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Escritora Françoise Sagan também dá samba
João Marcos Coelho
Especial para o Diário
04/10/2004 | 14:15
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Poucos se deram conta de que a música foi uma grande paixão de Françoise Sagan, a famosa escritora francesa que morreu aos 69 anos dia 24 do mês passado, de embolia pulmonar , na França. Tanto que seus livros mais conhecidos têm a ver com música. Um chama-se Aimez-vouz Brahms?, ou seja, Você Gosta de Brahms? E o outro levou-a inesperadamente a ser fonte de inspiração para o belo e comovente samba-canção Bom Dia, Tristeza, também a única parceria entre Vinicius de Moraes e Adoniran Barbosa, gravada por Aracy de Almeida.

Françoise, nascida em 1935 em Carjaz, sudoeste da França, estreou na literatura em 1954, com o romance Bom Dia, Tristeza. A trama, narrada por uma jovem de 18 anos (ela própria), conta a trágica história de amor de seu pai por Anne. Foi sucesso de vendas e crítica em 1954 e logo ganhou tradução em 14 idiomas. Ganhou ainda uma versão filmada em 1957, com Jean Seberg e David Niven, dirigidos por Otto Preminger.

A música continuou a ser o mote principal de sua vida de celebridade instantânea. Em Nova York, Truman Capote aclamou-a. De volta a Paris, adaptou a peça O Doce Pássaro da Juventude, de Tennessee Williams, publicou em 1956 Um Certo Sorriso e escreveu canções sobre melodias de Michel Magne (uma valsa, En Dormant, que foi gravada por Juliette Greco, a musa dos filósofos existencialistas, com Sartre à frente). De novo em Nova York, conheceu em 1957 Billie Holiday. No ano seguinte, escreveu o argumento do balé Le Rendez-vous Manqué para Roger Vadim. E, em 1959, publica Aimez-vous Brahms?. É a narrativa de um último amor, o de Paula, 39 anos, decoradora que encontra o filho de uma rica cliente, 15 anos mais novo, na Salle Pleyel onde se executam músicas de Johannes Brahms (1833-1897), o terceiro B dos grandes Bs da música alemã, ao lado de Bach e Beethoven.

A tristeza - Mas o que Adoniran tem a ver com tudo isso? É simples. No início de 1957, Aracy de Almeida encontrou-se com Vinicius de Moraes no bar do Hotel Comodoro, em São Paulo. E, entre goles de uísque ("o melhor amigo do homem", segundo Vinicius), Aracy pediu-lhe um poema. O poetinha, que já havia servido na França como diplomata, e ciente do modismo em torno de Françoise, pegou um papel e rabiscou Bom Dia, Tristeza, autorizando Aracy a fazer o que bem entendesse. Dias depois, na Rádio Record, ela topou com Adoniran e desafiou-o a colocar música naquela letra.

Aí começam as versões, diferentes e conflitantes. Adoniran diz que Vinicius teria mandado a letra a Aracy pelo correio e que ele fez a música ali, na duralina, na frente da cantora. Ayrton Mugnaini Jr., em seu livro Adoniran, Dá Licença de Contar (Editora 34), afirma: "Noite Ilustrada conta que entregou a Adoniran a música pronta, gravada em fita. Ao sair o disco, Noite não gostou ao vê-la creditada só a Vinicius e Adoniran. A explicação: falta de espaço para mais de dois autores!"

"A tristeza é como um bichinho. E como rói, a danada, parece rato em queijo parmesão", diz Adoniran, tão à vontade falando quanto botando música melancólica nestes versos: "Bom dia tristeza/ Que tarde tristeza/ Você veio hoje me ver/ Já estava ficando até meio triste/ De estar tanto tempo longe de você/ Se sente comigo/ Aqui nesta mesa de bar/ Beba do meu copo/ Me dê o seu ombro/ Que é para eu chorar/ Chorar de tristeza/ Tristeza de amar".

Adoniran e Vinicius, que não se conheciam, só se encontraram em 1979, depois de um show do poetinha com Toquinho em São Paulo. Na ocasião, mal trocaram uma palavra.




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