Alunos da Emeief Darcy Ribeiro descobrem que cada um tem seu valor, seja do jeito que for
Em uma sociedade regida por padrões de beleza que ditam as características físicas de homens e mulheres, como ser magro e ter cabelos lisos, os alunos da Emeief Darcy Ribeiro, no Parque Oratório, em Santo André, fazem o contrário, valorizando as diferenças.
Estimulados pelo projeto Sou Único e Especial, desenvolvido pela professora Iara Cristina Dameto Prudêncio, as crianças têm demonstrado cada vez mais aceitação e respeito entre si. "O meu objetivo é mostrar para cada uma delas o quanto são especiais e amadas por suas próprias características", afirma Iara.
Sejam mais altos ou mais baixos, gordinhos ou não, brancos ou negros, tímidos ou extrovertidos, os alunos passaram a se respeitar pelo que são. O projeto começou usando fotografias de quando eles ainda eram bebês, comparando como são hoje. Na medida em que foram percebendo que ao nascer uns eram mais gordinhos e ficaram magros, outros o contrário; uns eram carequinhas e hoje têm muito cabelo; uns têm cabelo cacheado e outros liso; alguns com olhos claros e outros escuros; entre tantas outras diferenças, eles começaram a perceber que o ‘padrão', na realidade, significa um ser diferente do outro. "Eles viram que a coleguinha que tinha o menor tamanho quando nasceu em relação aos demais, hoje é a maior da turma", disse Iara.
Além de muitas atividades em rodas de conversa, o projeto também incluiu muita pesquisa envolvendo a participação de familiares. "Eles tiveram de perguntar aos pais ou responsáveis como eram quando nasceram, quem deu nome a eles, como se comportavam, entre outros detalhes", afirma Iara. As estruturas familiar e social também foram comparadas e diferenças como viver apenas com os avós ou não ter a presença paterna deixaram de ser problemas. "Eles entenderam que são especiais assim mesmo e que todos apresentam características fora do que é considerado padrão", comenta.
Apesar da pouca idade, Letícia Vitória Lima Bezerra, 4 anos, sabe muito bem do que a professora está falando. "Eu gosto do meu cabelo e acho ele bonito", diz ela, que também considera os coleguinhas bonitos, mesmo muitos deles sendo bem diferentes dela.
Para Giovanna Yolanda Lucchi, 4 anos, as comparações foram importantes por ela ter aprendido o quanto é importante ter cuidado com os bebês. "Eles choram muito e fazem xixi na cama", diz ela, contando que também já molhou o bercinho.
Para a assistente pedagógica Marta Maria Baldin, o projeto é importante principalmente pela promoção de integração entre as crianças e os reflexos em casa, além da vantagem de envolver intensamente a família. Recentemente, as mães estiveram na sala de aula e puderam comparar o comportamento dos filhos em casa e na escola, acompanhando um dia de atividades e assistindo, de perto, tudo que fazem em sala. "Esse trabalho de comparação e aceitação do outro contribui para o desenvolvimento de um papel mais colaborativo."
Respeitar as diferenças é lição de cidadania
Em uma das atividades do dia, a professora passou aos alunos a tarefa de mostrar em desenho o que mais chamou a atenção deles ao longo do ano.
Nos traços e cores estavam lá as árvores, o amarelo do sol, a nuvem e a escola. Mas havia duas características que demonstravam como o grupo termina o ano bem unido. As crianças colocaram os seus amigos de classe na maioria dos trabalhos. E em todos os desenhos, a figura da professora Simone Regina Bortoloti Silva foi retratada usando mais de um tipo de penteado e estilo de roupa. Porém, na estampa das vestimentas, a palavra amor predominou nas formas de eu te amo, eu amo você e até love.
Pode-se dizer que, na escola que leva o nome do mais ilustre romancista brasileiro, Emeief Machado de Assis, no Parque Miami, em Santo André, os 30 alunos do 5º ano amam a sua mestre. Uma unanimidade. "Quando cheguei aqui a sala era muito heterogênea e havia deficit grande em relação aos aspectos cognitivos, emocional e social. Eles não tinham pique para estudar", conta Simone.
A professora estruturou o projeto Respeito às Diferenças - um conto na escola! para dar a virada nessa história. As aulas eram iniciadas com roda de conversa. Nelas, Simone conseguiu detectar quais alunos tinham problemas para se relacionar com seus colegas e os motivos. Achou Gustavo da Silva Oliveira, 11 anos. "Ele tem a autoestima muito baixa porque era considerado um aluno complicado. Para se ter uma ideia, ele só se alfabetizou neste ano. Eu o trouxe para a frente da sala e o fiz participar", relata. Resultado: Gustavo fez um desenho da professora saindo de trás de duas montanhas, com os braços abertos e a palma das mãos viradas para frente. Parece uma santa. O queixo é projetado para o alto e no centro do peito a palavra amor esta escrito em letra maiúscula. Compõem a paisagem o arco-iris e um sol de rachar. "É a única professora que quando estou com dificuldade vem me ajudar", diz o menino.
Nas mãos da professora ninguém escapou, ela quis incluir todo mundo. E, na concepção de Simone, incluir não é apenas colocar um cadeirante para conviver com outros alunos. "Incluir para mim é agregar do indisciplinado a criança com problemas cognitivos", define.
Nesse período, caiu em suas mãos o livro Juntos Somos Ótimos, de Franz- Joseph Huainigg e Verena Balhaus. Nele, uma criança com síndrome de Down e uma menina de cadeira de rodas se divertem e se ajudam nas tarefas. Adotou o título nas atividades em aula. As crianças adoraram e os trabalhos avançaram. Erick Couto dos Santos, 11 anos, é deficiente intelectual. Quando chegou na escola só desenhava bolinhas e os traços não tinham esquema corporal; não conseguia contar e nem soletrar. Hoje, conta até 30 e participa de jogos de soluções de problemas, como soletrar palavras. "Os exercícios são adaptados, preciso usar material concreto, como palito de sorvete e lápis", conta, feliz. (Selma Viana)
Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.