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Júri comum atrai pouca atenção
Por Tiago Dantas
Do Diário do Grande ABC
28/03/2010 | 07:01
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Pelo menos sete júris foram realizados nesta semana nos fóruns do Grande ABC. Juntos, eles não atraíram a presença de um público tão grande quanto aquele que formou fila em frente ao Fórum de Santana, Zona Norte da Capital, para acompanhar o julgamento de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá. Após cinco dias, o casal acabou sendo condenado pela morte da garota Isabella Nardoni, 5 anos, filha de Alexandre.

O Diário acompanhou um julgamento realizado quinta-feira em São Bernardo. Não havia, na porta do Fórum, na Vila Tereza, um grupo de manifestantes pedindo justiça. Muito menos uma multidão de jornalistas aguardando a sentença do juiz. Em comum com o julgamento dos Nardoni, depoimentos emocionados dos réus, debates acalorados entre defesa e acusação e a sentença dada pelos jurados: culpados.

MATOU OPERÁRIO - Sentado no banco dos réus de São Bernardo às 13h de quinta-feira estava José Vicente da Silva, 47 anos. Ele estava sendo acusado de matar com quatro tiros o operário Jeremias da Silva Batista, então com 28 anos, em 22 de fevereiro de 1987. Após passar 22 anos foragido, Silva foi preso em setembro do ano passado em Salto, no Interior, e aguardava julgamento no CDP (Centro de Detenção Provisória) de São Bernardo.

Ao contrário do casal Nardoni, que pode escolher a roupa que usou no julgamento, Silva vestia o uniforme do presídio: camiseta branca, calça laranja e chinelo. Na plateia do plenário para 126 pessoas, o público não passou de 16 - oito parentes do réu, seis estudantes de Direito e dois advogados que admitiram ter parado na sala do júri para "prestigiar os colegas". No Fórum de Santana, havia lista de espera com mais de 100 nomes. Sem contar os curiosos que ficaram do lado de fora.

Após a escolha do conselho de sentença e a apresentação do caso, as testemunhas começaram a ser ouvidas. Se os jurados do caso Isabella tiveram de acompanhar seis depoimentos que duraram dois dias, em São Bernardo apenas uma testemunha falou por cerca de 30 minutos. O interrogatório de Silva também não levou mais do que meia hora. Alexandre Nardoni falou por quase seis horas e Anna Carolina, por cinco horas.

A sentença do caso Isabella foi lida pelo juiz Maurício Fossen à 0h30 de sábado, após cinco dias de julgamento. Em São Bernardo, o juiz Wagner Roby Gídaro leu o veredito às 17h, quatro horas após o início do júri, com direito a aula: "Essa é uma lição para todos. As coisas não se resolvem na bala, nem na violência, como o senhor José Vicente fez."

Crime foi motivado por ciúmes e fofoca entre vizinhos

José Vicente da Silva, 47, foi condenado a oito anos de prisão por ter matado o operário Jeremias da Silva Batista em 22 de fevereiro de 1987. Os jurados que analisaram o caso quinta-feira, em São Bernardo, entenderam que o réu cometeu o crime motivado por "violenta emoção". Silva estava duvidando da fidelidade de sua mulher e teria sido provocado por Jeremias.

Semanas antes do crime, Silva havia flagrado o operário elogiando sua mulher. "A gente dividia o mesmo quintal. Ouvi ele falando pra minha mulher: ‘Você é demais. Ainda vou provar disso tudo'. A chamei de lado e disse que ela não podia ouvir isso e ficar quieta", contou Silva aos jurados. Passados alguns dias, o réu foi surpreendido com um envelope na porta de sua casa.

"O bilhete falava para eu tomar cuidado com minha mulher. No começo, alertando. Embaixo, tinha uns desenhos de um homem com chifre e umas palavras que eu não queria escutar", afirmou Silva. O réu desconfiou de que a carta tinha sido escrita pela mulher do vizinho Jeremias. A suspeita seria confirmada somente após o crime por um exame do Instituto de Criminalística.

Silva disse que pegou uma arma com um amigo e foi até a empresa onde o vizinho trabalhava acompanhado de um irmão e do cunhado. "Perguntei pra ele o que estava acontecendo e ele começou a negar. Até que uma hora falou: ‘Saí com sua mulher e saio quantas vezes quiser. Não só eu, como outros!' Aí, fiquei louco e atirei nele", confessou o réu.

Depois disso, Silva fugiu para São Joaquim do Monte, em Pernambuco, com a mulher e o filho. Mudou-se para Salto, no Interior, um ano depois, onde ela confessou que o havia traído, mas não com Jeremias. O casal se separou.

Ficar na plateia ajuda na formação dos alunos

Acompanhar um júri faz parte da formação dos alunos de Direito. É comum ver os estudantes fazendo anotações em folhas de papel sentados nas plateias dos plenários. A USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), organizou um júri simulado com a participação dos alunos em outubro do ano passado e pretende fazer uma simulação parecida ainda neste semestre.

"Vamos trazer um promotor e um advogado criminalista que atuem no júri para que os alunos possam ter um contato direto com a prática. No segundo semestre, devemos fazer um júri simulado, dessa vez só com alunos", afirma Vander Ferreira de Andrade, diretor do curso de Direito da USCS.

"O júri é muito peculiar. Tanto o promotor quanto o advogado precisam desenvolver algumas habilidades específicas, como ter uma formação humanística forte, entender de religião, medicina, criminalística, psicologia. Tem de estar preparado na oratória e ter um raciocínio jurídico aguçado", opina o professor Andrade.

"Muitos estudantes estão debatendo a questão do júri nas últimas semanas, muito por conta do caso Nardoni. É interessante que desperte a curiosidade deles", diz Vladimir Balico, professor de Direito Processual Penal da Faculdade de Direito de São Bernardo. "Sempre falo, na sala de aula, sobre os casos midiáticos, que têm muita repercussão e acabam sendo mais complicados, principalmente no júri."

Aluna do 9° semestre de Direito da Universidade Metodista, Camilla Torres Munhoz Ribeiro, 24 anos, acompanhou o júri de José Vicente da Silva, em São Bernardo, na quinta-feira, como parte de um trabalho da faculdade. "É a primeira vez que venho a um júri. Não sabia qual era o caso. Liguei no cartório hoje de manhã, perguntei se teria júri e vim com mais dois amigos."

"Até tinha vontade de ter ido para Santana ver o júri do casal Nardoni, mas é muita gente na fila de espera. Aqui é mais tranquilo", conta Wilson dos Santos, 38, estudante de Direito da Faculdade Fapan, que levou duas amigas ao Fórum.




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