Política Titulo Ribeirão Pires
‘A antiga gestão era muito incoerente’
Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
10/07/2017 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


 Os seis primeiros meses de gestão de Adler Kiko Teixeira (PSB) em Ribeirão Pires não foram nada fáceis. O socialista, que fez história na eleição ao vencer pleitos em duas cidades diferentes – foi prefeito de Rio Grande da Serra –, admite que gastou a maior parte do tempo para entender como era o jeito de Saulo Benevides (PMDB), seu antecessor, de governar. “A falta de coerência administrativa é muito mais evidente do que foi em Rio Grande da Serra em 2005.”

Em entrevista ao Diário, Kiko cita os principais percalços administrativos, como máquina pública inchada de servidores, dívidas ascendentes, arrecadação decrescente e orçamentos superestimados. Mas fala, principalmente, talvez do maior problema: o risco iminente de perder o título de estância turística, que confere a Ribeirão recursos anuais oriundos do governo do Estado.

“Os recursos foram mal geridos ao longo desses anos. (Foram tão mal geridas as verbas) A ponto de se fazer um projeto megalomaníaco, como foi o teleférico. Foi uma verdadeira loucura, um verdadeiro devaneio das pessoas que estavam aqui”, analisa o socialista, que diz não se preocupar com o embate jurídico que ainda envolve sua candidatura. “Cada um carrega sua cruz nesta vida, e essa tem sido a minha cruz.”

 

O sr. completa seis meses de gestão em Ribeirão, citando problemas na Prefeitura. Qual situação está pior? A de agora ou a de 2005, quando o sr. se tornou prefeito de Rio Grande?

São situações distintas. Rio Grande tem orçamento bem limitado, um poder de recuperação bem menor do que Ribeirão Pires que, até há uns anos atrás, era economicamente saudável e com poder de recuperação muito grande. Pegamos situação difícil em Rio Grande, mas não tão desorganizada como encontrei Ribeirão. A falta de coerência administrativa é muito mais evidente do que foi em Rio Grande da Serra. Graças a Deus oferecemos respostas satisfatórias para a população em Rio Grande. Acredito que aqui não será diferente. O que me incomoda é a dificuldade que encontramos neste primeiro semestre para entender o que era essa forma de administrar completamente incoerente, não se era respeitada regra mínima da boa administração pública. Uma cidade com 120 mil habitantes e com 3.700 funcionários de carreira. Hoje, Ribeirão tem uma máquina pesada e, até mesmo pela quantidade de funcionários, oferece salários pequenos, que não contentam os servidores.

 

O ex-prefeito Saulo Benevides (PMDB) citou diversas vezes a dificuldade financeira do Paço no fim de seu governo. Como o sr. encontrou a Prefeitura financeiramente?

Ele (Saulo) superestimava a arrecadação, que não acontecia. Quem tem pouco de noção de administração pública sabe que era proposital, para ter margem de remanejamento sem depender do Legislativo. Em vez de tentar reduzir no próximo orçamento a previsão orçamentária, ela crescia mais. Ao longo dos quatro anos vimos que a incoerência entre o previsto e o arrecadado acontecia e, em nenhum momento, pensava em se corrigir. Isso gerou grande deficit. Se fazia despesas imaginando essa arrecadação fantasiosa do orçamento. A dívida do município, em quatro anos, ficou em R$ 155 milhões, só de restos a pagar.

 

O que já foi feito para tentar estancar essa sangria?

Cobramos dos secretários contingenciamento das Pastas de 25% para tentar adaptar a arrecadação à realidade. Em 2016, a Prefeitura, no primeiro semestre, gastou R$ 134 milhões e nós gastamos R$ 112 milhões, redução de 16%. Estamos perseguindo a meta de 25%. Arrecadamos R$ 126 milhões e eles arrecadaram R$ 129 milhões, sendo que R$ 4,9 milhões foram de venda de imóveis da Prefeitura. Eles dilapidaram o patrimônio público, uma gestão irresponsável. Racionalizamos as despesas, focamos os serviços essenciais, como iluminação pública, coleta de lixo e compra de medicamentos, e regularizamos os convênios com as entidades. Havia recursos do governo federal para entidades que eles usavam para outras despesas, o que é um absurdo.

 

O sr. calcula o tamanho do risco de Ribeirão perder o título de estância turística?

A luta para que Ribeirão continue como estância não é só minha ou do povo de Ribeirão, é de todo o Grande ABC, porque é a única estância turística da região. Dentro dos municípios, essa posição nem se daria para outra por força de lei. É um título da região. Não estamos medindo esforços para continuar com esse título. Usaremos as verbas do Dade (Departamento de Apoio às Estâncias), assim que pudermos regularizar nossa situação, para projetos viáveis, factíveis. Em cima desses projetos trazer mais pessoas para Ribeirão Pires e também um processo de organização. Demos andamento para se fazer o Plano Municipal de Turismo. E não perdemos em nenhum momento a oportunidade, ainda que em um formato menor, de pegar todas essas coisas que existem em Ribeirão e continuar. Tivemos a Festa do Pilar, em formato menor, ao encontro às características da festa, que é religiosa, que havia se perdido a tradição. Não foi diferente da Festa de Santo Antônio, resgatamos o desfile cívico. É forma de resgatar a autoestima da população. Ribeirão Pires tem templo da Igreja Messiânica, que é o Luz do Oriente, um lugar belíssimo, também atrativo turístico. Vamos fazer o Festival do Chocolate, menor, mas com a tradição. Apresentei o projeto do bulevar gastronômico.

