Economia Titulo Crise
Chocolates Pan pede recuperação judicial

Pela primeira vez, desde 1935, tradicional fábrica de S.Caetano não está vendendo ovos de Páscoa

Por Soraia Abreu Pedrozo
Do Diário do Grande ABC
24/03/2021 | 00:05
Compartilhar notícia
DGABC


Situada no mesmo ponto da Rua Maranhão desde 1935, a Pan, tradicional indústria de chocolates de São Caetano, teve aprovado pedido de recuperação judicial. Neste cenário, em 86 anos de história, esta é a primeira Páscoa que a empresa não participará com a venda de ovos. Neste ano, sequer foram comprados os insumos para a produção dos doces típicos desta época do ano, principal data comemorativa para a companhia.

Na Páscoa de 2020, como a pandemia do novo coronavírus já havia chegado ao País, as vendas ficaram restritas ao WhatsApp com retirada no local e poucas opções de produtos, por exemplo, os ovos grandes não tinham sido fabricados, havia apenas opções menores. Neste ano, o site indica que a loja de fábrica está em reforma – o que foi anunciado em agosto do ano passado. Além disso, pelo mesmo canal de mensagem instantânea, hoje a informação é a de que não irão trabalhar com a Páscoa por conta da pandemia e da “falta de matéria-prima no mercado”.

A fabricante já vem passando por dificuldades financeiras desde o início de 2019, quando iniciou período de demissões, que hoje se aproximam de 100 colaboradores, mas que não conseguiram receber as verbas rescisórias – muitos deles com mais de 20 anos de casa.

Entre tentativas de negociar o pagamento desses profissionais e de se acertar com credores, a Pan acumula hoje dívida que gira em torno de R$ 2 milhões e que, há cerca de um ano, era de R$ 500 mil.

“Neste meio-tempo foram correndo outros processos judiciais e multas e juros que elevaram o valor da dívida da Pan. Ela chegou a sinalizar ao sindicato que iria negociar o pagamento à vista de quem aceitasse receber o valor sem multas e juros no início de fevereiro, mas agora, dia 8 de março, conseguiu deferir pedido de recuperação judicial, o que suspende, por ora, a obrigação de efetuar os pagamentos”, explica Roberval Pedrosa, advogado do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Laticínios e Alimentação da região. “Conforme a lei da recuperação judicial, empresas nesta situação ganham uma tolerância que permite a suspensão de pagamentos enquanto ela se recupera e traça plano de quitar todas as suas dívidas.”

DRAMA

Segundo Pedrosa, processos do tipo dificilmente são cumpridos em menos de 12 meses. Ou seja, o drama dos trabalhadores demitidos deve se estender por mais um ano. É o caso de Ailse Maria da Silva, 56 anos, e que tinha 24 como funcionária da Pan quando foi desligada. Ela conta que em fevereiro completaram-se dois anos da sua demissão. “Consegui receber o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e o seguro-desemprego, mas dos meus direitos, que ficaram parcelados em 28 vezes, junto com cinco anos de depósito do FGTS que faltavam, recebi apenas cinco parcelas. Faz um ano e seis meses que eles não pagam”, lamenta. “Faltavam dois anos para eu me aposentar quando me demitiram, então a Pan seria obrigada por lei a recolher o meu INSS, mas eles não pagaram. Com os bicos que faço e a ajuda do meu filho, em maio consigo completar 30 anos de contribuição e vou dar entrada na aposentadoria.”

Ela relata que sempre que vai ao mercado e vê produto da Pan tira foto da data de validade, o que comprova que ainda há produção e, portanto, seu pagamento poderia ser retomado. “É uma situação muito difícil. Só Jesus na causa.” Ailse conta que recebeu carta, assim como os demais na mesma situação, com os valores devidos pela empresa, porém, o cálculo estava errado. Pedrosa garante que o montante será atualizado e constará em certidão de habilitação de crédito.

Conforme consta no processo, em caso de falência da Pan os créditos trabalhistas serão limitados a 150 salários mínimos, hoje R$ 165 mil. “Quem tem mais valor, perde”, diz trecho do documento.

MUDANÇA

Em 2016, o negócio familiar de chocolates, balas e doces de São Caetano foi vendido para o Grupo Benetti Brasil Participações, que tinha como planos de recolocar a fabricante na casa do consumidor brasileiro e posicioná-la entre as cinco maiores indústrias do ramo no País. A ideia era implementar 300 lojas franqueadas da Pan entre 2017 e 2018, o que não se cumpriu. Haviam sido investidos R$ 10 milhões iniciais com a promessa de aportar mais R$ 50 milhões.

“Um dos maiores problemas é que, no registro da Jucesp (Junta Comercial do Estado de São Paulo) consta como proprietário apenas Marcos Tolentino, e não o Grupo Benetti. Embora ele seja o dono da corporação, os bens não estão vinculados à Pan”, cita Pedrosa. A equipe de reportagem não conseguiu contato com o grupo nem com a Pan. 




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;