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Segura, polêmica
Juliana Bontorim
Do Diário do Grande ABC
26/08/2011 | 07:01
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No mês em que é realizada a festa de peão mais tradicional do País, em Barretos, no Interior, a discussão sobre sacrifício de animais entra, de novo, em evidência. Em Santo André, projeto de lei que autoriza a realização de rodeios aguarda apreciação. Segundo o autor da medida, o vereador Alemão do Cruzado (PSL), eventos do tipo gerariam lucro para a cidade. "Com normas específicas que não permitam maldade contra os animais, deve ser permitido rodeio, sim. Tem vereador que não quer votar, porque tem medo, mas muitos deles frequentam festas do tipo fora daqui", avaliou o parlamentar.

Os vereadores Ailton Lima (PDT) e Paulinho Serra (PSDB) afirmaram nunca ter ido a Barretos e acreditam que espetáculos assim nada acrescentam à cidade. "Acredito serem mais proveitosos outros eventos que se identificam com a história de nossa região, como por exemplo o Festival de Inverno de Paranapiacaba, que cresce a cada ano", afirma Ailton. Já o tucano acredita que Santo André não está ligada à cultura do rodeio. "Nós temos perfil estritamente metropolitano e, portanto, sem identidade cultural com esse tipo de evento", avalia.

Para os ambientalistas, somente o fato desta questão estar em pauta na Câmara de Santo André já representa retrocesso. Nas demais cidades do Grande ABC, projetos semelhantes foram vetados. A presidente da Mountarat, sociedade de proteção animal, e advogada ambientalista, Renata Martins, afirma que, se caso a propositura parlamentar entrar em votação, medidas emergenciais serão tomadas. "Tenho certeza de que, como no passado, os vereadores contrários a tal retrocesso serão esmagadora maioria."

Existe lei federal que permite a realização de rodeios, mas compete ao município a decisão de promover a festa. Para a advogada, mesmo com todas as proibições, sempre ocorrerão maus-tratos a animais. Renata explica que a espora não pode mais ter roseta pontiaguda, mas "ocorre a má utilização deste apetrecho, que serve para golpear o animal, causando dor e cortes".

Para o presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similiares do Grande ABC, Eloy Palermo Carlone, a festa é responsável pela geração de empregos em vários setores, desde a década de 1990. "Hoje, em um evento de grande porte, do circuito nacional, pode-se ter até 4.000 empregos diretos e indiretos", contabiliza.

Na Associação Comercial e Industrial de Santo André, o assessor da presidência, Nelson Tadeu, concorda que a geração de empregos é expressiva, mas assegura que Santo André não tem estrutura para sediá-la. "Faltam hotéis, vias rápidas de acesso, segurança. Hoje, por exemplo, realizam shows no Riacho Grande, em São Bernardo, e o trânsito da Via Anchieta para. Que vias temos em Santo André para comportar fluxo tão grande de veículos?", questiona. 

 

Por que em Barretos é permitido?

Lei federal sancionada em 2002 permite a prática de rodeios no País. O presidente da CNAR (Confederação Nacional dos Rodeios), Roberto Vidal, entende que basta ter fiscalização rigorosa e permanente na festas. "Temos feito esse trabalho, acompanhando desde o alojamento e o transporte dos animais até a checagem dos equipamentos de montaria, para que tudo esteja dentro da lei. Todo o processo é uma ação direta da CNAR em conjunto com as federações estaduais e a organização do rodeio local", explica.

Em Barretos, cidade conhecida nacionalmente pela Festa do Peão, os Indendepentes, entidade organizadora, contrataram neste ano tecnologia norte-americana para a preparação da arena. Segundo o presidente da produtora, Marcos Murta, tudo é feito para a garantir o bem-estar e a segurança tanto do animal quanto do peão "Queremos que Barretos seja sempre referência." 

SOFRIMENTO
O professor Orivaldo Tenório de Vasconcelos, que coordena o Instituto Ecoa, Centro de Estudos de Comportamento Animal, garante que os animais não sofrem com os apetrechos usados em cavalos e touros. Ele se baseia em estudos que mostram a vida normal desses animais após a disputa. "Os animais foram submetidos a procedimento de saltos, como se fosse em um rodeio, e depois liberados para alimentação no cocho. Em seguida tiveram acesso a uma novilha no cio e, ainda com o sedém, desempenharam atividade sexual normalmente."

COCEIRA
A argumentação é rebatida por Renata Martins, do Mountarat. Diz ela que até mesmo a coceira, atribuída ao uso do sedém, já é considerada maus-tratos. "Nesse estudo, o sedém não estava apertado e, portanto, em situação bem distinta da utilizada em rodeios."

 

Maus-tratos contra animais são inaceitáveis 

É unanimidade entre os defensores de animais o sofrimento causado a eles em rodeios. Marta Capelli, veterinária, diz que o sedém (corda amarrada ao boi) mesmo que colocado em outra parte do corpo, já provoca mal-estar. "O aparelho é apertado horas antes de o animal entrar na arena, o que se configura tortura. O animal pode permanecer no máximo oito segundos na arena, mas é submetido a treinos de seis a oito horas por dia", critica.

A jornalista Andrea Brock, coordenadora do Grupo de Trabalho de Proteção Animal do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, garante que a luta será expressiva se o projeto do vereador Alemão do Cruzado vier a ser aprovado. "Ele deveria propor leis que protejam os animais. Não é possível, em uma região como o Grande ABC, termos circulando por aí carroças puxadas por cavalos em sofrimento." 

 

A favor da fiscalização 

O presidente da Confederação Nacional dos Rodeios, Roberto Vidal, defende que é premissa de todo bom profissional fiscalizar os rodeios. "Órgãos como a Coordenadoria de Defesa Agropecuária e veterinários têm de impedir abusos e desrespeito à lei federal. Nós, da Confederação Nacional de Rodeio, asseguramos que empresários e profissionais que agirem em conformidade à legislação estarão capacitados a receber a certificação de qualidade", opinou.

 

A favor da proibição 

Para a coordenadora do Grupo de Trabalho de Proteção Animal do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, jornalista Andrea Brock, não basta a fiscalização, porque os maus-tratos continuarão. "Alguns rodeios exigem a presença de veterinário na arena, mas isso não evita os maus-tratos a que esses animais são submetidos. É como achar que a presença de um médico no hospital é garantia de bom atendimento ou de alívio às dores do paciente. Um touro pula enlouquecidamente com o sedém. Isso é sinônimo de dor, de maus-tratos."

 

O valor da arena 

Os animais são os astros das festas de Peão de Boiadeiro de Barretos. Por isso, são valiosíssimos. Chega-se a gastar R$ 8.000 por mês em cuidados. Exemplos de touros cotados pelas companhias proprietárias: 

PESADELO:
8 anos, raça canchim, marquejana e nelore. Avaliado em R$ 1 milhão. 

MURUBU:
6 anos, raça nelore + Aberdeen Angus. Avaliado em R$ 150 mil 

AGRESSIVO:
6 anos, raça charolez com nelore. Avaliado em R$ 300 mil. 

BRITÂNICO:
6 anos, raça limosan com nelore. Também avaliado em R$ 300 mil. 

Vale lembrar
No segundo dia do evento em Barretos, neste ano, um bezerro foi sacrificado depois de ficar paralítico. A prova aplicada foi a bulldog, quando o competidor salta em cima do animal e tem de imobilizá-lo com os braços. A equipe de veterinários da festa decidiu pela eutanásia por meio da aplicação de hipovolemia, medicamento costumeiramete utilizado para esse fim.




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