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Ensino Religioso confessional é alvo de críticas e preocupação

Especialistas e líderes espirituais questionam gestão
da oferta de matéria relacionada à crença específica

Bia Moço
Especial para o Diário
29/09/2017 | 07:00
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André Henriques/DGABC


 Um dia após o STF (Supremo Tribunal Federal) considerar constitucional o Ensino Religioso confessional – relacionado a uma crença específica – como disciplina em escolas públicas, o tema não passou batido pela comunidade do Grande ABC. Além de gerar inúmeras dúvidas e provocar debates nas redes sociais, a decisão, que já se tornou alvo de estudo de prefeituras da região para que seja implementada, também despertou preocupação entre líderes religiosos e especialistas.
Para profissionais da área do Direito, o Ensino Religioso, embora presente na LDB (Lei de Diretrizes e Bases) da Educação – Lei 4024/61 –, fere o Estado laico. “Seria impossível contratar professores para tantas religiões existentes, que catalogadas ultrapassam 100. Teremos certamente, de forma velada, a predileção por uma religião em detrimento da outra. E o ensino público é para todos. Precisamos, inclusive, pensar nos extremistas religiosos”, alerta a advogada Fernanda Simões.
A professora Mariana Benjamin Mendonça, 31 anos, teve Ensino Religioso no Ensino Fundamental, disciplina focada no catolicismo. “O dia em que o Ensino Religioso cumprir o seu papel de fato e ensinar sobre espiritismo, umbanda, candomblé, islamismo, judaísmo, budismo e hinduísmo vou poder afirmar que o Brasil pode estar começando a caminhar contra todo preconceito religioso que toma conta dos nossos dias.”
Na visão da estudante Thamiris Galhardo, 21, qualquer tipo de ensino que fale em religião não é democrático. “Estudei grande parte da vida em colégio que impunha o Ensino Religioso e não dava como opção assistir às aulas ou não. Sempre passavam exercícios que falavam da Bíblia como sendo a verdade absoluta, o que não é considerado verdade para pessoas de outras religiões.”
Por seis votos a cinco, os ministros do STF rejeitaram a ação da PGR (Procuradoria-Geral da República) que propunha que as aulas abordassem a religião sob aspectos históricos e sociais, o que, na visão de líderes religiosos do Grande ABC, seria ideal.
Presidente da Federação de Umbanda e Cultos Afro-brasileiros de Diadema, Cássio Ribeiro acredita que a decisão abre caminho para a geração de conflitos e aumento da intolerância. “Enquanto as religiões pregam a paz e o amor, o judiciário nos traz afrontas. Caracterizo isso como uma atitude retrógrada e que vai prejudicar nós, da umbanda, candomblé, e até mesmo os kardecistas. Plantaram um embrião para que se crie guerra religiosa no Brasil.”
Para o sheikh Jihad Hammadeh, vice-presidente da UNI (União Nacional das Entidades Islâmicas), com sede em São Bernardo, é preciso saber quem supervisionará casos de proselitismo. “O professor vai ensinar uma doutrina em detrimento da outra? E as crianças que não quiserem acompanhar as aulas, vão ter outras atividades? A espiritualidade precisa ser incentivada, bem como os valores éticos, mas de uma forma que resuma o que é convergente entre as religiões”, observa.
O pensamento do rabino da Associação Religiosa Israelita de Santo André, Josef Tawil, é semelhante. “Independentemente de que tipo de religião possa ser colocada na pauta, têm de ser ensinados a existência e a providência de um ser superior. A questão não é ensinar religião, e sim o que é universal.”
A equipe do Diário não conseguiu contato com o bispo da Diocese de Santo André, dom Pedro Carlos Cipollini. Ele participa de retiro espiritual com os padres da região em Indaiatuba, no Interior do Estado.

Disciplina é obrigatória em pelo menos 6,59% das escolas da região

Em pelo menos 6,59% das escolas públicas da região que participaram da ProvaBrasil 2015, cujo resultado é o mais recente, o Ensino Religioso é disciplina obrigatória, o que contraria a legislação. O número foi obtido com base nas respostas de 405 diretores de escolas municipais e estaduais. Conforme os dados, 22,41% dos profissionais relataram oferecer Ensino Religioso.
A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo esclareceu que a disciplina é facultativa e oferecida aos alunos do 9º ano do Ensino Fundamental se houver demanda.
Em Santo André, a Secretaria de Educação definirá posição sobre o assunto após ter acesso aos detalhes da decisão tomada pelo STF. Já em São Bernardo a questão será estudada. O mesmo acontecerá em São Caetano, que promete considerar a pluralidade religiosa da sociedade.
Mauá disse que estudos estão sendo efetuados para a implantação da disciplina e Ribeirão Pires aguarda a notificação da decisão do STF para adequar o currículo escolar.




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