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Santa renúncia

Confesso-lhes que pensei algumas dezenas de vezes...

Por Carlos Ferrari
13/03/2013 | 00:00
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Confesso-lhes que pensei algumas dezenas de vezes antes de decidir, de fato, que trataria desse assunto. É um belo desafio escrever sobre determinada situação que nas últimas duas semanas, de alguma forma, pôde ser discutida por um grande percentual dos seres humanos vivos do planeta. Paradoxalmente, falar da renúncia do papa com conhecimentos específicos sobre o tema é condição para poucos, e mesmo aqueles que se sentem ou se colocam habilitados para tal, tratam da questão sempre se cercando do maior número possível de cuidados e variáveis para que, no fim das contas, nem um equívoco seja cometido.

Contudo, concluí que se omitir por completo nesse momento, sem qualquer tipo de trocadilho infame, seria um pecado para com a história. Bento XVI foi o 265º papa e neste contingente apenas o sétimo a se colocar diante do mundo com a coragem suficiente para comunicar a decisão de renunciar. Fora isso, a última vez que a humanidade testemunhou uma situação equivalente foi em 1415, isso mesmo, há quase 600 anos. 

Tais elementos nos chamam para a responsabilidade de sermos, antes de mais nada, testemunhas conscientes de um fato que jamais se repetirá. Muitos outros papas poderão vir a comunicar que não seguirão em frente.

Porém, este foi o primeiro a tomar tal atitude em um mundo on-line, onde todas as informações são de domínio público, quase em tempo real. O próprio papa, ao tornar pública sua escolha, considerou em seu pronunciamento esse novo mundo, tão dinâmico, complexo, enfim, um mundo que, dentre infinitas possibilidades, também pode comportar a grandeza de quem opta por renunciar. Disse Bento XVI: "No mundo de hoje, sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida e para a fé, para governar a barca de Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário vigor, tanto do corpo como do espírito, vigor que, nos últimos meses, diminuiu de tal modo em mim que devo reconhecer a minha incapacidade de administrar bem o ministério a mim confiado."

Desde 28 de fevereiro vivemos em um mundo sem papa e acompanharemos por nossos televisores, smartfones, tablets, jornais e revistas impressas, um conclave sem luto. Independentemente da confissão religiosa, como diz a garotada: "É impossível não cair a ficha" diante do cenário proporcionado por Bento XVI. 
Mas então, o que fazer diante de tudo isso?

Proponho que, como tantas outras situações que já vimos e vivemos com intensidade, neste caso também possamos esgotá-la, buscando escrever, discutir, e pensar sobre todos os aspectos do fato que em cada um possa provocar reflexões.

A mim chamou a atenção a renúncia propriamente dita. Falo do ato de ‘coragem' ou de ‘covardia', dependendo do ‘entendimento' de cada cidadão, mas que, em síntese, trata-se de uma decisão solitária. Assim, ao final das contas, renunciar é ter clareza que junto vem o julgamento indiscriminado, que tem por base apenas o juízo de valor de cada um. Renunciar pode ser mais um montão de coisas, mas gosto em particular de uma frase do grande Fernando Pessoa: "A renúncia é a libertação, não querer é poder".

* Carlos Ferrari é presidente do CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social) e vice-presidente da Fenavape (Federação Nacional das Avapes).




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