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Segredos evolutivos do orgasmo feminino
Carlos Roberto Fonseca
Especial para o Diário
23/08/2010 | 07:00
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O orgasmo é visto atualmente como sinônimo de uma relação sexual saudável. No tempo da pílula, da camisinha, dos remédios para impotência, dos vibradores e de toda a parafernália tecnológica que envolve a indústria do sexo, o clímax tornou-se quase um fim em si mesmo. Mas nem sempre foi assim... Do ponto de vista biológico, o sexo é apenas um meio de assegurar a reprodução. Tanto é verdade que algumas espécies o deixaram de lado e conseguem se reproduzir assexuadamente. Para a maioria das espécies, porém, o coito é um mecanismo biológico fundamental para conseguir deixar mais filhos ou ter descendentes de melhor qualidade genética.

O papel biológico do orgasmo masculino é claro para a maioria das pessoas. Como invariavelmente ele está ligado à ejaculação, não há qualquer dúvida a respeito de sua função reprodutiva.

Mulheres - Já o clímax feminino, no entanto, é considerado um grande mistério. Para começar, não existe sincronia entre o momento do orgasmo feminino e a liberação dos óvulos pelos ovários. Aliás, o período exato do ciclo menstrual em que as mulheres estão férteis parece ser um segredo tão bem guardado que, aparentemente, nem mesmo elas sabem. Muito menos seus parceiros! Essa ‘ovulação oculta' contrasta bastante com o ocorre com as fêmeas de muitos outros mamíferos, que anunciam aos quatro ventos seu estado fértil por meio de cores brilhantes, cheiros especiais e solicitações ostensivas.

Uma definição formal
O orgasmo feminino é uma sensação variada e aguda de prazer intenso, que cria um estado alterado de consciência. Começa, em geral, junto com contrações involuntárias e rítmicas da musculatura estriada pélvica cincunvaginal, acompanhadas, com frequência, de contração do útero e do ânus, e um relaxamento lento que desfaz (algumas vezes parcialmente) a vasoconstrição induzida pelo ato sexual, induzindo bem-estar e contentamento.

Charles Darwin e a teoria da seleção sexual
Muitos pesquisadores acreditam que o orgasmo feminino, em toda a sua complexidade fisiológica, morfológica e comportamental, só pode ser compreendido por meio da teoria da seleção sexual proposta pelo naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882). Em seu famoso livro A origem do homem e a seleção sexual, de 1872, ele propôs que as disputas sexuais entre indivíduos da mesma espécie influenciam profundamente sua evolução. Segundo Darwin, esses embates podem ser divididos em dois tipos principais: competição entre machos e escolha por parte das fêmeas.

A mais intrigante hipótese adaptacionista sobre a evolução do orgasmo feminino foi proposta em 1970 pelo inglês Cyril A. Fox e colaboradores, do Hospital São Bartolomeu, em Londres, após estudo sobre a pressão intravaginal e intrauterina durante o ato sexual. O estudo mostrou que as contrações dos músculos do aparelho genital feminino durante o clímax criam uma diferença de pressão que suga e transfere parte do esperma da vagina para o canal cervical, aumentando a chance de fertilização.

É a chamada ‘hipótese da sucção', que ganhou forte respaldo científico em 1993, quando os biólogos Robin Baker e Mark Bellis, da Universidade de Manchester (Inglaterra), estudaram a transferência de esperma em 35 casais ingleses e ainda entrevistaram milhares de mulheres sobre suas experiências sexuais. Assim, o ápice feminino seria um sofisticado mecanismo que permite às mulheres escolher, conscientemente ou não, quando engravidar. Ou seja, um típico mecanismo darwiniano de opção feita pela fêmea.

No estudo com casais ingleses, para lá de íntimo, Baker e Bellis verificaram que, em média, 35% do esperma transferido em um ato sexual são perdidos pelas mulheres pela vagina na meia hora que se segue à ejaculação. Constataram, porém, que o clímax feminino aumenta muito a taxa de retenção do esperma no trato reprodutivo da mulher, ampliando a chance de aquele coito resultar na geração de um bebê.

Eles também descobriram que, quando o orgasmo feminino ocorre no intervalo entre um minuto antes da ejaculação masculina até 45 minutos depois do clímax masculino, a taxa de retenção do esperma pela mulher é alta. No entanto, quando o orgasmo feminino ocorre mais de um minuto antes da ejaculação, a retenção do esperma é baixa.

Assim sendo, por meio da sincronia ou assincronia de seu orgasmo em relação ao momento do clímax masculino, as mulheres são capazes de controlar, de modo consciente ou não, as chances de fertilização de cada ato sexual. Os orgasmos silenciosos - não comunicados ao parceiro - reduzem em muito a chance de a mulher engravidar, já que o homem pode demorar mais de um minuto até ejacular. Falsos orgasmos femininos podem induzir a ejaculação do parceiro e a finalização do coito, diminuindo a chance de fertilização. Orgasmos múltiplos ocorridos após a ejaculação seriam um mecanismo feminino para assegurar o sucesso reprodutivo do ato sexual.

Os mistérios da sexualidade feminina parecem não ter fim. No estudo inglês, quase 50% dos orgasmos declarados por elas ocorreram sem a presença de seus parceiros, principalmente por meio da masturbação. E, surpreendentemente, foi demonstrado que esse tipo de orgasmo é capaz de alterar as taxas de retenção de esperma de coitos que ocorrem dias depois! Assim, apesar de muitas sociedades humanas serem com frequência dominadas pela competição entre machos, a hipótese da sucção sugere que, por meio da manipulação de seus orgasmos, são as mulheres que dão a última palavra quando se trata de seu futuro reprodutivo.

Departamento de Botânica, Ecologia e Zoologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte




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