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A turma contra a Copa
Por Carlos Ferrari
Do Diário do Grande ABC
17/05/2014 | 07:00
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Não foram um nem dois com os quais já conversei, e sim muitos dentre aqueles que se colocam contundentes contra a Copa do Mundo no Brasil. Até aí, tudo certo. Tenho minhas opiniões a respeito, aliás, mesmo neste espaço, trouxe em determinado momento algumas reflexões sobre o tema. Mas voltando aos contrários à Copa, parte dos que conheço estava na torcida quando o Brasil se posicionou como candidato. Depois celebraram orgulhosos, com frases patriotas, a escolha de nosso amado País para receber tão grandioso evento. Mas, agora, como um piloto de avião prestes a chegar no destino já com o combustível todo consumido, decidem que não querem pousar.

Penso que pior do que o posicionamento contraditório é a forma pela qual essa fúria tem sido externalizada. Falam-se aos quatro ventos sobre desperdício de dinheiro público na construção das arenas, mas, de verdade, não se faz o debate aprofundado sobre como os recursos foram destinados nem tampouco em que ordem de grandeza. Ninguém discute quanto e como vieram os grandes volumes de empréstimos do BNDES, se isto será cobrado e pago; sequer questionam o que foi renúncia fiscal, e até o futuro do que se construiu, pensado em uma nova pauta de entretenimento e calendário esportivo para o entorno dos estádios.

Não vejo, em manifestações, pessoas cobrando a execução dos compromissos que garantiriam um enorme legado deste evento para as cidades sedes. Bem diferente disto, nossos manifestantes de ocasião querem quebrar, invadir e de alguma forma expurgar todo ódio acumulado por anos, pelo que eles chamam de burgueses.

Com este texto, não tenho a pretensão de julgar quem quer que seja, muito menos de me colocar na condição de advogado dos organizadores do Mundial no Brasil. Penso que a conversa deve ser feita de maneira bem mais profunda e ampla.

Vimos com os saques em Pernambuco, com as interrupções de trânsito em São Paulo, e com o quebra-quebra descentralizado, que o sentido de civismo de nossos revoltosos infelizmente vai totalmente à contramão do que se poderia compreender como articulação engajada na perspectiva de luta por direitos. É triste perceber que a maioria dos manifestantes pré-Copa na maioria não tem clareza exata do que quer, e pior, acaba em uma progressão totalmente desproporcional, mais acusando e apontando culpados do que defendendo propostas ou indicando soluções.

Lamentável chegarmos a menos de um mês do pontapé inicial nos gramados com apenas 41% dos compromissos firmados de infraestrutura executados, falo de intervenções viárias, soluções de transporte público, estímulo e implementação de novos postos de trabalho no setor de serviços, isso seria o verdadeiro legado! Inadmissíveis os desvios de dinheiro público, e o super faturamento das arenas na quase totalidade. Contudo, também é igualmente doloroso constatarmos a reação imatura, e nada propositiva de nossos revoltosos de ocasião.

O povo brasileiro pode, deve e quer em sua grande maioria mostrar que sabemos receber bem, independente de tantas condições adversas já conhecidas por todos os que vivem por aqui. Alguns confundem boa acolhida, com subserviência ou “puxa-saquismo” de gringos, porém esquecem que se reafirmarmos nossa capacidade de fazer com qualidade eventos internacionais envolvendo toda a população, cada vez mais entraremos em uma agenda positiva mundial quando o assunto for turismo.

Creio que a Copa pode dar certo, apesar da incompetência suprapartidária de nossos gestores públicos. Porém espero que nossos movimentos sociais historicamente responsáveis pelas grandes transformações emancipatórias desse País consigam reverter essa onda desenfreada de intolerância, oportunismo e bravatas sem bandeiras, disfarçadas de pleitos democráticos. Há um bom tempo o Brasil foi redescoberto por seu próprio povo, como sendo um país de todos e para todos, logo não pode ter seus destinos decididos apenas por aqueles que decidem tomar a pátria por meio de saques de TVs de 40 polegadas, ou interdições de vias públicas, aterrorizando a população com paus, pedras e fumaça de pneus queimados.

* Carlos Ferrari é presidente da Avape (Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência), faz parte da diretoria executiva da ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e é atual integrante do CNS (Conselho Nacional de Saúde). 




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