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ECA, 28 anos entra avanços e dificuldades

Na região, são pelo menos 22 mil crianças e adolescentes em situação vulnerável

Por Juliana Stern
Especial para o Diário
15/07/2018 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC


 O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), lei que regulamenta o artigo 227 da Constituição Federal e que diz respeito aos direitos da criança e do adolescente, completou 28 anos na sexta-feira. No Grande ABC, a luta pelos direitos da infância comemora avanços significativos, ao mesmo tempo em que encara dificuldades crescentes. Na região, são pelo menos 22 mil crianças e adolescentes em situação vulnerável, segundo dados repassados pelas prefeituras de Santo André, São Bernardo e Ribeirão Pires. Os demais municípios não detalharam informações. O Estatuto, promulgado em 13 de julho de 1990, é uma das legislações mais avançadas no mundo em termos de proteção à criança e prevê que as prefeituras mantenham políticas públicas para menores de 18 anos que se encontrem em estado de vulnerabilidade social.

O Grande ABC chegou a ser pioneiro nas discussões sobre a proteção e garantia dos direitos de jovens, mas hoje ainda enfrenta dificuldades. Para o advogado e coordenador da Comissão da Infância e Juventude do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), Ariel de Castro Alves, os maiores avanços apresentados nesses 28 anos foram a implementação de Conselhos Tutelares próprios em cada uma das sete cidades, a existência de Varas da Infância e Juventude e a boa qualidade e alcance do ensino municipal. “Tirando as creches, as escolas municipais têm capacidade para abrigar praticamente 100% das crianças, não falta vaga e o ensino não deixa muito a desejar na qualidade”, diz o advogado.

Mas as comemorações param por aí. Segundo Alves, mesmo o que é considerado avanço tem suas ressalvas. “Os conselhos tutelares, muitas vezes, funcionam em condições precárias e as varas da juventude são acumulativas, ou seja, um juiz que atende a infância também pode atuar na vara criminal, desfalcando a equipe da juventude”, alega.

Para o especialista, um dos pontos fracos da região é a inexistência de uma delegacia especializada em delitos cometidos contra ou por menores de 18 anos, as conhecidas Diju (Delegacia da Infância e Juventude). Sem o equipamento crianças ficam no meio de adultos durante o atendimento inicial, que dura até dez dias, e só depois disso são encaminhados para as unidades da Fundação Casa.“Os jovens apreendidos deveriam ir para lugares adequados, as delegacias não tem condições de fazer a manutenção deles. Tem problema de alimentação, segurança, a família não consegue visitar”, diz Alves.

Essa lacuna de um equipamento próprio para crianças e adolescentes também é encontrada na área da Saúde. Para o coordenador do Projeto Meninos e Meninas de Rua de São Bernardo e conselheiro Estadual de Direitos Humanos, Marcos Antônio da Silva, o atendimento para jovens que sofrem com violência doméstica, uso de drogas, abandono e outras questões que precisam de acompanhamento médico e psicossocial ainda é muito genérico. “Além de haver poucos equipamentos públicos que atendam essas necessidades específicas, o tamanho da demanda é desconhecido. Não há um levantamento de quantos meninos estão em abrigos, quantos sofrem violência ou abandono ou quantos trabalham nas ruas e estão expostos a acidentes.”

Ausência de dados recentes dificulta ações
A ausência de dados atualizados de crianças e adolescentes em situação de risco é outro ponto criticado por especialistas. O último levantamento que abrange as sete cidades é datado de 2010, quando, à época, material do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC apontou que 112 crianças e adolescentes perambulavam pelas ruas da região, dos quais 68% trabalhavam nos semáforos. 

Dados mais recentes podem ser encontrados a partir de denúncias ao serviço social dos municípios, conselhos tutelares e ao MPT (Ministério Público do Trabalho), que em 2017 recebeu 27 relacionadas à região, e, até maio deste ano, dez. Em São Bernardo, o serviço de abordagem social flagrou, nos primeiros cinco meses do ano, 89 crianças e adolescentes trabalhando.

Alberto, 15, e Vitor, 13 (nomes fictícios) são irmãos, moradores do bairro São Matheus, na Capital, e estão há cinco meses limpando para-brisas no farol em frente ao Shopping Metrópole, no Centro de São Bernardo. Os garotos, que moram com os pais e tem mais dois irmãos em casa, batem ponto no semáforo para tirar de R$ 30 à R$ 40 por semana.

Segundo os meninos esse dinheiro é para não depender muito dos pais. “A gente usa para comprar nossas coisas, não ficar pedindo para a mãe”, diz o mais velho, que sonha ser engenheiro eletrônico. O mais novo usa o dinheiro para diversão e fazer faculdade não está nos seus planos. “Gasto com maconha. Não quero ser pobre, quero ser traficante”, revela.

Para o coordenador do Projeto Meninos e Meninas de Rua de São Bernardo e conselheiro Estadual de Direitos Humanos, Marcos Antônio da Silva, esse cenário é resultado da realidade da criança. “Os meninos querem ser quem está mais próximos deles. Se o tráfico é a realidade, é isso que ele vê para si”, diz o conselheiro.

Atualmente, São Bernardo, por meio da Fundação Criança, atende 12 mil crianças e adolescentes vulneráveis. Santo André auxilia 10 mil jovens com serviços do Cras (Centro de Referência da Assistência Social) e Creas (Centro de Referência Especializada em Assistência Social), além de implementar recentemente o SAT ( Serviço de Acolhimento Transitório para Crianças e Adolescentes), que oferece acolhimento para situações emergenciais, identificadas pelo Conselho Tutelar.

Por último, Ribeirão Pires aderiu a dois programas, o Ação Jovem do governo estadual, que é uma transferência de renda como incentivo para o adolescente ter acesso e permanecer na escola. atendendo 200 jovens, e o PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil ) do governo federal, com 40 inscritos.




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