Esportes Titulo Pan 2011
Ex-coletor de lixo dá último ouro ao Brasil
Por Anderson Fattori
do Diário do Grande ABC
31/10/2011 | 07:30
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O ex-catador de lixo Solonei Rocha da Silva ganhou a última medalha de ouro do Brasil nos Jogos Pan-Americanos de Guadalajara. O atleta de 29 anos completou os 42.195 m em 2h16min37, sob o forte calor mexicano na tarde de ontem.

Essa foi a quarta vez consecutiva que um atleta brasileiro vence a maratona masculina em Pans, mantendo uma hegemonia que vem desde 1999.

Os colombianos Diego Colorado e Juan Cardona completaram o pódio. O outro brasileiro na prova, Jean da Silva, ficou em nono.

Solonei manteve um bom ritmo durante os primeiros 20 quilômetros, ficando sempre no pelotão principal. O atleta de Penápolis, cidade no interior de São Paulo, aumentou a passada na metade da prova e não sofreu o assédio de nenhum concorrente.

O brasileiro chegou ao Arca de Vallarta, um dos principais pontos turísticos de Guadalajara, com a bandeira brasileira e até arriscou alguns passos de samba ao cruzar a linha de chegada.

Antes de se dedicar ao atletismo, Solonei trabalhava como catador de lixo nas ruas de Penápolis. Ele fez questão de lembrar o seu passado e dedicar a medalha de ouro a todas os colegas que correram e coletaram lixo com ele. "Se você tem potencial e acredita nele, corra atrás dos seus sonhos. Se alguém me dissesse, há quatro anos, que eu seria um campeão pan-americano, diria que essa pessoa estava louca. Mas tive a chance e fui atrás. Tenho muito orgulho da minha história", afirmou.

Esta foi apenas a quarta prova oficial completada pelo brasileiro, que começou a correr há dois anos.

Depois do triunfo em Guadalajara, Solonei tem planos para conseguir uma vaga nos Jogos Olímpicos de Londres. Ele terá duas chances para garantir o índice, no Japão em janeiro e na capital britânica em abril. "Não imaginava conseguir o índice aqui (em Guadalajara) por conta do calor e da altitude. Mas creio que não terei grandes dificuldades de obter a marca dentro das condições ideais, num clima mais frio e ao nível do mar", afirmou o corredor confiante em suas capacidades.

A mudança de carreira não foi a única na vida de Solonei nos últimos meses. O atleta conseguiu terminar o ensino médio e tem planos para fazer o curso superior de Educação Física.

O ex-catador quer correr profissionalmente por dez anos e depois retornar à Penápolis, onde pretende ajudar no desenvolvimento de novos atletas nas categorias de base. "O atletismo abriu a minha mente. Antes, era uma pessoa acomodada", disse o novo campeão Pan-Americano.

 Brasil coleciona vexames no Pan

Os Jogos Pan-Americanos, assim como qualquer outra competição esportiva, são construídos por vitórias e decepções. Os campeões são eternizados, enquanto os fracassados serão penalizados pelo minuto que seja de distração. E são vários os brasileiros que deixam Guadalajara com a sensação de que poderiam ter tido desempenho melhor. Para outros, aqueles que deixaram escapar vaga olímpica, a ressaca vai perdurar pelo menos até o próximo ano.

A humilhante campanha do futebol masculino, por exemplo, deixa marcas profundas nos atletas que foram ao México. A eliminação ainda na primeira fase, com dois pontos em três jogos, significa a sexta posição no geral, pior resultado do Brasil na história do Pan-Americano. Seguramente, os brasileiros carregarão para sempre o fardo de terem empatado com Cuba (0 a 0) e sofrido derrota vexatória para Costa Rica (3 a 1), duas seleções com pouca expressão internacional.

Na mesma linha está o basquete feminino. Ainda é preciso entender o que se passou nos bastidores para elucidar o fracasso diante de Porto Rico na semifinal, já que esportivamente não há explicação.

Foram muitos erros, alguns grotescos. Intriga ainda a ausência da cestinha Iziane, maior pontuadora da competição, no segundo tempo da partida. Sobrou nas mãos da jovem Damiris a bola do jogo, mas ela errou, consumando a derrota por 69 a 68 que entrou para história.

Individualmente, a maior decepção foi a saltadora Fabiana Murer, da BM&FBovespa/São Caetano. Campeã mundial em agosto, ela abriu mão de disputar a temporada indoor - que também detém o título mundial - para estar em Guadalajara. Mesmo sem as principais rivais, ficou longe do ouro e viu a cubana Yarisley Silva brilhar, tendo que se contentar com a prata.

