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‘JK’ segue bem no segundo dia
Por Mariana Trigo
Da TV Press
06/01/2006 | 08:54
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Tambores rufando. Juscelino Kubitschek se prepara para tomar posse como presidente da República em 31 de janeiro de 1956. No caminho, a multidão acena e uma generosa chuva de papel picado é focalizada do alto para mostrar o impacto da bem-cuidada direção de fotografia, assinada por Ricardo Gaglianone. Mas logo a cena, pincelada por nuances pálidas, dá lugar à vibração dos tons quentes do interior de Minas Gerais no início do século passado. Juscelino volta no tempo com suas recordações e começa a, literalmente, contar sua história bem no estilo “Era uma vez...”. A narração em off é de José Wilker, que vive JK na maturidade. O recurso, tantas vezes utilizado no cinema e na TV, chega a dar a sensação de déjà vu, mas, diante das pertinentes atuações do núcleo principal e da dinâmica direção de Dennis Carvalho, começa a trazer um colorido ufanista à infância do então pequeno Juscelino.

Uma das gratas surpresas deste início da trama de Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira – que teve a satisfatória audiência de 39 pontos, sete a mais que Mad Maria, na mesma época, em 2005 – foi a cuidadosa composição de Fábio Assunção no breve papel de João César, caixeiro viajante e pai de JK. Mais surpreendente ainda é a afinação do ator entoando uma canção no alto das pedras, à beira de um rio, uma paisagem típica do Norte de Minas. A delicadeza dessa e das outras cenas que contaram a trajetória da infância e adolescência de Juscelino tratou de seduzir os notívagos do horário, entremeadas por diálogos ágeis e cortes precisos. Sem muita “encheção de lingüiça”, como diria um mineiro.

A produção de arte mostra uma preocupação evidente em retratar, por meio dos quase despercebidos utensílios, a escassez de recursos da família Kubitschek de Oliveira, sabiamente encabeçada pela severa e amorosa Dona Júlia, de Júlia Lemmertz. Apesar de a trama mal mostrar o envelhecimento da personagem, que, ao longo de 20 anos, praticamente só prendeu os cabelos, a atriz, de tão à vontade com a personagem, tem transmitido docilidade e firmeza na medida certa. Nem o tom da trama, que muitas vezes alcança a tênue fronteira do didatismo, como em uma aula de História, consegue ofuscar a suavidade da atriz.

A quantidade de cenários preparados para a minissérie – 100 ao todo – pode ter sobrecarregado a cenografia de Mário Monteiro. Apesar da bela reconstituição de época, detalhes minuciosos, como um telhado bem novinho num sobrado do fim do século XIX, conseguiram passar despercebidos num primeiro capítulo. Nada que não se possa relevar diante do tempero das cenas calientes do Coronel Licurgo, de Luís Melo, com uma mucama. Nesse horário, seria pueril demais mostrar apenas lições ufanistas e deixar de lado as saliências e os pecados da carne, tão apreciados, principalmente por Juscelino – que a trama, por respeito à família do presidente, trata de uma forma bem superficial. Afinal, depois que Juscelino se casa com a determinada e geniosa Sarah Lemos, ainda se apaixona mais algumas vezes, o que não chega a abalar os alicerces daquela família mineira.

Outro ponto interessante da produção é o conjunto de passagens de época que camuflam cenas que poderiam ficar de fora por pecarem pelo exagero – caso do incêndio da casa das atrizes no período da gripe espanhola no primeiro capítulo. Mas a fartura de boas atuações, ressaltadas sobretudo no segundo capítulo, exibido quarta-feira (ibope de 41 pontos), compensa os deslizes da versão poética da trajetória do presidente bossa-nova.




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