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Avenida Lauro Gomes vira cracolândia

Barracos são construídos nas calçadas de uma das principais vias de acesso a Santo André

Por Rafael Ribeiro
do Diário do Grande ABC
30/09/2012 | 07:00
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As calçadas da Avenida Lauro Gomes, na Vila Sacadura Cabral, na divisa de Santo André com São Bernardo, estão se transformando em favela. Erguidos com tábuas, placas de candidatos à eleição e lonas, os cercas de 30 barracos abrigam número superior a 70 pessoas e escancaram cenário de miséria onde se misturam moradores de rua e viciados em drogas em uma das principais vias de acesso à cidade.

O número de barracos cresce a cada semana. Diariamente aparecem pessoas para ocupar espaço nas precárias moradias, segundo os próprios habitantes. "É até bom ter muita gente. Num frio desses, a gente vai se encostando e se aquecendo", disse um deles, que se identificou apenas como Alexandre, 30 anos.

Há dois meses na via, ele largou mulher e dois filhos após se tornar dependente de crack. Hoje se diz curado, mas como fatura R$ 30 por dia coletando materiais recicláveis, sabe que não tem estrutura para recuperar a vida que tinha antes. "Aluguel custa R$ 500 por mês. Como vou pagar? Estamos aqui por não ter opção. Ninguém confia na gente o suficiente para dar uma chance."

Alexandre sabe o que fala. Apesar de recuperado, divide espaço com os muitos viciados em crack que consomem a droga no local. Tem de conviver com a perseguição das autoridades, destruição constante dos barracos e o preconceito de quem passa por ali. "Por causa de alguns, todos acabam pagando."

Jobias Pereira dos Santos, 27, entende. Ex-traficante, tentou matar o próprio pai, que ele diz ser candidato a vereador em São Bernardo, e foi expulso de casa, no Parque Los Angeles. Hoje evangélico, tenta recuperar os vizinhos com pregação, apesar de ceder sua casa para que eles possam fumar à vontade. "É doença, não tenho o que fazer. A droga não deixa eles pensarem. Depois que passa a noia, eu prego a palavra, tento conversar. Mas não adianta muito", disse.

O preço pago por Santos é alto. Ele é perseguido pelos traficantes, alvo de pedradas e ameaças. Teve seu barraco queimado com todos os pertences, incluindo o violão, furtado do irmão mais velho, e a Bíblia, que diz custar R$ 150, um dia antes de a equipe do Diário visitá-lo.

O que atrai as pessoas ao local é justamente a facilidade de consumir a droga. Acomodados dentro das barracas, não fumam em público. E assim podem disfarçar o vício antes da degradação. Jovem identificada como Amanda, 27, mora em prédio de classe média no bairro Rudge Ramos, em São Bernardo. Há três meses conheceu a namorada. E usa crack mais de dez vezes por dia. Com roupas limpas, consegue mentir ao pai, com quem mora, dizendo estar no trabalho. "Mas não consigo dormir com vontade de fumar, então venho para cá."

Cristiane (nome fictício) perdeu a guerra. Arquiteta, gastava o que ganhava com a droga. Foi expulsa da luxuosa casa no Parque dos Pássaros pelo marido, há dois meses. Desde então, perdeu dentes e dignidade. "Todo mundo me acusa, mas ninguém me ajuda. E admito que preciso." 

Prefeitura promete ações imediatas no local

A Prefeitura de Santo André informou que está ciente do problema na Avenida Lauro Gomes e que estuda ‘atitudes cabíveis' por meio das secretarias de Gabinete, Segurança, Habitação e Inclusão Social. Uma das medidas será a intensificação do diálogo entre a Secretaria de Segurança e os órgãos estaduais, principalmente a Polícia Militar, para que sejam tomadas ações pertinentes no combate ao tráfico de drogas.

Definida como problemática, a região da Vila Sacadura Cabral é alvo rotineiro de visitas de educadores sociais, que, no entanto, não obtêm êxito em convencer as pessoas a ir a centros médicos e sociais do município.

Enquanto isso, junto de entidades assistenciais como a Casa Amarela, e outras ligadas às igrejas, são realizados o monitoramento da área ocupada e a distribuição de comida, roupas e cobertores.

A notícia foi bem recebida pelos moradores do bairro. Desde os 7 anos no local, a assistente administrativa Natália Furtado, 18, sente de perto o drama dos viciados. O muro dos fundos de sua casa é um dos pontos onde os dependentes consomem a droga.

"Às vezes as brigas que acontecem entre eles incomodam. Fora isso, sempre ajudamos quando pedem comida. Tenho dó da situação dessas pessoas."

A maioria dos moradores é direta ao dizer que não é incomodada pelos viciados. "Nunca tive problemas com eles. É claro que queremos mudanças, que a rua fique limpa e que possamos receber visitas sem ouvir frases preconceituosas", disse o atleta Vinícius Antônio, 19.




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