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Falta lazer à periferia de S.Bernardo
Por Illenia Negrin
Do Diário do Grande ABC
22/02/2006 | 08:11
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A falta de espaços públicos de lazer em São Bernardo criou uma nova categoria de moradores: os turistas na própria cidade. Como são raros os locais com infra-estrutura adequada e atrativos para receber toda a família, uma visita aos bem equipados parques se transformou em passeio turístico aos que vivem longe do divertimento. Se investimentos maciços ergueram obras contemplativas e de grande porte nos bairros nobres; na periferia, praças menores e parquinhos foram esquecidos.

O point do momento, o Parque Municipal Engenheiro Salvador Arena, em Rudge Ramos, foi inaugurado há dois meses e fica superlotado nos finais de semana. No primeiro domingo de fevereiro, quando a temperatura passou dos 30 graus, as catracas registraram público de 10.564 pessoas. No sábado anterior, quase 7 mil visitaram a área. Era fila para usar os brinquedos, para comprar água na lanchonete, para usar o banheiro.

“Muita gente vem porque é novidade. Quer conhecer o aquário, que é a sensação do parque”, avalia Manoel José Lopes, um dos administradores do Salvador Arena. E conta que não é só durante o final de semana que o espaço é concorrido. Mesmo com o início das aulas, 2,5 mil pessoas freqüentam diariamente o local, de segunda a sexta-feira. “É uma loucura. Todo mundo quer vir.”

Tudo ali no novo parque é bonito, bem cuidado. Espalhadas pelos 15 mil m², caixinhas de som tocam música brasileira e câmeras fazem o monitoramento. O esquema é o mesmo de outro parque, o Cidade de São Bernardo, que fica na avenida Kennedy e também tem chafariz, asfalto na pista e piso emborrachado no playground. Os dois espaços, juntos, custaram cerca de R$ 2 milhões. Ao som de Paulinho da Viola, Maria Rita do Nascimento, 42 anos, admirava o aquário gigante da nova área verde do Rudge Ramos, de 2 m de altura e 24 m de extensão.

“Meus filhos insistiram muito para vir aqui. Estou achando tudo uma maravilha. As crianças ficaram loucas para conhecer depois que viram a propaganda que a Prefeitura fez na TV. A gente veio lá do Alves Dias, de ônibus. Lá, não tem nada disso, não”, conta a cozinheira, desempregada. Ela e os três filhos aproveitaram uma terça-feira cinzenta para visitar o parque. Nem a chuva espantou a família.

Lopes, o administrador, diz que o público não desiste da visita, mesmo com aguaceiro. Ele, que mora no Jardim Silvina, diz que os moradores do Rudge são privilegiados por ter “uma área assim” perto de suas casas. O bairro conta ainda com outro espaço de lazer, na mesma avenida, a Praça dos Meninos, conhecida como Praça das Noivas. Bem mais modesta, ainda atrai os freqüentadores cativos. Lopes, por exemplo, nunca teve nada parecido na região em que vive. “Lá não tem mesmo opção de lazer. Meus filhos, quando eram pequenos, eu levava de vez em quando na Cidade da Criança.”

Córrego “come bola” – Do outro lado de São Bernardo, onde mora o administrador, há a Praça do Trabalhador. Tem duas quadras e um parquinho mal conservado. Dos dois balanços, um não funciona. A área verde se limita ao mato que margeia o córrego Beira-Rio – poluído, sem peixinhos – e que há tempo não é cortada. Uma base da polícia militar instalada na área deixa os freqüentadores mais tranqüilos. Mas não há quem não reclame do mau cheiro que vem do esgoto.

“Mudei pro Silvina faz um mês. Gosto da praça, porque lá no Alvarenga, onde morava antes, nem isso tinha. Ficava trancado em casa”, conta o estudante Jonathan Oliveira, 15 anos. “As meninas não têm muita opção por aqui. Só andar de bicicleta. Mas não tem muito espaço. Chato é quando a bola cai no córrego. Aí tem que buscar, senão vai parar lá no piscinão”, comenta Douglas da Costa Gomes, 13.

Privativo – Em duas outras áreas de lazer, o uso é quase que exclusivo dos abastados moradores que rodeiam os equipamentos, apesar de os espaços serem mantidos com dinheiro público. A impecável Praça Juliano Versolato, de 16 mil m², fica no centro do Parque Espacial. A vizinhança transformou o bairro numa espécie de condomínio fechado, e o acesso é controlado por cancelas.

Um dos vigias explica que ninguém é impedido de circular por ali. Mas os “estranhos” são discretamente abordados pelos vigilantes que fazem a ronda. Tanto a praça quanto as ruas são monitoradas por câmeras 24 horas. A área tem pista de caminhada e para ciclistas, além de playground para as crianças. Mas parece peça decorativa; no dia em que a reportagem visitou o local, por volta das 10h de uma quinta-feira, ninguém ocupava os bancos de madeira. A menos de 1 km dali, no Jardim Lavínia, bairro pobre de periferia, os moradores reclamam da falta de equipamentos de lazer.

Na Praça dos Coleirinhas, que fica no Parque dos Pássaros, o movimento também é fraco. Ali não há cancelas que inibem o acesso, mas o espaço é mais freqüentado nos finais de semana, principalmente pelos “estrangeiros” ao bairro, turistas vindos das vilas Ferreira e Esmeralda. Que aproveitam o dia de folga para exercitar o tão suado direito ao lazer.



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