 

Qual sua análise sobre toda polêmica que cerca o teleférico?

Estamos em uma disputa, um trabalho intenso jurídico e de articulação política para que não percamos o título de estância e possamos recuperar os recursos perdidos e os recursos mal geridos ao longo desses anos. (Foram tão mal geridas as verbas) A ponto de se fazer um projeto megalomaníaco, como foi o teleférico, obra de mais de R$ 20 milhões e que de recursos certo não havia nada. Era recurso empenhado do Dade de muitos anos, em uma obra que não tinha licença da CPTM, da Cetesb, da AES Eletropaulo. Mesmo com todas essas dificuldades foram feitos pagamentos para início da obra e para o equipamento físico do teleférico (bondinhos). Foi uma verdadeira loucura, um verdadeiro devaneio das pessoas que estavam aqui.

 

É dinheiro que se perde?

O dinheiro propriamente dito existiu uma parte, até o governo do Estado perceber que era inviável e parar com esses investimento. No governo federal era uma promessa. Nunca veio um centavo. A obra foi iniciada contando com dinheiro do governo federal. Uma obra que foi feita sem qualquer estudo do custo de manutenção deste equipamento. As pessoas que estavam aqui não conseguiram prestar contas do serviço que era feito e se perderam os repasses de 2015 e 2016. Os repasses de 2013 e de 2014 começaram e pararam porque o governo do Estado percebeu. Perante ao governo do Estado, temos de devolver dinheiro para a conta do Dade para poder salvar o convênio com outro objeto. Essa é a alternativa para tentar salvar um desses recursos.

 

A Prefeitura firmou o convênio com o São Cristóvão na semana passada. O que o morador pode esperar de melhoria da qualidade do serviço de Saúde com essa parceria?

Foi parceria muito feliz. Nasceu primeiramente em cima de um diagnóstico e depois de uma gestão que tivemos de aproximação com o São Cristóvão Saúde. Quando tive oportunidade de visitar as UBSs, UPA Santa Luzia e o Hospital e Maternidade São Lucas, percebi uma coisa extremamente triste: na UPA tinha diversos pacientes em observação nos corredores, de uma forma completamente precária. A UPA é lugar de urgência e emergência. Os casos mais complexos têm de ser transferidos para os hospitais regionais. Os casos em observação estavam acumulados em um lugar que nem infraestrutura para isso tem. Depois fui ao Hospital e Maternidade São Lucas. Vi diversos leitos vazios, a maternidade funcionando em uma capacidade extremamente reduzida. A mãe tinha de dar à luz de quarta-feira, o único dia que tinha as equipes médica e de enfermagem que dariam condições. Sabíamos que o São Cristóvão prestava trabalho filantrópico pelo SUS. Mas é uma competição violenta porque todo mundo quer uma parceria dessas. Tivemos contato com a direção do São Cristóvão, que pediu que apresentássemos um projeto. E tivemos a felicidade de sermos escolhidos. Eles nos ajudaram na estrutura física, vão oferecer corpo médico por três anos e também desenvolver diversas atividades lá, com investimento de R$ 6 milhões ao ano. Mas o município tem uma tarefa, que não é fácil, de garantir os insumos. Porque eles tiram os projetos daqui e os levam para outras cidades. O hospital agora está bonito, as coisas estão funcionando. A maternidade começa agora, com parto humanizado, um diferencial. Nos hospital temos 51 leitos e, com ajuda deles, melhoramos. Paulatinamente vamos tirar as pessoas da UPA. E o terceiro passo será oferecer pequenas cirurgias, com de hérnia. Há também um adicional: as pessoas de Ribeirão Pires com diagnóstico de câncer de mama farão a cirurgia no Hospital São Cristóvão com reconstrução mamária. Tudo para o segundo semestre. Sem limites de pacientes.

 

Oposição ainda insiste na questão jurídica. Isso atrapalha seu governo?

 

Falo francamente. Isso não me abala em nenhum momento. Cada um carrega sua cruz nesta vida, e essa tem sido a minha cruz. Desde 2004, quando fui prefeito em Rio Grande, sempre falam isso. Em 2008 fui o prefeito reeleito com maior votação proporcional no Grande ABC. Em 2014 fui candidato a deputado federal com todos dizendo que meus votos não seriam computados, inclusive adversários meus, alguns que tiveram zero voto. Tive 31.720, fui diplomado segundo suplente do meu partido na ocasião (o PSC). Tenho convicção prática, física e também espiritual. Estamos aqui de passagem. Ninguém sabe quando será nosso fim. A vida é efêmera. O poder, que é uma fração da vida, é mais efêmero ainda. Quando estivermos investido de um cargo, temos de dar o máximo. Acredito que essa possibilidade (de cassação) é extremamente remota.




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