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Moradores de favela de Diadema acusam: foi chacina
Por Artur Rodrigues
Do Diário do Grande ABC
24/06/2005 | 08:17
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As manchas de sangue nas paredes de uma casa no Morro do Samba, em Diadema, representam provas de um caso de resistência a prisão seguida de morte, segundo a polícia. Para moradores da favela, a ocorrência desta quarta, que culminou em cinco mortes, tem outro nome: chacina. A Polícia Civil diz que as vítimas eram traficantes e que uma operação de caça ao tráfico foi recebida a bala. Quem mora no Morro do Samba alega que os rapazes foram executados em retaliação ao tiro que atingiu um investigador.

Os moradores concordam apenas num ponto com a polícia: o tiroteio realmente teria sido iniciado por traficantes. Mas a versão é outro no que diz respeito aos homens morto. Segundo a comunidade, os cinco não estariam envolvidos no conflito. Marcelo Nunes de Souza, 22 anos, Gabriel Araújo da Silva, 20, Felipe Siqueira Mota, 18, Tiago Carlos Batista Rodrigues, 17, e Renan Barbosa de Carvalho, 16, teriam se escondido em uma casa para fugir do tiroteio. “Aí a polícia chegou, pediu para a moradora sair da casa e matou os cinco, que estavam desarmados”, relata um homem, que garante ter visto tudo. O resultado da perícia técnica ainda não havia sido divulgado até a noite desta quinta.

Homens do Dise (Departamento de Investigações sobre Entorpecentes) teriam atacado a casa por duas frentes. Alguns arrombaram a porta e outros atingiram os supostos traficantes por cima do telhado, segundo testemunhas. Os furos de bala estão espalhados por toda a casa. Marcas de sangue revelam que um rapaz morreu escondido debaixo da cama.

O delegado seccional de Diadema, Sérgio Abdala, afirma que é “normal” que os moradores da favela “inventem” esse tipo de história. “Por mais desorganizado que seja aquele ambiente, é normal no ser humano defender os seus parentes”, filosofa. Abdala não explica porque não houve nenhum ferido entre os rapazes. “Quem atira para matar toma tiro para morrer”, comentou quarta-feira, reforçando que o tiroteio era uma reação ao ataque de bandidos.

Nenhum dos corpos permaneceu no local para análise da perícia técnica. Nem o único que teria falecido no local, segundo Abdala. Dois teriam morrido a caminho do pronto-socorro e outros dois, no hospital. Moradores alegam que todos saíram do Morro do Samba mortos. “Os ‘polícias‘ iam enrolando os corpos em cobertores e jogando no camburão”, contou uma vizinha.

A proprietária relata que os cinco rapazes invadiram a casa desarmados. “Eles pediram para ficar aqui para fugir do tiroteio. Nenhum deles parecia estar armado, mas eu também não revistei”, conta. A polícia apresentou como prova no inquérito três revólveres e uma pistola Walter PP 765. Também teriam sido apreendidos 21 papelotes de cocaína, 34 de crack e sete de maconha. Um álbum de fotos encontrado mostrava cenas de um dos suspeitos exibindo uma arma.

O único que não tinha histórico criminal, entre as vítimas, era Marcelo Nunes de Souza, 22. Felipe Siqueira Mota, 18, já havia sido preso por porte de drogas e receptação. Tiago Carlos Batista Rodrigues, 17, teria sido detido por tráfico de drogas e receptação de veículo roubado. Gabriel Araújo da Silva, 20, tinha passagens por roubo, rapto consensual e ato infracional. Renan Barbosa de Carvalho, 16, tinha passagem por furto. O único suspeito que sobreviveu não estava na casa. Luciano Oliveira da Fonseca, 24, teria se entregado à polícia. Ele era procurado por roubo, receptação e resistência a prisão.

A ação visava fechar um ponto-de-venda de drogas no Morro do Samba. Segundo o delegado Abdala, um trabalho feito há dois anos tem como objetivo eliminar o tráfico no local, apontado em reportagem do Diário de 12 de junho como um dos principais focos da venda ilegal de drogas na região. O investigador atingido no peito durante a ação desta quarta não corre risco de morte. A operação contou com 35 policiais.

Edvaldo Santos, da Comissão de Direitos Humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), afirmou que acompanhará o desenrolar do caso antes de tirar conclusões. A secretária da Defesa Social de Diadema, Regina Miki, não quis se pronunciar sobre o assunto. A assessoria de imprensa da cidade afirma que “o combate ao tráfico é uma das metas do Plano de Segurança Pública”. A cidade chegou a ficar 24 dias sem um homicídio. Os mortos desta quarta não entrarão nas contas da Prefeitura. Nas estatísticas, o caso constará como resistência a prisão seguida de morte. Segundo nota da Secretaria de Segurança Pública, nenhuma denúncia sobre o caso foi feita à Corregedoria da Polícia Civil.




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