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'Crianças foram tratadas como objetos', diz Guido Palomba
Samir Siviero
Do Diário do Grande ABC
14/09/2008 | 07:08
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Um dos mais respeitados psiquiatras forenses do País, Guido Palomba, autor de livros sobre o tema, disse que o que mais chamou sua atenção no caso em que os irmãos Igor Giovanni, 12 anos, e João Victor dos Santos Rodrigues, 13, foram assassinados, queimados e esquartejados foi a forma simplista com que o pai João Alexandre Rodrigues, 39, e a madrasta Eliane Aparecida Nunes Rodrigues, 35, os mataram.

Palomba afirmou que o pai e a madrasta consideravam as crianças um problema, por supostamente atrapalharem o relacionamento do casal, e resolveram essa situação como se estivessem trocando de lugar um objeto que os estava incomodando. O especialista disse que outro fator marcante do caso é a ausência de afeto com os próprios filhos e essas duas características juntas apontam para indivíduos mentalmente deformados e irrecuperáveis.

Ressaltando que não tomou conhecimento do processo todo, Palomba falou que a atuação de marido e mulher, como neste caso, é conhecida como "loucura a dois" e que não há como detectar esse desvio de caráter preventivamente.

DIÁRIO - O assassinato de Igor Giovanni, 12 anos, e João Victor dos Santos Rodrigues, 13, chocou a sociedade não só pela brutalidade com que os jovens foram mortos, queimados e esquartejados, mas também porque os responsáveis foram o próprio pai e a madrasta. Que características marcam esse crime brutal do pai contra os próprios filhos?

GUIDO PALOMBA - Esse caso é marcado por duas características. Primeiro a forma simplista do casal em resolver um problema - os filhos atrapalhavam o casal, então eles pegam, matam, picam e jogam no lixo, ou seja, uma forma simplista para resolver um problema extremamente complexo. O segundo ponto é a ausência quase que completa de afetividade com as vítimas. "Este objeto aqui do lado está me incomodando, então me desfaço dele destruindo e jogando no lixo", só que os objetos são os próprios filhos.

DIÁRIO - Como o senhor classificaria estes agressores?

PALOMBA - As duas características que falei apontam diretamente para indivíduos deformados mentalmente e irrecuperáveis, porque antes, durante e depois do crime não há nenhum indício de piedade ou de compaixão.

DIÁRIO - Neste caso, nós temos a madrasta assumindo ser co-partícipe do assassinato das crianças, mas alegando que só agiu porque teria sido ameaçada pelo marido. Não haveria uma cumplicidade de marido e mulher que os levassem a cometer os crimes?

PALOMBA - Quando há a atuação de um casal, há grandes possibilidades de que um seja o indutor e outro o induzido, mas não que um tenha menos culpa. A psiquiatria chama estes casos como "loucura a dois", que é uma loucura contagiante, induzida. Quando há casos de loucura a dois, o indutor vai continuar do jeito que sempre foi, mas o induzido uma hora cai a ficha e ele acaba contando a verdade e entregando o parceiro.

DIÁRIO - Há como prevenir deformidades psicológicas como essa?

PALOMBA - Não há como detectar isso em uma pessoa comum. E aqui cabe ressaltar que não daria para a conselheira tutelar imaginar que isso fosse acontecer. Mas é óbvio que quando as crianças voltaram sozinhas para se queixar, um exame detalhado deveria ter sido feito, o que poderia detectar com segurança a necessidade de afastar as crianças da casa.

DIÁRIO - O choque na sociedade é ainda maior por se tratar do pai das crianças, que cometeu um crime e bárbaro, como este?

PALOMBA - A reação na sociedade é por aí mesmo. São condutas e fatos inusitados, além de cruéis e perversos que nunca se espera que sejam praticados por um pai em seu próprio filho e que mostram uma deformidade de caráter moral em quem o pratica.

DIÁRIO - O senhor já analisou casos semelhantes?

PALOMBA - Infelizmente, para mim, este caso não é uma novidade. Já vi vários casos semelhantes. Não é tão raro assim, mas o que realmente choca a sociedade é que o agressor neste caso é o próprio pai.

DIÁRIO - A atuação do Conselho Tutelar, que devolveu as crianças para o pai e a madrasta, foi muito questionada, mas há preparo suficiente para que os conselheiros avaliem com propriedade casos como este?

PALOMBA - Faltaria, realmente, um melhor preparo, não só na escolha dos conselheiros, que devem ser pessoas ligadas à área, mas também com mais suporte, com aparato psicológico, por exemplo, para avaliação de cada caso.




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