Economia Titulo Automóveis
Veículos têm déficit de US$ 2,5 bilhões

Queda de 41,5% em vendas externas e aumento de importações levam a balanço negativo no setor automotivo

Por Wagner Oliveira
Do Diário do Grande ABC
10/11/2009 | 07:00
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O Brasil acumula até outubro déficit de US$ 2,5 bilhões na balança de todo o setor automotivo - que inclui carros, implementos, autopeças, e caminhões, entre outros itens. O revés não acontecia desde 1998, quando o País fechou com saldo negativo de US$ 526 milhões na cadeia.

A queda é mais forte em veículos montados, com saldo negativo até outubro de US$ 1,6 bilhão. Nos dez primeiros meses do ano, só a exportação de carros desabou 41,5% se comparado ao mesmo período de 2008 - passou de 490 mil para 286 mil unidades.

Em ritmo contrário, as exportações só crescem. Em 2007, 11,3% dos carros emplacados no País eram importados. No ano passado, tiveram 13,3% de participação. Neste ano, devem somar 15% num mercado previsto para ter o recorde histórico de vendas, acima de 3 milhões de unidades. Assim, poderá contabilizar mais de 450 mil unidades importadas até o fim do ano.

Em valores, as exportações despencaram 47,2%. Entre janeiro e outubro deste ano, somaram US$ 6,385 bilhões. No mesmo período do ano passado, o saldo estava em US$ 12,084 bilhões.

Não fosse a recuperação do mercado doméstico, que deve crescer 6,1% neste ano, a situação seria bem pior para os fabricantes, já que parte das exportações foram absorvidas internamente. Com a queda das vendas externas, a produção também declinou, entre janeiro e outubro, 7,9% - mesmo percentual que deve encerrar o ano.

O presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), Jackson Schneider, afirmou que a recuperação passa pela retomada dos mercados nos quais o Brasil concentrava suas exportações, como a Argentina, que representa 40% das vendas externas do setor. O mercado argentino caiu quase 50% em razão da crise, afetando duramente o Brasil.

Em outubro, os números de veículos exportados melhorou em relação a setembro, saindo de 30.785 unidades para 37.781, crescimento de 22,7%.

Para Schneider, entretanto, nada indica que haverá reversão do quadro até o fim do ano. De acordo com ele, compradores tradicionais dos produtos brasileiros só devem se recuperar a partir do segundo trimestre do ano que vem. O executivo disse ainda que os fabricantes brasileiros terão dificuldades para retomar o nível de vendas anterior ao da crise. "Na volta desses mercados, teremos competição muito mais acirrada com fabricantes de outros países. Além disso, temos um real valorizado e somos penalizados por conjuntura interna negativa, como excessiva carga tributária, alto custo de logística e infraestrutura."

Detentor do quinto maior mercado do mundo, o Brasil atrai interesse dos importadores. "Isto é preocupante porque alguns países incentivam as exportações", disse Schneider. "Não dá para saber a composição de preço de todos os fabricantes. Pode haver distorções, como incentivos que não conseguimos identificar, que podem ser prejudiciais à competição."

Por ser um dos poucos países que não sofreram drasticamente com a crise mundial, o Brasil é visto como grande mercado por todos as grandes montadoras. O País passou a ser estratégico nos planos dos maiores fabricantes de veículos do planeta.

De acordo com Schneider, a crise deixou a indústria mundial com capacidade ociosa de 20 milhões de veículos. A Anfavea estima ociosidade de 800 mil unidades no Brasil, já que a indústria teria atualmente capacidade para produzir 4 milhões de veículos ao ano.

Ford sinaliza para possível redução de intensidade da crise

Uma receita já adotada pelo Brasil no início desta década, de cortar custos e desenvolver produtos que caem nas graças dos consumidores ajudou a Ford Motors a provar que é possível ganhar dinheiro num mercado em crise. A montadora foi a única entre as grandes companhias do ramo a obter lucro no terceiro trimestre. Ao anunciar ganhos de quase US$ 1 bilhão nas operações globais no período, a Ford dá sinal ao mundo de que a tempestade que se abateu sobre o mercado americano pode estar diminuindo de intensidade.

No fim da década de 1990, a Ford do Brasil quase fechou, mas conseguiu reviravolta ao adotar plano de redução drástica de custos. Nos anos seguintes, inaugurou a mais moderna fábrica do grupo em Camaçari (BA) e criou um veículo que até hoje tira o sono dos concorrentes, o EcoSport. O modelo inaugurou novo segmento no mercado brasileiro: o de utilitários-esportivos de pequeno porte. A empresa renovou outros produtos e é lucrativa há mais de cinco anos.

A fábrica de Camaçari e o EcoSport foram "o divisor de águas" entre a Ford que quase faliu e a que está melhor que a matriz há vários anos, diz o consultor José Roberto Ferro, do Lean Institute. Segundo ele, conceitos adotados no País foram levados à matriz, como o processo integrado de produção, com fornecedores dentro da linha de montagem.

"A Ford dos Estados Unidos passou por processo de reestruturação semelhante ao do Brasil", confirma o diretor da Ford Brasil, Rogelio Golfarb. Além de mudanças no processo de manufatura, no relacionamento com a rede de distribuição e lançamento de produtos atraentes, a matriz contou com a astúcia de executivos que se anteciparam à pior crise que o setor automotivo americano assistiu em mais de 30 anos.

Pouco antes de o setor financeiro desabar, provocando efeito dominó no resto da economia, a Ford fez captação de US$ 23,6 bilhões, na época visto como ato de desespero. Mas o montante evitou que a companhia recorresse à ajuda governamental, como fizeram as concorrentes General Motors e Chrysler, que passaram por processo de concordata.

Para Bernd Gottschalk, ex-presidente da Oica (Organização Internacional dos Construtores de Automóveis) e hoje na empresa alemã de investimentos Macquarie, ao recusar ajuda do governo, o presidente da Ford, Allan Mulally, passou a ser visto como uma liderança forte. "Os americanos adoram líderes." A percepção desfavorável em relação à GM e à Chrysler certamente reverteu-se em vendas para a Ford.

"Foi um pequeno milagre o que a Ford conseguiu", compara Gottschalk, que cita ainda a disponibilidade da montadora em oferecer carros pequenos e de baixo consumo, modelos que hoje atraem muitos consumidores americanos. (Da AE)




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