Ainda há outros brasileiros que deixaram o Pan com gosto amargo na boca. O handebol masculino não perdeu só o ouro para a Argentina, mas também a vaga na Olimpíada. Fabiana Beltrame, campeão mundial, sucumbiu e ficou com a prata no remo. No taekwondo, os dois principais brasileiros na disputa, Natalia Falavigna e Diogo Silva, deixaram o México sem medalhas.

 

Falhas estruturais colocam em xeque organização mexicana

Receber centenas de atletas para disputa de uma competição não é tarefa das mais fáceis. Os mexicanos se esforçaram, mas falhas bisonhas - algumas amadoras - por pouco não colocaram tudo a perder.

Os principais problemas foram na natação. Na eliminatória dos 50 m, o placar apontou que o norte-americano Bryan Lundquist havia nadado em improváveis 14 segundos. A confusão deixou todos apreensivos até que o tempo foi corrigido. Na mesma prova, o placar apontou erroneamente recorde pan-americano para o tempo registrado por Brett Fraser, das Ilhas Cayman.

Entre as mulheres também houve problema na cronometragem. A brasileira Daynara de Paula viu seu tempo nos 100 m borboleta distorcido durante a eliminatória e por um momento pensou que ficaria fora da final. Tudo resolvido, ela nadou e ficou com a prata.

No primeiro dia de disputas, a brasileira Yane Marques, do pentatlo moderno disparou contra as péssimas condições do percurso. "O asfalto estava terrível. O piso era duro, muito pesado. Tive problemas com a iluminação, o sol estava batendo na minha pistola. A piscina estava com 21 graus, o que não é permitido pelo regulamento", criticou.

Outros atletas detonaram os locais de provas. Márcio Wenceslau perdeu de forma inexplicável a luta no taekwondo. O equipamento que marca os pontos falhou com o brasileiro, que visivelmente acertava golpes não pontuados. "Só dando um tiro aqui para marcar ponto", reclamou.

No primeiro dia do judô, o tatame não suportou a intensidade das lutas e acabou rasgando. No basquete masculino também houve problema com um dos aros.

As falhas no Pan deixaram o presidente da Organização Desportiva Pan-Americana, Mario Vázquez Rama, irritado. "Houve uns probleminhas que em alguns casos se tornaram problemões", comentou.

 

Atletas expõem crise na ginástica feminina

Entre os piores resultados do Brasil no Pan de Guadalajara está a ginástica artística feminina, que nos últimos anos estava habituada a subir nos lugares mais altos do pódio. Dessa vez, porém, além do péssimo desempenho, as atletas evidenciaram nas entrevistas que existe um racha no time.

Daiane dos Santos defendeu a volta da Seleção Brasileira permanente em Curitiba, com Oleg Ostapenko, técnico ucraniano que liderou a ascensão da ginástica no País. Daniele Hypólito, entretanto, contrariou a colega e disse que não abrirá mãos dos seus treinadores.

Para piorar, Adrian Nunes colocou ainda mais lenha na fogueira ao expor clima vivido no México: "A gente não está sendo um grupo. Tem muita briga, muita intriga. Fizemos uma reunião para tentar resolver isso, mas não deu certo."

O reflexo da desunião apareceu nas competições. A equipe terminou na humilhante quinta posição, ficando fora do pódio pela primeira vez desde o Pan de Mar del Plata, em 1995.

Individualmente, a única que conseguiu êxito foi Daniele Hypólito. No último dia da modalidade, a ginasta obteve duas medalhas de bronze na solo e na trave.

 

COB faz balanço positivo de Guadalajara

Após 16 dias de competições, o Comitê Olímpico Brasileiro fez balanço positivo da participação do Brasil nos Jogos Pan-Americanos de Guadalajara, apesar do País ter ficado na terceira colocação, atrás de Estados Unidos e Cuba.

Com investimento total de R$ 8,5 milhões no Pan, o Brasil volta para a casa com 141 medalhas, sendo 48 de ouro, 35 de prata e 58 de bronze.

Os dirigentes destacaram as conquistas de modalidades consideradas carro-chefes, como natação, atletismo, judô e vela, que juntas somaram 68 medalhas. E também as surpresas, como provas de tiro, ginástica artística masculina, ginástica rítmica, levantamento de peso e triatlo. O vôlei mais uma vez confirmou hegemonia conquistando quatro medalhas de ouro.

Foram 277 atletas medalhistas de 35 modalidades, o que representa 53% do total que veio para o México.

Segundo Marcus Vinicius Freire, superintendente executivo de Esportes do COB, o objetivo foi cumprido. "Saímos de Guadalajara com 24 vagas conquistadas para a Olimpíada de Londres em 2012 e com o melhor resultado de um Pan fora de casa. Estamos entre as três melhores seleções das Américas", afirmou.




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