Setecidades Titulo
Lei beneficia mulheres violentadas
Por Adriana Ferraz
Do Diário do Grande ABC
14/08/2006 | 07:55
Compartilhar notícia


Um universo formado por 2 milhões de mulheres dorme mais tranqüilo desde a última segunda-feira. No início da semana passada, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei Maria da Penha, que define e condena a violência doméstica e familiar no país. Segundo pesquisa da Fundação Perseu Abramo, esse é o número anual de mulheres que sofrem de agressão psicológica ou física no Brasil. Apenas nas cidades do Grande ABC, durante o primeiro semestre deste ano, a Secretaria da Segurança Pública confirma 6.848 atendimentos nas delegacias especializadas no atendimento à mulher.

A grande vitória, comemorada à exaustão por grupos feministas do país, é o aumento da pena aplicada ao agressor. De acordo com o projeto aprovado, o tempo de reclusão será triplicado, podendo chegar a três anos em regime fechado. O aumento só foi possível mediante alteração no Código Penal, que deixa de considerar os crimes de violência contra a mulher como "menor potencial ofensivo".

Na prática, isso quer dizer que a era das penas leves está chegando ao fim. "Os agressores não serão mais punidos com o pagamento de cestas básicas ou trabalhos comunitários. Agora, após o registro do boletim de ocorrência, o acusado terá de responder na Justiça, segundo determina a lei vigente. Isso é um avanço. A violência deixará de ser banalizada", acredita a vice-presidente do Cladem (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher), Silvia Pimentel.

Especialista no tema, a estudiosa da PUC fez parte da comissão interministerial que trabalhou no projeto de lei. "Estamos nessa luta há mais de 15 anos. O resultado mostra que o esforço valeu a pena. Sabemos que muitas mulheres ainda têm medo de denunciar, mas essa consciência, aos poucos, está mudando. A lei vai ser importante nesse processo de educação", garante.

A assinatura de Lula colocou o Brasil ao lado de outros 17 países da América Latina a contar com uma lei específica para os casos de violência contra a mulher.

Para a presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB, Maria Elisa Munhol, as mulheres devem comemorar a aprovação da lei, mas também questionar sua aplicabilidade. "Nosso país não tem estrutura penitenciária para prender todo agressor. É claro que o crime merece pena, mas também conscientização. O governo precisa investir em educação, até como medida de prevenir esse tipo de agressão. Acredito que essa é a grande utilidade da lei", afirma a advogada.

A preocupação é relevante já que agora a mulher só pode renunciar ao processo perante o juiz. A nova lei determina que a agressão contra a mulher seja julgada em Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a serem criados pelos Tribunais de Justiça dos Estados.

As investigações passam, então, a ser mais detalhadas, com depoimentos não só da vítima e do agressor, mas também de testemunhas. Segundo a OAB, essa diferença no tratamento do processo será essencial para a conscientização das próprias mulheres e, também, para a realidade do futuro do país. "A violência urbana começa em casa. É sabido que três quartos das crianças de rua são originárias de famílias com histórico de violência doméstica. Quando os menores cansam de ver a mãe apanhar do pai ou do padrasto, eles saem de casa e entram para a marginalidade. Não há como desligar uma coisa da outra", comenta Maria Elisa.

Além de investir em leis específicas e programas de consicentização, o Brasil precisa aumentar o número de delegacias da mulher. Tem de ter, pelo menos, uma por cidade. "As vítimas precisam ser ouvidas para aprender a reivindicar direitos e estimular a própria auto-estima", diz Silvia.

A lei

Antes
- N
ão existe lei para violência domética.

- Não estabelece as formas desta violência.

- Não trata das relações de pessoas do mesmo sexo.

- Aplica a lei dos juizados especiais criminais (lei 9.099/95) para esses casos de violência.

- As penas são pecuniárias, como cestas básicas e multa.

- Os juizados especiais criminais tratam somente do crime. Para a vítima resolver outras questões deve ingressar na vara de família.

- A autoridade policial efetua um resumo dos fatos através do tco (termo circunstanciado de ocorrência).

- A mulher pode desistir da denúncia na delegacia.

- A mulher pode entregar a intimação para a audiência.

- A lei atual não utiliza a prisão em flagrante do agressor.

- Não prevê a prisão preventiva para os crimes de violência doméstica.

- A mulher vítima de violência doméstica geralmente não é informada quanto ao andamento dos atos processuais.

- A mulher vítima de violência doméstica, em geral, vai desacompanhada de advogado ou defensor público nas audiências.

- A violência doméstica contra a mulher não é considerada agravante de pena.

- A pena para o crime de violência doméstica é de 6 meses a 1 anos.

- A violência doméstica contra mulher deficiente não aumenta a pena.

- Não prevê o comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação.

Depois
-
Tipifica e define a violência contra a mulher.

- Estabelece as formas como física, psicológica, sexual e moral.

- A violência contra a mulher independe de orientação sexual.

- Retira dos juizados especiais criminais a competência para julgar os crimes de violência doméstica.

- Proíbe a aplicação de penas leves.

- Serão criados juizados especiais de violência doméstica e familiar com competência cível e criminal para abranger todas as questões.

- Prevê um capítulo específico para o atendimento pela autoridade policial nesses casos

- A mulher somente poderá renunciar perante o juiz.

- É vedada a entrega da intimação pela mulher ao agressor.

- Possibilita a prisão do agressor em flagrante.

- Altera o código de processo penal para possibilitar a prisão preventiva.

- A vítima de violência será notificada dos atos processuais, especialmente quanto ao ingresso e saída da prisão.

- A mulher deverá estar acompanhada de advogado ou defensor em todos os atos processuais.

- Altera o artigo 61 do código penal para considerar este tipo de violência como agravante da pena.

- A pena do crime de violência doméstica passará a ser de 3 meses a 3 anos.

- Violência doméstica contra mulher portadora de deficiência tem pena aumentada em 1/3.

- O juiz pode determinar o comparecimento do agressor a programas de recuperação.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;