O evento retoma um polêmico debate sobre a arte excluída da mídia. O espaço em rádios e TVs estaria reservado a artistas cujas gravadoras são capazes de pagar jabá (o jargão para a verba de divulgação).
Rádios comerciais consultadas pela reportagem do Diário negam a existência de cobrança para a execução de músicas em suas programações. Em Brasília, tramita um projeto de lei do deputado federal Fernando Ferro que trata da criminalização dessa prática.
A manifestação deste domingo é batizada de Grito dos Independentes e terá shows das bandas Laguna e Carlos Zoffo, Chapéu de Couro & Irmandade do Som. A abertura será com um breve discurso de Nasi. “É importante que haja oxigenação no meio musical e o jabá é uma das grandes chagas na questão do acesso a novos trabalhos”, afirma o cantor.
Falar dessa forma em público já gerou problemas para Nasi e seu grupo, o Ira!. “Já sofremos ameaça de sermos retirados da programação de algumas rádios, mas hoje a discussão está em outra dimensão. Acabou aquele gangsterismo entre rádios e artistas”, diz Nasi.
O assunto ainda é tratado com delicadeza, já que são poucas as informações precisas e quase inexiste documentação. A cobrança de verba de divulgação aconteceria de forma velada. Algumas emissoras receberiam valores de até R$ 30 mil para tocar uma música quatro vezes por dia durante um mês. A prática é mal vista, principalmente porque as rádios e TVs são concessões públicas.
Elaine Della Bella, programadora da rádio paulistana 89 FM, não confirma a cobrança de tais verbas. “Não tenho conhecimento”, diz. Elaine explica que o veículo no qual trabalha é “assumidamente comercial” e que por isso reserva pouco espaço aos músicos independentes. “A gente vive de sucesso. Nossos ouvintes dizem: ‘vou ouvir a 89 porque ela toca o que eu gosto’”, afirma Elaine.
Essa é outra questão do debate. As emissoras dizem que tocam sucessos e os artistas entendem que as rádios não dão opção ao público. “A rádio tem de dividir seu espaço e não ficar empurrando Linkin Park e congêneres goela abaixo”, diz Nasi.
Show e protesto – As bandas que tocam no Grito dos Independentes estão buscando espaço para os alternativos. “A reivindicação é por uma cultura democrática dentro da rádio e também por mais atenção do poder público”, afirma Fernando Machado, o Chapéu de Couro.
A escolha da cidade para realizar a manifestação não foi por acaso. “A coisa tem de acontecer no local da ferida, para curar a ferida. O investimento de São Caetano em cultura é zero”, diz.
A Prefeitura, por meio de sua assessoria de imprensa, informa que o orçamento de 2003 para essa área foi de R$ 7,3 milhões.
Com integrantes de diferentes cidades da região, a banda de nome quilométrico – Carlos Zoffo, Chapéu de Couro & Irmandade do Som – diz lançar um novo estilo musical: o MAB (Música Alternativa Brasileira). “É uma criação própria, irreverente, com liberdade de expressão geral. A base é o rock’n roll acrescido de xaxado, maracatu, forró”, afirma Machado.
Já a banda Laguna mostra um pop rock só com repertório próprio. Seu CD, Campos de Morango, foi produzido por Andreas Kisser, do Sepultura.
Os dois grupos venderão seus discos no show. O evento tem a participação de uniões de estudantes e da ONG Opção Brasil, com promoção da rádio Brasil 2000, que tem programação dedicada à diversidade musical.
Projeto de lei – A Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados deve votar ainda este ano o projeto de lei do deputado Fernando Ferro (PT-PE) sobre a criminalização do jabá. O texto diz: “esta lei visa proibir as pessoas jurídicas autorizadas, concessionárias ou permissionárias de serviços de radiodifusão e televisão, de receber dinheiro, ou qualquer outra vantagem, direta ou indireta, de gravadora, artista ou seu empresário, promotor de concertos, ou afins, para executar ou privilegiar a execução de determinada música”. Multa e detenção seriam as punições.
Na justificação, o deputado afirma que tais pagamentos existem de duas formas: “uma clandestina e outra declarada, inclusive com nota fiscal”. “A maneira oficial, chamada de ‘verba para divulgação’, funciona como parte integrante do material promocional dos discos”.
Depois de passar pelo atual estágio, o projeto segue para a Comissão de Constituição e Justiça, que verificará sua constitucionalidade. Em seguida irá a plenário na Câmara e, só então, chegará no Senado.
Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.