Economia Titulo Entrevista
Movimento sindical em transformação
Por Vivian Costa
Do Diário do Grande ABC
16/02/2009 | 06:09
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O presidente da CNM/CUT (Confederação Nacional dos Metalúrgicos da Central Única dos Trabalhadores), Carlos Alberto Grana, recebeu o Diário para conversar e fez um panorama do atual momento vivido pela categoria que representa. Ele lembrou a importância do papel do sindicato nesse período e explicou porque algumas fornecedoras de autopeças estão em situação difícil, por exemplo, "já que muitas não conseguem créditos porque estão inadimplentes".

Talvez agora, mais do que nunca, Grana acredita que o movimento sindical mudou. "Os instrumentos que foram usados em determinadas situações não são mais eficazes". O dirigente também afirmou que a entidade luta por resultados e todos precisam atuar neste momento. Para ele, faz falta "uma participação mais efetiva dos governos estaduais" e é preciso que a sociedade pressione de forma organizada.

DIÁRIO - Qual a situação do setor neste momento?

CARLOS ALBERTO GRANA - Nos últimos cinco anos, o setor metalúrgico no Brasil só cresceu. Em 1989, nós éramos 2,7 milhões de metalúrgicos com carteira assinada no Brasil. Três anos depois, final do governo do Fernando Henrique, nós caímos para 1,4 milhão. De 2003 até setembro de 2008, crescemos permanentemente. Conseguimos recuperar cerca de 800 mil empregos no setor, algo que nem se esperava. Os especialistas diziam que a categoria iria diminuir porque a máquina substituiria o homem. Mas o que tivemos foi investimento. Apesar disso, sabíamos que dezembro é um mês de quedas de produção e muitas empresas tinham contrato apenas por um período determinado. Muitas não renovaram os contratos, então houve demissões. Todas as empresas que exportavam tiveram quedas. Ainda não temos os números de janeiro, mas, com certeza, devem ter acontecido menos contratações do que demissões. Então ainda devemos ter um saldo negativo.

DIÁRIO - No setor automotivo, quem ganha mais são as montadoras. Nesta crise, vimos que as autopeças fazem parte do elo mais fraco. Como lidar com isso?

GRANA - As montadoras lideram todas as cadeias. Se nas montadoras temos cerca de 110 mil trabalhadores, em toda a cadeia produtiva estimamos cerca 5 milhões de pessoas ligadas ao segmento. O setor é complexo e o problema está na ponta da cadeia onde estão as micro e pequenas empresas. São cerca de 2.000 a 3.000 empresas que contam de 10 a 50 funcionários. Elas fornecem o parafuso, por exemplo, o primeiro componente para estas sistemistas que copatrocinam os projetos de empresas como a Dana, Magneti Marelli, gigantes do setor. O problema está nestas pequenas que precisam fundamentalmente de crédito. Elas não têm financiamento, o que é ruim neste momento onde a diminuição de crédito e as taxas de juros são cruéis.

DIÁRIO - Elas são as que mais precisam e não conseguem. Como reverter a situação?

GRANA - Acho que algumas medidas importantes foram tomadas. Como a ampliação das linhas de crédito do BNDES, por exemplo. O problema é que estas empresas trabalham no limite, elas têm problemas na hora de conseguir um crédito porque o recolhimento do FGTS não está em dia, o INSS está atrasado. São inadimplentes.

DIÁRIO - Alguns sindicatos ligados à CUT fecharam acordos de redução de jornada de trabalho e de salário, desde que a empresa mostre suas contas. As empresas não merecem confiança?

GRANA - Temos algumas empresas, principalmente aqui na região, com um grau de confiança e credibilidade adquiridos ao longo dos anos. E sua situação é acompanhada mensalmente pela PLR (Participação nos Lucros e Resultados). Mas se olharmos para o Brasil isso é uma exceção. De qualquer forma, em um momento de crise, não podemos generalizar. A solução não é reduzir salário. Reduzir direitos. Nós temos convicção de que quanto menos renda, maior a crise. Somos contra os acordos propostos pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Mas isso não significa que, dada uma situação específica, uma empresa possa comprovar a sua situação e os trabalhadores aceitem um acordo. Não há nenhum problema. O que não pode é, no primeiro sintoma de queda do mercado, a saída seja a busca de redução de salário. Isso é inaceitável.

DIÁRIO - Qual a sua opinião sobre a ‘quarteirização'?

GRANA - É um desastre para os trabalhadores porque isso significa apostar na precarização. Se os terceiros ‘quarteirizam', a tendência é diminuir qualidade, salário, condições de trabalho e direitos. E a nossa luta é justamente para não terceirizar.

DIÁRIO - O senhor tem ideia de quantas empresas existem nesta situação?

GRANA - A terceirização foi uma febre nos anos 1990. Mas muitas empresas voltaram atrás porque estavam perdendo. Tinha redução de custo, mas perda de qualidade, controle e prazo de entrega. E para não perder clientes, voltaram atrás.

DIÁRIO - Qual deve ser a atuação do poder público e da sociedade civil?

GRANA - Todos estão sendo prejudicados por causa do desemprego, por causa da diminuição do consumo. Por isso, a gente tem que buscar mecanismos para diminuir os impactos gerados com a crise. O governo federal tem tomado algumas medidas, mas os estaduais têm que ser mais ativos. No quadro nacional, nós temos um esforço muito significativo no estado do Amazonas que deu isenção de ICMS em alguns setores e de IPVA para motos, em dezembro. O (governador) José Serra divulgou medidas na última quinta-feira, o que é um absurdo. E olha que São Paulo concentra maior renda e o maior PIB - representa 45% nacional. Se São Paulo se posicionar, e se encarrega de puxar este movimento de retomada, haverá outras medidas semelhantes. Enquanto isso, a sociedade tem que pressionar de forma organizada.

DIÁRIO - Mesmo com a crise o movimento sindical mudou?

GRANA - A mudança é permanente. Os instrumentos que foram usados em determinadas situações no passado não são mais eficazes nos dias de hoje. Atualmente há diálogo. As empresas viram que é mais lucrativo negociar. Elas viram que tinham que conversar, porque, com a paralisação, havia prejuízo maior. Há mais negociação, mas isso não quer dizer que há mais acordo. Por isso, ainda há greve.

DIÁRIO - Toda categoria tem sindicato, mas nem todos são representativos?

GRANA - Mas isso acontece no mundo todo. A nossa categoria é mais forte por causa do valor agregado do automóvel. Aqui no Grande ABC é histórico por causa das grandes montadoras.

DIÁRIO - O sindicalismo da CMN/CUT é de resultados?

GRANA - Sim. Todos os sindicatos trabalham por resultados. Temos que agregar, buscar direitos. Mas há um diferencial, com ética e sempre em prol dos trabalhadores, principalmente quando os direitos estão ameaçados. É preciso se mobilizar, mas com democracia. O nosso sindicato pode ser contra uma medida. Mas se os trabalhadores aprovarem, a gente acata. O nosso papel é orientar, delegar, opinar sempre com democracia. No Brasil temos cerca de 20 mil sindicatos, mas muitos que não servem para nada. Mas a culpa é do modelo adotado. Agora, com a legalização das centrais sindicais, o trabalhador vai poder recorrer a elas, até para reclamar do sindicato de sua categoria. Acho que as coisas podem melhorar.




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