis. "O que aparece de flexível vende. A procura é boa e crescente", diz o gerente de marketing, Carlos Eduardo de Moraes Barros. A Chevrolet Zafira, com o lançamento do modelo Flexpower 2005, no último mês de março, superou seus principais concorrentes, o Citröen Picasso e o Renault Scènic, respectivamente, e fechou o mês de abril com 993 unidades emplacadas.

A vantagem de se obter um veículo flexível atualmente se dá por conta do preço do álcool, bem inferior ao da gasolina. Nesse caso, por que não investir no carro movido apenas com o combustível derivado da cana de açúcar? A resposta está no fim dos anos 80 e início dos anos 90, quando faltou álcool no mercado. "O público perdeu a confiança e parou de comprar carro a álcool. A sazonalidade da cana de açúcar não permitia estocar álcool. Mas de 1999 para cá, o governo vem tentando incentivar o carro a álcool, inclusive para frotas", finaliza Henrique Pereira.




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