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Região tem mais empregos, mas salários são menores

Média salarial de demitidos é maior do que a dos admitidos formalmente no Grande ABC em 2019

Por Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
02/02/2020 | 07:00
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EBC


Se por um lado o Grande ABC celebra o fato de ter fechado 2019 com saldo positivo no volume de empregos formais – 4.803 vagas –, por outro, viu cair a massa salarial de trabalhadores com carteira no ano passado. Em 2019, o salário médio dos demitidos (R$ 2.077,02) na região superou a remuneração média dos contratados (R$ 1.724,92). A diferença média é de R$ 352,21 entre as duas categorias. Ou seja, o Grande ABC eliminou postos de atuação de remuneração mais alta – predominante na área industrial – e tem substituído esse contingente por emprego de vencimentos de menor valor – como comércio e serviços. Esse panorama não leva em consideração o volume de empregados informais.

O levantamento foi feito com base nos números da Rais (Relação Anual de Informações Sociais) e do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) do Ministério da Economia pelo coordenador de estudos do observatório econômico da Universidade Metodista de São Paulo, professor Sandro Maskio, a pedido do Diário.

De acordo com o estudo, o cenário foi determinante para a redução da massa salarial do Grande ABC: queda de R$ 1,4 bilhão em 2018 para R$ 1,3 bilhão em 2019, ou seja, cerca de R$ 100 milhões a menos em circulação na economia regional. Além disso, considerando somente o salário médio do trabalhador com carteira assinada, houve retração de R$ 2.921,91 para R$ 2.727,79, ou seja, R$ 194,12 a menos.

Segundo Maskio, apesar de acontecer um movimento natural do mercado de trabalho, de demitir trabalhadores que possuam maiores salários e contratar pessoas em cargos que paguem menos, as contratações no setor de serviços influenciaram nos números. Em 2019, o saldo – diferença entre admitidos e demitidos – de vagas de empregos do Grande ABC chegou a 4.803. Somente o setor de serviços foi responsável por criar 7.962 postos. Enquanto isso, a indústria foi o único dos quatro principais setores a fechar no negativo, com a demissão de 4.924 pessoas.

“É algo que influencia (na redução e diferença dos salários) porque a região está gerando emprego em um setor no qual o salário médio é menor. Na média, o setor de serviços gera um valor adicionado menor do que a indústria. Ou seja, as contratações estão acontecendo e a situação seria pior se não estivéssemos com saldo positivo, mas o grande problema está nos segmentos. Estamos gerando emprego, mas a capacidade do valor adicionado está sendo reduzida”, analisou o especialista.

O economista e coordenador do curso de administração do Instituto Mauá de Tecnologia, Ricardo Balistiero também citou o fechamento da fábrica da Ford, em São Bernardo, cuja produção foi encerrada em novembro e que no início do ano passado empregava uma média de 2.800 pessoas. Para ele, o encerramento da atuação da montadora norte-americana em solo regional impactou na massa de renda de 2019. “É muito difícil para pessoa que perde o emprego recuperar uma vaga no mercado formal”, afirmou. “O trabalhador sai de um emprego formal, trabalhando na indústria com diversos benefícios e vai se empregar naquilo que é possível. Isso vai acontecer no mercado informal ou no formal, mas ganhando menos.”

Maskio argumentou que, além de corroer o orçamento do trabalhador, a retração na massa salarial traz diversos efeitos em cadeia na economia regional. “Quando se tem uma queda de massa de renda na economia, você vai ter pessoas consumindo menos. Então, o comércio é o primeiro que vai acabar sentindo porque as famílias vão comprar menos roupas e ir menos a restaurantes, por exemplo. Depois disso, a tendência é tirar os filhos de escolas particulares e saírem do plano de saúde. Se o volume que elas ganham é menor, elas gastam menos”, avisou, completando que se perde o efeito multiplicador de renda, que acontece quando os salários aumentam. “Temos menos volume de consumo e logo setores que dependem desta renda vão apresentar queda de faturamento. Ou seja, pode não demorar muito para registrarmos uma queda nos números de emprego.”

Com queda de vagas de trabalho, indústria possui a maior diferença
Entre os principais setores da economia, a maior diferença salarial foi observada entre os demitidos e contratados pela indústria da transformação. Enquanto quem era contratado em 2019 ganhava média de R$ 2.048,97, quem era desligado recebia R$ 2.902,85, diferença de R$ 853,88. De acordo com os dados do Ministério da Economia, levantados pelo coordenador de estudos do observatório econômico da Universidade Metodista de São Paulo, professor Sandro Maskio, é possível ver que, entre os demitidos, o maior salário está no setor industrial. Enquanto o trabalhador de agropecuária ganhava R$ 1.390,17, na média, o operário recebia mais que o dobro: R$ 2.902,85.

Já entre os admitidos, é possível verificar que os serviços industriais de utilidade pública já pagam mais (R$ 2,398 de salário médio). Porém, é importante destacar que esse não é o setor de serviços de baixo valor agregado, que foi o que mais gerou contratações em 2019 e paga uma média de R$ 1.658,61. Para Maskio, a indústria sofreu diversos efeitos negativos no ano passado. Além do fechamento da Ford, a crise na Argentina impactou fortemente as exportações das fábricas da região, principalmente pelo fato de o país ser o principal parceiro comercial da indústria automotiva.

“Comparando a economia da região com a do País, nós sentimos mais a questão da indústria por causa do peso que ela possui no Grande ABC. O setor passa por um problema estrutural no Brasil, então a gente sofre mais. Também há um efeito da rotatividade no mercado de trabalho”, disse. Segundo ele, é necessário o desenvolvimento de uma política para o setor, mas que seja de longo prazo. “Porém isso deve acontecer em nível nacional e pelo próprio governo do Estado. Não dá para ter a ilusão de que só um município vai conseguir resolver isso”, afirmou.

O economista e coordenador do curso de administração do Instituto Mauá de Tecnologia, Ricardo Balistiero, pontua que essa questão deve ser discutida via Consórcio Intermunicipal. “Seria interessante que pudéssemos discutir com mais força como a gente consegue reverter isso. Um local que sempre foi o berço da indústria, rico se comparado com outras localidades do País, não pode se conformar com a saída de uma empresa do tamanho da Ford sem que haja uma recomposição à altura do que aquilo que nós perdemos. Há a necessidade de iniciar uma discussão muito séria para que a região continue a ser fundamental para o desenvolvimento do País”, solicitou.




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