Mais uma vez o premiado escritor gaúcho Flávio Moreira da Costa interrompe sua produção pessoal para nos brindar com a organização de outro volume fundamental para incremento da cultura literária universal. As Cem Melhores Histórias Eróticas da Literatura Universal (Ediouro, 640 págs., R$ 69) é uma generosa reunião de textos - em trechos selecionados ou na sua integridade - que promove uma jornada entre passado e presente, Oriente e Ocidente. Um verdadeiro panorama da grande literatura mundial.

Se Freud nos confirmou que Eros é a força vital que move o mundo, nessa caprichada antologia constam testemunhos de escritores anônimos ou célebres que revelam que o assunto também impulsiona a literatura. Impulso aliás, vulgarização de pulsão, outro termo do glossário freudiano que nos ajuda a entender a enorme influência do Eros em nossa existência.

Flávio Moreira da Costa, como já observado nos volumes anteriores (Os Cem Melhores Contos de Humor... e Os Cem Melhores Contos de Crime e Mistério...) não limitou-se a selecionar os textos. Cuidou também da introdução, das esclarecedoras notas introdutórias e, aí o grande trunfo dessa antologia, participou da refinada equipe de tradutores. A última ação fez do livro oportunidade única de acesso a textos nunca publicados no Brasil. Sua colaboradora nessa bela empreitada, Celina Portocarrero, também assina traduções exclusivas, ao lado de Fernanda Abreu, Otávio Marcondes, Rubem Mauro Machado, entre outros. Note-se porém que aqui o título Melhores Contos deu lugar a Melhores Histórias. "No meio da pesquisa, descobri que, estranhamente, as manifestações eróticas na literatura eram muito mais ricas em trechos de romances, e mesmo em poesia, do que no conto. Fiz um desvio de rota pensando na qualidade da antologia, isto é, juntando trechos de romances e poesias", explica Moreira da Costa.

Acertada escolha. Primeiro porque, com isso, o leitor é apresentado a obras fundamentais, como O Banquete, do grego Platão (427 a.C.-c.347 a.C), texto que abre o livro e traz a A Fala de Aristófanes; e o Kama Sutra, de Vatsyayana (c. séculos I-VI/ Índia) no popular trecho que descreve Variantes das Uniões dos Corpos (a edição inclui as tabelas que indicam as uniões mais apropriadas de acordo com as dimensões dos genitais masculino e feminino).

Seguem-se, neste delicioso banquete literário, como bem classifica Moacyr Scliar na orelha da edição, trechos dos escritos de Ovídio, Boccaccio, Casanova, Shakespeare, Sade, Gustave Flaubert, Álvares de Azevedo, Machado de Assis, Émile Zola, Raul Pompéia, Marcelo Proust, Guillaume Apollinaire, James Joyce, Henry Miller, D.H. Lawrence, Anaïs Nin, Alberto Moravia, Jorge Amado, Allen Ginsberg, Hilda Hilst e Caio Fernando Abreu, entre outros.

Nessa diversidade se sustenta a reflexão proposta por Moreira da Costa em sua introdução. "Não pretendi (...) cair no que me parece armadilha (...) de distinguir, definir, o que é erótico, o que é obsceno, o que é pornográfico (...) e por duas boas razões: (1) são sempre definições que variam com o tempo e com a ideologia de quem as emite, e que portanto, resultam parciais, e limitadas, ou mesmo limitantes (...); e (2) porque se assim o fizesse censuraria previamente, ou condicionaria, ou simplesmente desconsideraria o discernimento do próprio leitor".

E é sem violentar seus conceitos morais privados que o leitor deve entender essa antologia. Haverá situações chocantes, repugnantes, ou meramente risíveis. Outras excitantes, prazerosas, românticas até. Mas para que a leitura seja o mais proveitosa possível não perca de vista o contexto histórico dos textos, que os tornam manifestos libertários, libidinosos libelos.