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Caixa financiou prédios sem Habite-se
Por Célio Franco
Do Diário do Grande ABC
27/06/2007 | 07:22
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A CEF (Caixa Econômica Federal) concedeu financiamentos para compradores de apartamentos do condomínio Barão de Mauá sem que os imóveis tivessem Habite-se. Laudo da perícia da Justiça Federal mostra que 13 prédios (416 apartamentos) – de um total de 53 construídos – foram vendidos sem esse documento, que atesta que os imóveis foram construídos de acordo com a legislação.

O documento da Justiça, obtido com exclusividade pelo Diário, aponta várias irregularidades no condomínio e se encontra atualmente em poder do Ministério Público Federal, que moveu ação civil pública contra a CEF. Como envolve recursos provenientes do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), o caso está sendo tratado como crime contra o SFH (Sistema Financeiro da Habitação).

Além de ter liberado o dinheiro para a empresa Paulicoop – responsável pela venda dos apartamentos –, a Caixa ainda executou e enviou para a Serasa e para o SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) o nome de moradores que, devido a essas irregularidades, deixaram de pagar as prestações.

A situação dos mutuários se agravou ainda mais com a explosão que matou uma pessoa em um dos prédios, em abril de 2000, culminando na revelação da Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) de que o terreno do condomínio tinha sido um lixão industrial e estava contaminado por 44 substâncias tóxicas.

Com a divulgação, em agosto de 2001, do que já é considerado o maior crime ambiental do País, muitos moradores ficaram sem Habite-se nem cópia do contrato de financiamento da CEF. Por decisão liminar, o juiz Jairo da Silva Pinto, da 1ª Vara da Justiça Federal de Santo André, já impediu a Caixa de cobrar os mutuários.

Documento preparado pelo perito Marco Antonio Basile, a pedido da juíza que cuida do caso na Justiça Federal, Audrey Gasperini, conclui que o Barão de Mauá é um loteamento “clandestino”, por ferir a lei federal 6.766/79, que proíbe o parcelamento do solo “em terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde”. Basile baseia-se no Código de Defesa do Consumidor para dizer que os contratos com a CEF ferem o princípio de “honestidade e firmeza” inerentes a esse tipo de negócio.

O perito disse estranhar que a mesma Prefeitura que autorizou a construção de 72 prédios tenha se recusado a dar o Habite-se para 13 desses blocos. Certidão emitida em 1994 pelo então diretor de Obras na gestão José Carlos Grecco, Antonio Calixto Ratti, atesta que “a área não foi utilizada para depósito de lixo orgânico ou de produtos que possam trazer riscos à saúde dos futuros moradores”.

Documento protocolado na Prefeitura em 1999 – durante a gestão Oswaldo Dias – pela Construtora SQG, associada da Paulicoop no empreendimento, afirma que, com base em sondagens no terreno, “verifica-se a inexistência de materiais nocivos à saúde”. No entanto, logo depois da explosão ocorrida no condomínio devido ao vazamento de gás metano, a Prefeitura alterou a classificação do loteamento.

Foram anexadas ao laudo várias multas aplicadas pela Cetesb contra a Cofap, por depósito de resíduos industriais tóxicos, no período de 1973 a 1990. O laudo inclui auto de inspeção, emitido pela companhia estatal, em 1994, que susbsidiou a aprovação, pelo governo estadual, do empreendimento. E alerta para o fato de que uma ex-gerente da Caixa, Regina Kerry Picansso, foi contratada pela Paulicoop para “solucionar problemas com a liberação do FGTS”. Basile constatou que, após a sentença da juíza Maria Lucinda da Costa determinando a demolição de todos os prédios do Barão de Mauá, os imóveis foram “desvalorizados em 100%”.

O morador Lindomar de Oliveira Alvim quer o ressarcimento dos danos financeiros e morais e formou uma associação de moradores prejudicados pela CEF. Devanir Calvo disse estranhar a rapidez com que a instituição aprovou o seu financiamento. “Mas até hoje não recebi cópia do contrato.”

A Caixa não comentou o assunto terça-feira e se comprometeu a dar nesta quarta-feira uma posição sobre o caso. A procuradora-geral Marta Pinheiro Oliveira Sena, representando o Ministério Público Federal, explicou que não poderia se manifestar ainda porque os autos não foram concluídos. E a Prefeitura de Mauá não deu, até o fechamento desta edição, retorno sobre os questionamentos feitos pela reportagem.




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