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Despoluição da Billings requer vontade política

Especialistas criticam falta de planejamento de governos na limpeza e preservação do manancial

Por Daniel Macário
11/03/2018 | 07:00
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André Henriques


 Erradicar a poluição da Represa Billings não é tarefa impossível. Embora o projeto esteja na pauta de governantes há pelo menos 30 anos, período em que pouco foi feito para reverter o cenário de degradação imposto ao manancial – que banha Santo André, São Bernardo, Diadema, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, além da Zona Sul da Capital –, especialistas são unânimes ao frisar a viabilidade de se recuperar a qualidade ambiental do reservatório. Segundo eles, a medida depende apenas de vontade política.

Mesmo com todos os problemas de despejo de esgoto por ocupações irregulares instaladas às margens do manancial, que completará 93 anos no dia 27, ambientalistas dizem acreditar na recuperação do corpo hídrico a partir da concretização de ações já discutidas, dentre elas a remoção de famílias da área de preservação ambiental e a criação de estação de tratamento de água na região da Pedreira, Zona Sul da Capital – a ação seria responsável pela contenção de carga despejada pelo Rio Pinheiros no manancial a partir de reversão em época de chuva.

Para que haja melhorias, os especialistas cobram empenho de governantes. “Muitos acham que a despoluição da Billings é impossível, mas não é. Se políticos pararem de bater cabeça e decidirem empenhar esforços no projeto, com certeza poderemos executar a limpeza do manancial. A questão é ter vontade política”, afirma a bióloga especialista em recursos hídricos e professora da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), Marta Ângela Marcondes.

Há exatas três décadas, foi justamente a falta de vontade política que fez projeto de despoluição do manancial ser descartado pelo governo estadual. À época, em entrevista ao Diário, o então secretário de Obras do Estado, João Oswaldo Leiva, declarou ser impossível qualquer tentativa de limpeza da Billings. O argumento: “Não há projeto para se utilizar futuramente a represa para abastecimento de água à população”.

“Não podemos deixar que a despoluição fique na promessa. Muda gestão, mas os problemas continuam. É preciso que prefeitos e governador conversem e tirem do papel as boas ideias. Não podemos deixar a situação da Billings piorar”, afirma o professor Rogério Aparecido Machado, especialista em meio ambiente da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Sem políticas efetivas voltadas ao controle e remoção de ocupações irregulares, estudos apontam que em dez anos a qualidade da água do manancial estará totalmente comprometida. Mostra preliminar de pesquisa que vem sendo elaborada pela USCS desde 2015 aponta que metade da população que vive no entorno do manancial sofre com doenças gastrointestinais e 40% têm problemas de pele.

Diário faz série de reportagens sobre riscos da poluição no corpo hídrico
Série de reportagens publicadas pelo Diário sobre os efeitos do desmatamento e da ocupação irregular no entorno da Represa Billings, em setembro de 2017, alerta sobre os efeitos do despejo irregular de esgoto no manancial.

Sobrevoo feito pela equipe de reportagem a bordo de helicóptero Bell 206 Jet Ranger mostrou que o tradicional azul-escuro da Billings, responsável pelo abastecimento de 1,6 milhão de pessoas na região, se limitava ao braço Rio Grande, separado por barragem artificial do corpo central do manancial, onde a água ganha tom esverdeado. A cor se deve a fenômeno conhecido como eutrofização, quando algas surgem a partir do excesso de esgoto descartado. 

Sem fiscalização do poder público, o avanço de ocupações irregulares às margens do manancial também foi constatado no sobrevoo por municípios do Grande ABC.

Sabesp diz investir em ações de coleta e tratamento de esgoto da bacia
A Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), por meio de nota, disse investir regularmente na coleta, afastamento e tratamento de esgoto na bacia da Represa Billings. Desde 2011, foram instaladas tubulações de grande porte e estações de bombeamento para tratamento de esgoto em bairros como Riacho Grande, Tupã, Vila Pelé, Capelinha, Tozzi e Estoril. Também foram autorizadas, em dezembro de 2017, obras de esgotamento sanitário do Programa Pró-Billings na região do Alvarenga, em São Bernardo.

O trabalho, com investimento de R$ 89,4 milhões, prevê a construção de 34 estações elevatórias para bombeamento de esgoto, o assentamento de 51 quilômetros de redes coletoras, 9,5 quilômetros de coletores-tronco e 8.000 ligações domiciliares. A obra permitirá que todo o esgoto coletado seja levado para a ETE (Estação de Tratamento de Esgoto) ABC.

Moradores dão exemplo ao realizar mutirão de limpeza no manancial
Com objetivo de diminuir impactos ambientais enfrentados pela própria comunidade, moradores do bairro Royal Park, em São Bernardo, têm sido exemplos para famílias que vivem às margens da Represa Billings. Desde o início do ano, grupo tem executado mutirões de limpeza do manancial, responsável pelo fim da crise hídrica enfrentada pelo Estado nos últimos anos.

“Na verdade só temos cumprido nosso papel como cidadãos. Se formos depender só dos governantes a situação ficará crítica. Nada mais justo do que preservarmos algo que é nosso e que nos dá vida, acima de tudo”, destaca o presidente da associação de moradores do bairro, Cyrillo Pelosini, Keke Andrade, 34 anos. Em ato feito no mês passado, foram retirados cerca de 200 sacos de lixo com entulhos do corpo hídrico. Outra ação está prevista para ocorrer hoje.




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