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Passado obscuro

Escritor de São Bernardo rodou o País para apurar sequestros feitos na ditadura militar

Por Miriam Gimenes
27/03/2019 | 07:14
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Divulgação


A ditadura militar foi instituída no Brasil há 55 anos – completos na segunda-feira. Durante pouco mais de duas décadas, o regime, de caráter autoritário e nacionalista, suprimiu a liberdade civil e deixou milhares de vítimas, entre elas crianças e adolescentes, que foram sequestrados, torturados e, até hoje, não sabem onde estão seus familiares. Todos filhos de militantes de esquerda ou de pessoas contrárias ao regime ditatorial.

E foi com o intuito de contar essas histórias que o jornalista e escritor de São Bernardo Eduardo Reina, que já fez parte da equipe do Diário, compôs o livro Cativeiro Sem Fim (Alameda/Instituto Vladimir Herzog, 310 páginas, R$ 54), que será lançado dia 2, às 19h, no Centro Universitário Maria Antônia (Rua Maria Antônia, 258/294), na USP.

Depois de duas décadas de pesquisa, que inicialmente resultaram na ficção O Crime da Rua Tutóia (2016), romance que abordava a história de bebês sequestrados por agentes da ditadura, Reina chegou a 19 histórias reais – 11 delas estão ligadas à Guerrilha do Araguaia, movimento em oposição ao regime que ocorreu na Amazônia, e o restante é do Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraná e Mato Grosso. “Rodei bastante pelo Brasil em busca dessas pessoas, parentes dessas vítimas, para fazer uma checagem das informações. Tudo que está publicado não é de ouvir falar, fui atrás, para cruzar dados”, ressalta o escritor, que, durante a apuração, rodou 20 mil quilômetros a fim de contar essas histórias.

Uma delas foi Iracema, sequestrada em Recife, Pernambuco. Ela foi descoberta pelo autor por conta de uma ação de mudança de nome que moveu na sua cidade natal. “A mãe dela era professora em Jaboatão dos Guararapes e foi presa porque era do PCB. Iracema foi com a mãe levada para o DOI-Codi e também foi torturada, aos 9 anos de idade.”

Os militares deixaram a menina largada em uma praça do Recife, sem a mãe, onde passou a noite e, no dia seguinte, foi ajudada por um casal. “Vizinhos desse de sua mãe a levaram para o Rio, onde, maior, casou e teve 11 filhos. Por conta da tortura perdeu a visão de um olho e tem problemas no ombro e no braço, mas é uma mulher muito forte. Já adulta voltou para o Recife para saber da mãe, por isso moveu a ação. Mas até hoje não sabe o paradeiro.”

Durante o depoimento, que durou mais de cinco horas, disse que Iracema revisitou o horror daquela época. “Estava um dia de muito calor. Tinha momentos que ela sentia frio, tremia, chorava. Realmente reviveu o sentimento que teve quando criança.”

E este é só um dos casos contados no livro. Tem também a de Juracy Bezerra de Oliveira, que, quando tinha 6 anos, foi retirado de sua família pelos militares por engano. Foi levado pelo tenente Antônio Essilio Azevedo Costa para Fortaleza e registrado como seu filho. Só com 20 anos conseguiu voltar para o Araguaia e procurar pela mãe. Detalhe: foi retirado por engano, por ter sido confundido com o filho de um guerrilheiro.

Durante o lançamento, na terça, será feito debate com o autor do livro, jornalista Caco Barcellos, responsável pelo prefácio da obra, e Eugênia Gonzaga, procuradora regional da República e presidente da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos.  




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