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Relator especial domina Assembléia de SP
Eduardo Reina e Fabricio Calado Moreira
Do Diário do Grande ABC
20/02/2005 | 17:16
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Nos últimos anos, a Assembléia Legislativa tem se valido de um expediente cada vez mais comum para apreciar os projetos do governador Geraldo Alckmin (PSDB): a figura do relator especial. Através deste recurso, o Executivo conseguiu adiar e, em alguns casos, evitar a discussão sobre temas importantes, como desestatizações e aprovação de propostas em regime de urgência.

Os números evidenciam: em 2002, ano da eleição de Alckmin ao governo do Estado, dos 62 projetos de lei do Executivo que passaram pela Casa, 36 receberam pareceres de relatores especiais, contra 20 da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).

A CCJ é a responsável pelo primeiro parecer sobre a constitucionalidade dos projetos de lei que chegam ao Parlamento estadual. Todas as propostas, sejam do Executivo ou de deputados, passam obrigatoriamente por aquela comissão antes de irem para outras comissões ou a votação em plenário.

O número de pareceres emitidos por relator especial em 2002 é superior ao de 2003: 14 de um total de 35 projetos de lei. Em contrapartida, em 2003, apenas quatro propostas do Executivo receberam pareceres da CCJ. No ano passado, deu empate: foram nove pareceres da CCJ e nove de relatores especiais sobre cerca de 30 projetos de lei do Executivo. Os dados são da assessoria da bancada do PT na Assembléia, que afirma, em documento, que “dispositivos regimentais previstos como exceção têm se tornado a regra”, em referência à designação de relatores especiais para análise das propostas do Executivo.

O relator especial é designado pelo presidente da Assembléia quando expira o prazo regimental para a discussão de determinado projeto de lei. A função do relator especial é elaborar parecer em substituição ao da comissão.

Uma das críticas da oposição é que o prazo para a discussão dos projetos do Executivo é geralmente muito curto. Oposicionistas também acusam a existência de estratagema para queimar etapas na discussão de projetos em regime de urgência.

“As comissões ficam esvaziadas e sem quórum, e quando debatem no plenário, é só a título de obstrução”, revela o deputado Mário Reali (PT). Segundo o petista, que integra a Comissão de Finanças e Orçamento, discussões como a da desestatização da CTEEP (Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista), proposta pelo Executivo, têm sido difíceis de acontecer por conta do baixo quórum e das obstruções de deputados da base aliada do governador.

Para Mário Reali, a figura do relator especial foi desvirtuada. “A convocação do relator especial é um instrumento do presidente da Assembléia, mas como ele (Sidney Beraldo, do PSDB) trabalha para o Palácio dos Bandeirantes, (a convocação) é praticamente uma medida provisória”, avalia o petista. Segundo Reali, ao nomear um relator especial, o projeto de lei é automaticamente submetido à votação em plenário sem a aprovação da respectiva comissão.

O presidente da CCJ, deputado Ricardo Tripoli (PSDB), nega que os projetos avaliados por relator especial não sejam submetidos ao plenário. “Quando se estoura o prazo, o autor da proposta tem direito de pedir um relator especial. Isso é regimental.” Segundo Tripoli, mesmo com o parecer do relator, nada impede que os projetos de lei recebam emendas em plenário.

Na opinião do líder tucano na Casa, Vaz de Lima, as reuniões de comissões e audiências públicas têm sido esvaziadas por conta de seu caráter político. “Se você percebe que o camarada vai utilizar a comissão para criticar apenas e tão somente o governo, o que você faz? A mesma coisa que eles fazem em Brasília (na Câmara dos Deputados) e na Câmara de São Paulo”, afirma. O tucano acusa a ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy (PT) de ter utilizado um rolo compressor para aprovar projetos do interesse dela. “Quando se percebe que (a reunião da comissão) é coisa essencialmente política e não para esclarecer, não dá”, conclui Lima.

Inércia – Uma das críticas do documento feito pela assessoria do PT na Assembléia sobre a ação do relator especial é a atuação da CCJ. Segundo o texto, a maioria dos projetos do Executivo submetidos à análise da comissão tratam de alienação e concessão de uso de imóveis e da cessão do direito de posse.

O presidente da CCJ, Ricardo Tripoli, diz que a comissão apenas julga a constitucionalidade e jurisdicidade, não entrando no mérito do projeto. “Muitos projetos de deputados que chegam à CCJ são ótimos sob o aspecto do mérito, mas, se fizermos a proposta andar hoje, amanhã ela recebe veto pela inconstitucionalidade”, justifica.

É de Mário Reali o contra-argumento: “Então, por que o projeto de lei da (privatização) CTEEP chegou à Assembléia muito depois, saiu no mesmo dia e já foi para a ordem do dia, enquanto o da lei específica da Bacia do Guarapiranga está na mão dele (Tripoli)?”, pergunta.

Regimento – O líder do PSDB na Assembléia, Vaz de Lima, alega que a culpa pelo grande número de relatores especiais designados por comissões é do próprio regimento interno da Assembléia. “Não é problema nosso, mas sim do regimento. Não é que haja muitos (relatores especiais)”, sustenta. Para o tucano, a oposição também tem parcela de culpa pela atual situação das comissões. “Sempre propusemos mudanças dentro do regimento, que é da época da ditadura, e sabe quem é mais resistente a isso? O PT.”

O líder da bancada petista, Cândido Vaccarezza, diz que a história contada por Vaz de Lima não é correta. “Eles (governo) sempre tiveram 70% dos deputados e nunca mudaram. Agora que eles estão perdendo a maioria, fica mais fácil uma mudança no regimento”, justifica o parlamentar, ao dizer que o PT quer modernizar a Assembléia e mudar o regimento interno.



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