“Preto, gordo, cafajeste e formado em ‘cornologia’”. Era dessa maneira sarcástica que o cantor Tim Maia (1942-1998) se autodefinia. Amigo íntimo do artista, o jornalista e produtor musical Nelson Motta documenta a trajetória do intérprete na biografia Vale Tudo: O Som e a Fúria de Tim Maia (Objetiva, 392 págs., R$ 40 em média), que chega às livrarias amanhã.

A obra reúne episódios saborosos que retratam a irreverência, o enorme talento e os excessos do ‘síndico’, morto em decorrência de uma infecção generalizada. Entre as passagens polêmicas do livro, estão os capítulos dedicados à juventude de Tim.

Motta relata as aventuras do músico nos Estados Unidos, no início dos anos 1960, antes de o cantor ser deportado para o Brasil, sob acusação de roubo de carro e porte de drogas.

Uma das curiosidades reveladas pelo autor é o fato de Tim ter conseguido embarcar graças à ajuda oferecida pela Arquidiocese do Rio de Janeiro. Na época, a Igreja conseguia descontos com uma agência de viagens para levar sacerdotes e paroquianos ao exterior.

ENCONTRO

O jornalista também conta as primeiras parcerias musicais de Tim – com Roberto e Erasmo Carlos – e o último encontro que o autor teve com o artista, em Nova York, no final de 1997.

“Estava muito feliz de reencontrá-lo tão alegre e bem-disposto. Achei até que estava um pouco mais magro – embora ainda imenso – do que em nosso último encontro no Rio. (...) Só consegui sair de lá horas depois de muita conversa e gargalhadas, entre várias rodadas de café completo, ovos mexidos e incessante carburação”, relembra Motta, em um dos trechos do livro.

AMIZADE

Segundo Motta, sua amizade com o cantor começou em 1969, quando ele produziu a canção These Are the Songs, gravada em dueto por Tim e Elis Regina. O desejo de escrever a biografia acompanha o jornalista há sete anos, mas conflitos entre familiares do artista atrasaram a autorização para a publicação da obra.

No livro Noites Tropicais (2000), Motta registrou alguns momentos de sua relação com Tim, marcada por históricos shows, gravações de discos e bate-papos descontraídos.

SITE

Para divulgar o lançamento de Vale Tudo: O Som e a Fúria de Tim Maia, a editora produziu um site com informações sobre o autor, galeria de fotos e quatro capítulos da biografia. Além disso, o internauta poderá ouvir, gratuitamente, músicas emblemáticas interpretadas pelo cantor, tais como Descobridor dos Sete Mares, Você e Azul da Cor do Mar.

O repertório comprova a versatilidade de Tim, que exibia a mesma técnica apurada ao cantar bossa nova, soul, funk e temas românticos.

Site: www.objetiva.com.br/valetudo

Trechos

“Animadíssimo, Tim estava com 55 anos e me parecia razoavelmente saudável – para os padrões Maia –, muito afetuoso e doidão como sempre. Me contou em detalhes sua epopéia de três cirurgias no saco e seu rompimento definitivo com o goró e a brizola”. (pág. 11).

“Todos gostavam de rock, e, quando aparecia um violão, era uma rara oportunidade para o mulato gordo e pobre dar o ar de sua graça. com sua sensacional batida de Long Tall Saly e seus gritos à Little Richard”. (pág. 26).

“Uma noite, levado por Arlênio, seu colega no curso supletivo da Escola Ultra, Roberto Carlos apareceu e foi apresentado a Tim. Era um moreninho magrelo de Cachoeiro do Itapemirim, de cabelos crespos e olhos tristes. Puxava um pouco de uma perna”. (pág. 29).

“Certamente por intervenção da providência divina, a Arquidiocese do Rio de Janeiro conseguiu da agência de viagens Camilo Khan grandes descontos para levar um grupo de sacerdotes e paroquianos aos Estados Unidos. Assim que foi informado, frei Cassiano chamou Tim, encorajou-o, e foi o primeiro a fazer uma doação para a viagem”. (pág. 40).